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Só 10% dos abrigados podem ser adotados

Atualmente existem 3.786 crianças vivendo em abrigos no Paraná e cerca de 800 interessados em adotá-las, entre eles 300 estrangeiros. Do total de meninas e meninos, porém, apenas 10% estão prontos para a adoção, porque a maioria tem algum tipo de vínculo com a família biológica.

Mesmo que a criança receba apenas uma visita ao ano, isso já caracteriza vínculo familiar. "Alguns pais não abrem mão da criança por medo de serem julgados. É mais fácil dizer que o filho foi tirado deles do que abandonado", explica a presidente da ONG Recriar, Eliana Falsedo.

Segundo Eliana, em muitos casos essa indefinição é o que faz com que muitas crianças acabem passando a infância toda em um abrigo. A maior parte das crianças abrigadas no estado tem entre 5 e 18 anos. As exigências impostas pelos futuros pais também diminuem as chances de adoção e aumentam o tempo de espera. Apesar do crescimento no número de crianças mais velhas adotadas, a porcentagem de interessados que se dispõe a adotar alguém com mais de dois anos é de apenas de 5%. Além disso, apesar de 90% dos encaminhados para adoção serem do sexo masculino, a maioria dos interessados prefere meninas.

A família é grande, o coração também

Na casa de Ozair e Rosicler Ribeiro tudo é para um batalhão. A começar pelo sofá da sala, imenso e em forma de "U", ele acomoda com conforto os 21 filhos do casal, 18 deles adotados. A família começou a crescer em 1993, quando Ozair, que é bombeiro, foi chamado para o salvamento de um bebê que havia sido abandonado em uma valeta. O casal já estava na fila para adoção havia um ano, mas comovido com a situação, resolveu adotar o garoto chamado William. Nove meses depois, eles foram comunicados de que havia uma criança disponível para adoção em um dos abrigos que eles haviam se cadastrado. E eles adotaram mais um. Se passaram três meses e apareceu outra criança. Eles adotaram também. Assim a família foi aumentando. A última adoção foi em 2003. Apesar da família numerosa, o casal sustenta sozinho todas as crianças.

Dos 18, apenas três foram adotados quando ainda eram bebês. Todos os outros tinham mais de 5 anos quando foram morar com o casal, alguns inclusive já eram adolescentes. "Claro que é diferente, as dificuldades são outras. Muitos deles vieram de situações muito ruins, de pobreza e sofrimento, mas com atenção, carinho e paciência é possível reverter tudo isso. Hoje todos estudam, fazem aulas de inglês, piano e futebol."

No Dia Nacional da Adoção, uma notícia animadora: a adoção tardia, ou seja de crianças com mais de 2 anos de idade, está aumentando no Paraná. Em 2006 foram adotadas 86 crianças com esse perfil somente em Curitiba. A Vara de Adoções da capital não tem números oficiais sobre os anos anteriores, mas, segundo a assistente social do órgão, Salma Mancebo Corrêa, "há pouco tempo, a média anual de adoções desse tipo costumava ser de duas ou três". Salma conta que no último curso preparatório para pais que irão adotar crianças maiores, realizado em março, participaram 12 interessados.

A realização de outro curso preparatório está sendo estudada para o segundo semestre. A participação é considerada fundamental, já que foi observada a falta de preparo dos futuros pais de crianças maiores. "É diferente de você adotar um bebê. A criança mais velha já vem com toda uma história, uma bagagem. Ela já vem com hábitos, temperamentos e vínculos que as vezes demoram para serem adaptados e requerem persistência", comenta. Por conta desse despreparo algumas adoções terminam da pior maneira possível. Salma se recorda de pelo menos três casos de devolução de crianças no ano passado.

Para a psicóloga Bárbara Snizek, que estuda casos de adoção, abrigamento e mães sociais, é importante que os pais tenham consciência de que a chegada de um filho sempre altera a rotina na casa e que é preciso um pouco de paciência no início. A psicóloga ressalta que na maioria dos casos os pais adotivos já estão esperando um filho há muito tempo, o que acarreta em uma grande carga de ansiedade. "Não é logo de início que a criança vai chamar de pai e mãe. Ela também precisa aprender a ter pais", afirma.

Existem casos, porém, em que a empatia é imediata, como ocorreu entre o casal Mara e Marcos Geronymo e o filho adotivo Bruno, hoje com 10 anos. A decisão do casal de adotar foi tomada após a morte da única filha, Raquel, quando ela tinha 21 anos, em 2002. Depois de nove meses de espera, o casal foi comunicado, por coincidência no dia do aniversário de Raquel, que havia uma criança para eles. "Lembro que quando a gente chegou, ele se aproximou e disse 'muito prazer, meu nome é Bruno'. Nesse instante já ficamos encantados. Até meu marido que estava relutante não resistiu quando o Bruno perguntou se ele seria o pai dele", lembra. Cinco dias depois do primeiro encontro, o garoto já estava morando na nova casa. "O começo foi difícil sim, precisamos ter paciência. Ele sentia muita falta do orfanato", conta.

De acordo com a psicóloga Lídia Weber, autora de pesquisas e livros sobre o assunto, se a criança pede, os pais devem manter o contato com a instituição na qual ela vivia. "Ela teve toda uma história lá, tem amigos que ainda estão lá, é natural que sinta saudades", afirma. Segundo a psicóloga, também é esperado que no início a criança se apresente mais agressiva e faça mais birra. "Ela faz isso para testar os pais, para ver se eles a querem mesmo. Com o tempo o relacionamento vai melhorando. O importante é não desistir", afirma. Entretanto, ela ressalta a importância dos pais imporem limites ao comportamento da criança. "Os pais não devem ter uma postura totalmente permissiva com medo de a criança se revoltar. A educação tem de ser exatamente a mesma de um filho biológico", diz.

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