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O Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou nesta quarta-feira (16), a Resolução nº 2.427/2025, que endurece regras para transição de gênero e proíbe o uso de bloqueadores hormonais para mudança de gênero em crianças e adolescentes. A proposta foi aprovada pelo plenário do CFM, no início de abril.
A resolução orienta que o atendimento médico deve ser pautado pelo Projeto Terapêutico Singular (PTS), instrumento que propõe condutas personalizadas elaboradas por equipe multiprofissional e interdisciplinar, levando em conta a singularidade de cada paciente. O objetivo é garantir uma atenção integral à saúde física e mental de pessoas com disforia de gênero, reforçando o acolhimento, o diálogo e a atuação conjunta dos profissionais de saúde.
A partir da nova norma, a terapia hormonal cruzada — administração de hormônios sexuais para induzir características secundárias do gênero com o qual o paciente se identifica — só poderá ser iniciada a partir dos 18 anos. A mudança eleva em dois anos a idade mínima prevista na resolução anterior, que era de 16 anos, alinhando-se à Portaria nº 2.803/2013 do Ministério da Saúde.
Para iniciar o tratamento, o paciente deverá ter passado por pelo menos um ano de acompanhamento médico, com ênfase em avaliação psiquiátrica e endocrinológica, além de apresentar parecer favorável em avaliação cardiovascular e metabólica. A presença de doenças psiquiátricas graves ou outras condições clínicas que contraindiquem o uso de hormônios é impeditiva para o início da terapia.
Cirurgias de afirmação de gênero só a partir dos 21 anos
Outro ponto central da resolução é a vedação de procedimentos cirúrgicos de afirmação de gênero para pessoas com menos de 21 anos, quando estes procedimentos implicarem potencial efeito esterilizador. A regra segue a Lei nº 14.443/2022 e exige ainda que o paciente passe por acompanhamento médico por pelo menos um ano antes da intervenção cirúrgica.
Como justificativa, o CFM citou uma mudança legal aprovada pelo Congresso em 2022, que reduziu de 25 para 21 anos a idade mínima para a realização de laqueadura e vasectomia no país.
Bloqueadores hormonais de puberdade restritos
A norma também restringe o uso de bloqueadores hormonais para suprimir a puberdade em crianças e adolescentes, citando a crescente preocupação com os riscos associados a esse tipo de intervenção. Segundo o relator da resolução, conselheiro federal Raphael Câmara, países como Reino Unido, Suécia, Noruega e Finlândia já revisaram suas diretrizes e limitaram o uso desses medicamentos.
“A maioria dos riscos físicos associados aos bloqueadores da puberdade é devida ao seu efeito de suprimir a produção de hormônios sexuais. A exposição a hormônios sexuais é importante para a resistência óssea, para crescimento adequado e para o desenvolvimento de órgãos sexuais. Consequentemente, densidade óssea reduzida, altura alterada e fertilidade reduzida podem ocorrer como resultados do tratamento”, observa Câmara.
A vedação, no entanto, não se aplica a situações clínicas já reconhecidas pela literatura médica, como a puberdade precoce ou doenças endócrinas específicas.
Atenção integral e consentimento informado
A nova resolução também estabelece que os serviços médicos que realizarem procedimentos cirúrgicos de transição de gênero deverão, obrigatoriamente, cadastrar os pacientes e repassar as informações aos Conselhos Regionais de Medicina competentes.
O documento reforça que o atendimento médico deve garantir escuta qualificada, ambiente de confiança e confidencialidade. Todas as intervenções devem ser discutidas de forma clara e objetiva com o paciente, que deve estar ciente dos riscos, benefícios, limitações e reversibilidade — ou não — dos procedimentos.
No caso de menores de idade, as informações devem ser compreendidas tanto pelo paciente quanto por seus responsáveis legais, e os termos de consentimento e assentimento devem estar devidamente assinados e registrados em prontuário médico.
Além disso, o texto orienta que pessoas trans que mantêm órgãos do sexo biológico original devem seguir com os cuidados preventivos e terapêuticos junto a especialistas da área correspondente. Isso significa que homens trans com órgãos reprodutivos femininos devem continuar se consultando com ginecologistas, enquanto mulheres trans com órgãos masculinos devem buscar acompanhamento com urologistas.
Em casos de arrependimento ou destransição, a resolução prevê acolhimento, suporte físico e psicológico e eventual redirecionamento para especialistas, sempre com foco na escuta e cuidado integral.
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