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Rejeição ao rito

Logo que foi divulgada a liberação do rito tridentino, houve uma reação de grupos judaicos e até de bispos católicos sobre uma suposta oração anti-semita da liturgia da Sexta-Feira Santa. Trata-se de uma oração, rezada uma vez ao ano, que era feita da seguinte forma: "Rezemos também pelos pérfidos judeus, para que Deus Nosso Senhor levante o véu que cobre seus corações, para que possam também reconhecer Jesus Cristo, nosso Senhor." O termo "pérfidos", usado na prece para se referir aos judeus, sempre foi condenado por este povo, apesar de no latim ele ter um sentido diferente e mais brando do que o utilizado no português, que quer dizer traidor.

A palavra foi eliminada do missal pelo Papa João XXIII, em 1959, ainda no tempo da missa tridentina. Como a autorização do Papa atual diz respeito à versão de 1962, o novo missal não contém mais este termo.

A decisão do Papa Bento XVI de permitir que qualquer padre celebre cerimônias religiosas como antigamente, anunciada no início deste mês, já tem reflexos em Curitiba. Na Catedral Basílica Menor de Nossa Senhora da Luz, na Praça Tiradentes, qualquer pessoa poderá aperfeiçoar ou aprender o latim a partir de agosto. A abertura do curso é uma conseqüência dos pedidos do Papa para incentivar o uso do latim na liturgia.

O documento expedido pela Santa Sé, no último dia 7, libera os padres a rezar, sempre que desejarem, a missa como era celebrada antigamente, conhecida como rito tridentino. Desde a reforma litúrgica, no Concílio Vaticano Segundo (1969), qualquer sacerdote que quisesse celebrar uma missa no rito tridentino teria de pedir uma autorização ao Vaticano ou aos bispos. O problema é que o rito, aos poucos, foi sendo esquecido pela comunidade porque muitos celebrantes não atendiam mais ao pedido dos fiéis, já que um novo formato de missa havia sido criado. Com a liberação do Papa, a missa de antigamente ficará mais acessível aos devotos.

Para as pessoas que têm interesse em participar ou conhecer uma missa tridentina, é importante estar atento a alguns aspectos. Diferentemente do que muitos pensam, rezar esta missa não quer dizer apenas que ela será celebrada em latim. É aconselhável ter o conhecimento básico do idioma, mas existem outras peculiaridades (veja quadro ao lado).

Uma das principais diferenças diz respeito ao estilo. A tridentina é mais recolhida: os fiéis são expectadores, as celebrações são discretas e os padres têm um perfil mais conservador. A nova missa é participativa, o padre fica voltado para o povo, os cantos são mais agitados e é usado um número maior de instrumentos musicais.

Para dom Fernando Rifan, da Administração Apostólica São João Maria Vianney, de Campos (RJ) – único grupo no Brasil até hoje com autorização papal para celebrar o rito tridentino, um dos motivos que levaram o Papa a resgatar o estilo da missa antiga é que ela pode servir como parâmetro às atuais. "É um contrabalanço para muitos abusos encontrados no novo ritual. São duas formas que vão se enriquecer juntas", diz.

Para dom Fernando, outro aspecto importante da liberação da missa tradicional é que agora a Igreja poderá resgatar alguns fiéis antigos que haviam se afastado da Eucaristia por causa dos novos padrões de missa."Na verdade, o rito tridentino nunca foi proibido, mas era tido como tal. O Papa disse que isso nunca aconteceu na Igreja, de um rito novo proibir o antigo, mas muita gente ligada à antiga forma de celebração estava inconformada", diz.

Alguns padres entrevistados desconhecem as mudanças e outros afirmam que nada, efetivamente, vai alterar o modo como as missas são celebradas hoje. De fato, como afirma dom Fernando, a única mudança é que qualquer padre que se sentir apto a rezar a missa tridentina poderá fazê-lo, sem a necessidade de pedir permissão. "Nosso pontífice não quis retirar a autoridade de ninguém, é só uma questão de maior liberdade aos fiéis que apreciam a missa antiga."

A autorização será válida a partir do dia 14 de setembro, quando o documento do Vaticano entrar em vigor. Os devotos também poderão solicitar ao padre para celebrar, além de missas, matrimônios, crismas, funerais, primeira comunhão e outros sacramentos na forma tridentina. O rito poderá ser celebrado durante os dias de semana e uma vez aos domingos e festas. As missas atuais continuam sendo celebradas normalmente.

Em Curitiba, um grupo de 200 pessoas já celebra missas tridentinas uma vez a cada dois meses, na Capela do Hospital do Exército. A próxima acontecerá no domingo que vem, dia 29.

Língua oficial

Para o monsenhor Luiz de Gonzaga Gonçalves, reitor da Igreja da Ordem, a intenção do Concílio Vaticano Segundo, em relação à reforma litúrgica, era agregar um número maior de fiéis. "A Igreja entendia que, de fato, o povo não participava mais das missas porque ela acontecia em latim e muitos não entendiam o que era dito nas celebrações. Então abriu-se a possibilidade de rezar na língua vernácula", explica. A nova decisão do Papa, segundo monsenhor Luiz, seria uma maneira de o Vaticano não desprezar a língua oficial da Igreja, que está se extinguindo. "É uma riqueza grande para a doutrina. Quem sabe o latim e o grego, sabe muito melhor o português."

Na Igreja do Ordem, alguns cânticos são em latim, mesmo que as celebrações não sejam no rito tridentino. "As pessoas que gostam do canto gregoriano vêm de longe para participar da missa. Mas tudo depende da cultura do povo. Não é possível dar um canto destes para quem não o conhece. É preciso preparar a população."

De acordo com o padre Reginaldo Manzotti, a possibilidade de rezar as duas formas de missa é uma alternativa para a Igreja conseguir absorver diferentes grupos. "Eu não me sinto habilitado a rezar no rito antigo. É uma opção a mais. Quem quiser poderá fazer."

No Paraná, não existe um número exato de padres que sabem rezar as celebrações antigas. Segundo dom Fernando, dois dias após a divulgação do documento do Papa, pelo menos 40 sacerdotes já encomendaram um DVD que ensina como rezar a missa tradicional. "Dizem que não há interesse. Mas este número é prova de que quem pensa assim está enganado."

Serviço: O curso de latim ofertado pela Catedral Basílica Menor começa no dia 9 de agosto. Será ministrado na própria catedral, na Praça Tiradentes, todas as quintas-feiras, das 19h30 às 21h30. Haverá cobrança de R$ 15 para a inscrição mais quatro parcelas de R$ 50 para as mensalidades.

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