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No último dia 19, bombeiros foram chamados para conter abelhas que se alojaram em um poste oco de Almirante Tamandaré | Ivonaldo Alexandre/ Gazeta do Povo
No último dia 19, bombeiros foram chamados para conter abelhas que se alojaram em um poste oco de Almirante Tamandaré| Foto: Ivonaldo Alexandre/ Gazeta do Povo

Causa

Acidentes estão ligados à invasão dos hábitats naturais

Para apicultores e pesquisadores, a alta incidência de ataques de abelhas contra pessoas está intimamente ligada à ocupação dos hábitats naturais dos insetos pelos seres humanos. "Não é a abelha que está invadindo a cidade, mas a cidade que está invadindo os ambientes naturais, cada vez mais escassos", defende José Luiz da Silva, estudante e pesquisador do curso de graduação em Agroecologia do Setor Litoral da Universidade Federal do Paraná (UFPR Litoral). "Consequentemente, as colmeias começam a aparecer em áreas semiurbanas, como as periferias das cidades", diz. Silva é responsável por um projeto da UFPR Litoral que ensina comunidades da região a preservarem o inseto e utilizarem a apicultura como fonte de renda.

As abelhas só atacam ao se sentirem ameaçadas. Muito barulho próximo às colmeias, por exemplo, pode desencadear acidentes. Os enxames são mais comuns entre setembro e março, período de maior reprodução e quando há mais néctar disponível na natureza.

Os acidentes também são acentuados pela própria característica genética do inseto – hoje, a espécie mais comum é a dita "africanizada", mais agressiva, que foi introduzida no país na década de 1950.

Mesmo com o perigo de ataques, entretanto, o extermínio é proibido por lei. "Temos de conviver com essas abelhas, porque não temos como eliminá-las. A abelha é um elo vital da natureza. Se ela não polinizar, não teremos sementes férteis, teremos menos matas, lençóis freáticos menores, oscilações climáticas e quebra de produtividade de safras e frutas", alerta o presidente da Associação Paranaense de Apicultores, Sebastião Gonzaga.

Proteja-se

No ano passado, a Secretaria de Saúde do Paraná registrou 786 ataques de abelhas contra pessoas, a maioria deles na Região Metropolitana de Curitiba. Veja abaixo as principais orientações para evitar problemas mais graves:

- Fique atento à existência de colmeias em sua casa. Assim que descobrir alguma, ainda em formação, chame um apicultor para fazer a retirada. As abelhas não têm preferência por locais específicos, mas é comum encontrá-las em claraboias, embaixo dos telhados e perto de locais onde ficam animais, como canis.

- Em caso de ataques, acione o Corpo de Bombeiros, pelo telefone 193. Os bombeiros somente atendem a ocorrências graves, mas podem dar orientações por telefone e indicar apicultores para fazer a retirada da colmeia.

- Som alto, como de motor de carro ou cortador de grama, pode alvoroçar os animais. Caso eles ataquem, a principal orientação é manter distância. Também indica-se cobrir a cabeça com uma blusa ou pano para evitar que elas entrem na boca, no nariz ou ouvido.

- Ao fugir das abelhas, uma saída é mergulhar em algum local próximo, como piscina, lagoa ou rio. Mas atenção: só faça isso se você souber nadar, para não correr o risco de se afogar.

- Evite passar a mão sobre a picada, para não liberar mais veneno. Ao se defender, nunca mate a abelha no corpo, porque ela irá liberar o feromônio que dá sinal de alerta para o resto da colmeia.

- Se for picado, procure logo em seguida um serviço de saúde. Pessoas alérgicas podem ter choque anafilático – os principais sintomas são inchaço no local da picada, alteração dos batimentos cardíacos e inchaço das vias aéreas (garganta). Nesse caso, os bombeiros devem ser chamados para prestar o atendimento médico no local.

- Não tente afugentar as abelhas por conta própria, com o uso de fogo ou qualquer outra tática. O ideal é chamar um apicultor para que ele, munido da vestimenta e equipamentos adequados, faça a retirada da colmeia. A Associação Paranaense de Apicultores (APA) pode indicar profissionais pelo telefone (41) 3256-0504.

Há duas semanas, o auxiliar de obras Josiel Justino Ferreira tomou um susto ao chegar em casa, no bairro Tatuquara, em Curitiba. Encontrou a família na rua, acompanhada de alguns vizinhos. As portas escancaradas da residência e os relatos emocionados do pai e da esposa logo o botaram a par do ocorrido: todos tiveram de sair às pressas, perseguidos por um enxame de abelhas que tinha se instalado embaixo da pia da casa. Apesar de algumas ferroadas terem atingido crianças que passavam pela rua, ninguém se feriu gravemente.

O susto vivenciado pela família de Josiel é mais comum do que se imagina e pode ter consequências drásticas: no último dia 19, um idoso de 73 anos morreu após sofrer um ataque de abelhas em Almi­­rante Tamandaré, na Região Me­­tro­­politana de Curitiba (RMC). Na ocasião, pelo menos outras dez pessoas ficaram feridas e tiveram de ser atendidas na unidade de saúde do bairro Cachoeira. A RMC, inclusive, aparece como o principal foco de ocorrências envolvendo o inseto nos últimos cinco anos no estado.

Segundo dados da Secretaria de Saúde do Paraná (Sesa), 965 ataques foram registrados de 2007 a 2011 na região. No estado, o nú­­mero de ocorrências aumentou 5,7% entre 2010 e 2011 – foram 786 ocorrências no ano passado, contra 743 há dois anos. Para a chefe da Divisão de Zoonoses e Intoxicações da Sesa, Gisélia Rúbio, o número de acidentes pode ser ainda maior, já que os órgãos de saúde reconhecem que, em boa parte dos casos, os ataques não são comunicados às unidades de saúde mais próximas.

Procedimentos

Em caso de acidentes, o Corpo de Bombeiros pode até ser acionado, embora só atenda a situações graves, quando são necessários atendimento médico e isolamento do local. A corporação, porém, afirma não ter treinamento nem equipamentos para recolher os insetos.

A captura das abelhas esbarra em uma deficiência comum a praticamente todos os municípos do estado: a falta de um serviço público de retirada das colmeias. Sem ter a quem recorrer, os moradores acabam contratando apicultores (criadores de abelhas). Em Curitiba, o serviço custa em média R$ 150. Apesar de os profissionais aproveitarem a colmeia na produção de mel, a prática não é bem vista pela própria categoria.

"Esses riscos devem ser bancados pelo poder público. Os apicultores não querem fazer esse serviço, não é o foco deles. Por tudo que o trabalho envolve, o risco, os equipamentos e o material, até que o preço cobrado é muito baixo", avalia o presidente da Associação Paranaense de Apicultores (APA), Sebastião Gonzaga.

Para especialistas, as tentativas de retiradas das colmeias por pessoas não qualificadas – no caso, os próprios moradores – são as principais causas de ataques. "O que precisa se incentivar é a prevenção. O morador deve chamar o apicultor o mais cedo possível, antes que essa colmeia se torne enorme. A partir do momento em que ela fica mais visível, crianças e animais podem acabar mexendo no ninho, sem saber das consequências", alerta o capitão do Corpo de Bombeiros de Curitiba Leonardo Mendes dos Santos.

Colônias desaparecem em vários países

Além de acentuar a ocorrência de ataques de abelhas, a destruição do hábitat natural dos insetos pode estar por trás de outro fenômeno que tem tirado o sono de pesquisadores em todo o mundo: o Distúr­bio do Colapso das Co­­lônias (CCD, na sigla em inglês). Há seis anos, os primeiros desaparecimentos em larga escala de abelhas foram registrados nos Estados Unidos. Em várias regiões do país, produtores constataram que as abelhas produtoras de mel abandonaram as colmeias, deixando para trás mel, polén e até crias. Em seguida, o distúrbio começou a ser observado também em países da Europa, como os do Reino Unido.

O fenômeno parece ter chegado ao Brasil no ano passado. Em Santa Catarina, os efeitos do abandono das colmeias atingiram diretamente a fruticultura, principalmente a produção de maçãs. Das cer­­ca de 100 mil colmeias usadas pa­­ra a polinização dos pomares, estima-se que pelo menos 40% fo­­ram perdidas. Os prejuízos não de­­vem tardar a ser sentidos: cerca de 90% da produção de maçã no estado depende diretamente da ação da abelhas, que promovem a fe­­cundação das flores por meio do transporte de pólen.

Estudos feitos pela Com­pa­nhia Integrada de Desen­vol­vimento Agrícola de Santa Ca­­tarina (Cidasc) indicam diferentes causas para a mortalidade, como o clima desfavorável, problemas de manejo e doenças. O fato é que, tanto no Brasil quanto no exterior, não há consenso entre pesquisadores sobre os motivos do distúrbio.

"Não há pesquisas conclusivas, mas sabe-se que são vários fatores envolvidos. Um dos que parece es­­tar na base do problema é o uso de agrotóxicos e pesticidas", afirma o pesquisador do curso de Agroeco­logia da UFPR Litoral José Luiz da Silva.

Estudo do Bee Research Laboratory do estado de Mary­­land, nos Estados Unidos, defende que a exposição a uma substância chamada imidacloprid enfraquece o sistema imunológico das abelhas e as deixa mais suscetíveis à ação de parasitas e microorganismos, que espalham infecções pela colmeia.

Colaborou Heliberton Cesca.

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