O hábito de tomar chimarrão passa de pai para filho: tradição ameaçada por suspeita de malefícios| Foto: Priscila Foroni/Gazeta do Povo

O chimarrão é apontado como um dos causadores do câncer de esôfago. Estudo com essa conclusão, de autoria do pesquisador Renato Fagundes, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), foi publicado na revista científica norte-americana Cancer Epidemiology, Biomarkers & Prevention, da Associação Americana para Pesquisa do Câncer. Segundo ele, substâncias presentes na bebida podem provocar a doença.

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De acordo com o estudo do professor gaúcho, o câncer de esôfago é a sexta causa de morte por doença no mundo. Se forem considerados somente os países em desenvolvimento, este tipo de câncer aparece como a quarta causa de óbito. E o Rio Grande do Sul, estado onde muitas pessoas mantêm o hábito de tomar chimarrão, está entre os três lugares do mundo com a maior incidência da doença (que é de 9% da população).

O pesquisador admite que são necessários novos estudos para se comprovar definitivamente a ligação de substâncias da erva -mate com o câncer de esôfago. "No chimarrão, a bebida é ingerida e não sabemos quais as rotas percorridas por esses compostos. Precisamos de outros estudos. O que causa o câncer pode ser resultado da poluição ambiental ou da própria manufatura da erva-mate, secada ao fogo com madeira em combustão" , diz Fagundes.

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O cirurgião do aparelho digestivo do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Júlio César Coelho, lembra que os testes foram feitos apenas em ratos. Por isso, ele considera cedo para dizer que a erva pode provocar câncer. "O que se sabe com certeza é que o chimarrão que está muito quente faz mal devido à temperatura da água, que provoca lesões na parede do esôfago", explica. Assim como o álcool e o cigarro, que são prejudiciais, o chimarrão em altas temperaturas pode alterar a mucosa. "Os três geram traumas no órgão, que pode vir a desenvolver um câncer. Mas a erva em si não causa malefício", defende Coelho.

Se por um lado, os riscos do chimarrão ainda precisem de novos estudos para comprovação, também não há pesquisas que atestem os benefícios da bebida. Mesmo assim, o presidente do Instituto Escola do Chimarrão, Pedro Schwengber, afirma que há indicativos de que algumas substâncias encontradas na erva ajudam no tratamento do mal de Parkinson, no combate ao colesterol e à cárie.

Força do hábito

O aposentado Remício Lencina Gonçalves, 71 anos, nasceu na cidade de Alegrete, no Rio Grande, e viveu no estado durante a infância. Alheio à discussão sobre os prós e contras do chimarrão, desde os 10 anos de idade toma a bebida quase todos os dias, costume herdado dos pais. Embora tradicionalmente a bebida seja consumida muito quente, ele conta que sempre cuidou para não ingeri-la assim. "Bebo em uma temperatura média, porque sei que muito quente vai fazer mal, além de descer queimando na garganta. Tomei dessa forma a vida toda e nunca tive nenhum problema", conta.