Entidades ligadas aos movimentos de consciência negra e aos direitos dos homossexuais levantam duas hipóteses para explicar as recentes agressões de cunho racista em Curitiba – o sistema de cotas e a visibilidade dada aos gays na mídia. Cinco casos foram noticiados pela imprensa somente em setembro. Por medo de repressão, apenas uma vítima denunciou o caso à polícia – W.C.M.C, 19 anos, teve o intestino perfurado por uma tesoura após ser espancado por cinco homens, na madrugada de 18 de setembro, na Rua Visconde de Nácar, no Centro. Em todas as agressões a situação se repete: negros e homossexuais espancados por bandos de jovens de cabelos raspados e vestidos de preto. Alguns agredidos chegaram a notar tatuagens da suástica nazista nos braços dos agressores.

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No caso da população negra, o direito a ingresso nas universidades públicas, via sistema de cotas, estaria estimulando a ira dos extremistas. Para os homossexuais, a presença maciça nos meios de comunicação, principalmente através das paradas gays, que a cada ano superam a quantidade de participantes (a de 2005 contou com 80 mil pessoas), estaria incomodando os racistas. Os dois grupos lamentam o descaso das autoridades.

Em janeiro, o presidente do Instituto 21 de Março Consciência Negra e Direitos Humanos, Ademilson Edson dos Santos, entregou documento ao Ministério Público Estadual alertando para a iminência de ações extremistas em Curitiba. Nada foi feito. "Agora que os casos ganharam repercussão na mídia é que o poder público vai investigar", critica Santos. O líder negro cita o caso de um delegado que, durante uma entrevista à televisão sobre os casos recentes, chegou a informar que desconhecia crimes raciais na cidade. "Todo mundo sabe onde ficam esses grupos – na região do Largo da Ordem – e não é de hoje", denuncia, lembrando da exposição de adesivos preconceituosos, de teor nazista, registrada no Centro Histórico.

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O presidente do Grupo Dignidade, de defesa às causas homossexuais, Toni Reis, também considera que a resposta do poder público aos casos está aquém da gravidade dos fatos. "Não está a contento. Nós não queremos que esses casos, que são muito sérios, virem pizza. Quem cometeu o crime tem de pagar", indigna-se. Para Reis, há outros empecilhos nas investigações. "No passado, já houve casos em que filhos de gente influente estavam envolvidos nas agressões", acusa, preferindo não citar nomes.

O sociólogo Pedro Bodê, da UFPR, coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos, ressalta que as agressões de origem racista não são de agora. "Esses últimos casos, mais visíveis, não são isolados. Ataques a homossexuais e negros são regulares na nossa sociedade discriminatória", aponta. Para Bodê, na mesma proporção em que ocorrem os crimes, também há o descaso das autoridades. "O fato das agressões homofóbicas e racistas não serem punidas permite a continuidade desse tipo de atitude, já que o agressor sabe que não pagará pelo crime", argumenta.

Investigação

Desde o ressurgimento dos casos de agressão a negros e homossexuais no mês passado (há seis anos um jovem negro foi espancado até a morte no Largo da Ordem), a apuração é tratada como investigação de inteligência. Além dos distritos que investigam as queixas isoladamente, o Centro de Operações Policiais (Cope), da Polícia Civil, tentará agora desarticular a formação dos grupos racistas agressores.

Apesar dos casos estarem se intensificando, o delegado do Cope, Marcus Michelotto, prefere não considerar a situação como crítica. "Ainda não é um caso de pânico, de alarmar a população negra e homossexual. A pedido do secretário Delazari [Luiz Fernando, da Segurança Pública] estamos dando atenção especial à solução desses crimes", considera.

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Segundo Michelotto, o que chama a atenção nas investigações é o perfil dos agressores. Jovens, entre 14 e 20 anos, os infratores são de famílias de classe média, filhos de profissionais liberais (como médicos e advogados). Ainda segundo o delegado, muitos pais simplesmente desconhecem as atitudes racistas criminosas dos filhos. "Às vezes, os pais pensam que o fato de o filho se vestir de preto e raspar o cabelo é atitude de roqueiro e na verdade o rapaz pode estar envolvido nessa onda de grupos preconceituosos", alerta. Às vítimas, Michelotto solicita que denunciem as agressões à polícia. "Quanto mais as vítimas colaborarem, maiores serão as chances de desarticularmos esses grupos."

Serviço: Cope – (41) 3224-9496.