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A Casa da Estrela – um dos exemplares mais originais da arquitetura de madeira de Curitiba e sem similares no mundo – foi doada há três meses para a Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), depois de uma longa negociação com os herdeiros, mas ainda não foi transferida do Alto da Glória, de trás da Igreja do Perpétuo Socorro, para o câmpus do Prado Velho, conforme o esperado.

A residência, em novo endereço, deve ser usada como laboratório do curso de Arquitetura, espaço cultural e candidata a atração turística. A demora da instituição em iniciar o processo chamado de dépose – um desmanche peça por peça, numerado e documentado – preocupa os antigos proprietários, os irmãos Idalina, Carlos Augusto e Moysés Azulay de Castro.

Eles temem que as contínuas invasões de um homem desabrigado transformem o local em um mocó, ameaçando a integridade da moradia. "O tempo está muito seco, a situação da casa piorou muito desde que fizemos a doação e há perigo de incêndio. Já sumiu uma banheira de ferro e uma pia, além de toda a fiação", lamenta o dentista Carlos, 67 anos.

O assessor jurídico da Associação Paranaense de Cultura, mantenedora da PUCPR, Mauro Júnior Seraphim, explica que no contrato de doação está prevista a transferência da casa em até seis meses – prazo que ainda não expirou – e calcula que em 45 dias a Estrela estará devidamente desmanchada, catalogada e levada para o câmpus. Ainda ontem o arquiteto Cláudio Maiolino, autor do projeto, e técnicos do setor de manutenção e proteção da universidade visitaram o local para conferir as avarias e traçar planos.

A instituição também informa que mantém um serviço de ronda dos seus bens e que não havia registro de invasão nem de furtos. O problema da Estrela, contudo, permanece se o novo cronograma não for obedecido na ponta do lápis. A moradia está de fato suscetível. Em se tratando de uma casa de madeira, qualquer dano será irreparável. "Do jeito que está, se chover a Estrela pode implodir", calcula Carlos.

O edifício em forma de estrela de cinco pontas, símbolo do esperanto a língua universal - não tem um único ângulo de 90 graus. Uma raridade. Além de sofisticada, a arquitetura desafia a lógica da engenharia convencional e causa espécie nos estudiosos, que querem desvendá-la a qualquer preço. "Fosse um arquiteto ou engenheiro e seguisse cálculos, meu pai não a teria construído", lembra Carlos. Para proteger esse patrimônio ameaçado, a expectativa era de que a casa seria revestida imediatamente após a doação com lonas e a cobertura retirada, já que cada metro quadrado de telhas pode pesar 300 quilos. A desconstrução e reinstalação no Prado Velho, com a presença dos acadêmicos de Arquitetura, viria na seqüência – fechando o ciclo em um ano e meio.

Não foi o que aconteceu. Um mês depois da doação, a família Castro começou a ficar apreensiva com a demora. Em seguida, vieram os furtos, as queixas à polícia e as contínuas trocas de cadeado no portão. "Pensamos em fechar a entrada com tijolos, mas ficamos com medo que os estudantes e operários chegassem para as obras a qualquer momento", lembra Carlos.

Nas diversas ligações feitas para a instituição, os herdeiros entenderam que problemas burocráticos e hierárquicos provocaram o atraso. Mesmo assim, decidiram ir pessoalmente à direção da universidade, voltando com a promessa de que a questão seria resolvida em poucos dias, novamente sem sucesso. Carlos chegou a fazer uma espécie de diário manuscrito em que relata a maratona dos últimos três meses. O texto, em papel almaço, é intitulado "A Estrela e o caos."

A situação da casa é de fato incomum. Trata-se de uma Unidade de Interesse de Preservação (UIP) – um bem que não é tombado, mas preservado e monitorado pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc). Mudá-la de endereço exigiu uma série de condições de segurança, expressas no processo 126.775/2005. Os Castro chegaram a duvidar da aceitação dos termos e a imaginar que aí residia a demora, mas o acordo existe e a PUCPR reafirma que vai cumpri-lo. Com sorte, esta semana.

O Ippuc, porém, não tem papel fiscalizador e não pode garantir a segurança da Estrela, remetendo o caso para a Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU). A SMU informa que não foi avisada das invasões contínuas, o que deveria ter ocorrido, e que vai avaliar se a unidade virou mesmo um mocó. A arquiteta e assessora técnica da secretaria, Lorene Rother Góes, explica que em caso de danos irremediáveis, a responsabilidade é tanto da PUC quanto da família Castro – já que mesmo tendo feito a doação do imóvel, é a dona do lote.

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