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No limbo: com a situação jurídica indefinida, muitas crianças não podem ser adotadas nem voltar para a família | Marcelo Elias/Gazeta do Povo
No limbo: com a situação jurídica indefinida, muitas crianças não podem ser adotadas nem voltar para a família| Foto: Marcelo Elias/Gazeta do Povo

Prevenção

Situação de risco dos pais deve ser combatida

Como alternativa para a institucionalização de crianças e adolescentes, especialistas sugerem a criação de políticas públicas que evitem situações de risco para meninos e meninas. Até hoje há o afastamento da família somente em função da pobreza dos pais. Para o vice-presidente da comissão nacional da criança e do adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ariel de Castro Alves, programas como o Minha Casa Minha Vida deveriam priorizar essas famílias. "Atrás de uma criança em situação de risco, há um pai e uma mãe em situação de risco. Por mais que as entidades tenham se humanizado, o que a lei almeja é a vivência em família", explica.

Para o juiz e professor da Universidade Federal de Santa Catarina Alexandre Morais da Rosa o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) preconizava uma rede de proteção que funcionasse e respaldasse o Judiciário. "Os juízes acabam enfrentando um problema. Não é justo retirar a criança do convívio com a família, mas também não é justo retorná-la para a pobreza."

O procurador-geral de Justiça do Ministério Público do Paraná, um dos relatores do ECA, Olympio de Sá Sotto Maior Neto, explica que a legislação já possui mecanismo de participação popular e cobrança do poder público. Para ele, os conselhos de direito poderiam ser melhor usados se a população conhecesse os mecanismos de atuação. Todas as decisões tomadas nessas instâncias têm poder de lei e devem ser cumpridas pelos estados e municípios, inclusive com destinação de recursos.

A duas semanas do prazo final do cadastramento de crianças e adolescentes que vivem em instituições de acolhimento – os antigos abrigos –, o Conselho Nacional de Justiça sinalizou que o prazo pode ser prorrogado em alguns estados, inclusive no Paraná. Nem todas as comarcas do país conseguiram se or­­­­ganizar para preencher o cadastro dos acolhidos e as instituições não terminaram as audiências pa­­ra verificar a situação processual. Em julho deste ano o CNJ demandou aos tribunais de justiça que façam o levantamento para cum­­­prir a Nova Lei de Adoção, em vi­­­gor desde novembro do ano passado. A falta de dados mostra a dificuldade que o país tem para garantir a convivência familiar de meninos e meninas, mesmo após 20 anos de vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente, completados nesta semana. Os números ainda são desencontrados e por isso o CNJ solicitou que os juízes averiguassem a situação de cada acolhido e sempre que possível estimulassem o retorno familiar ou encaminhassem para família substituta ou adotiva. Quando uma criança permanece em uma instituição, mas não tem a situação jurídica definida, fica em um limbo legal: não pode ser adotada nem voltar para os pais biológicos.

No Paraná, a estimativa é que existam 4 mil crianças e adolescentes em instituições. Para cumprir a instrução normativa do CNJ, o Tri­­bunal de Jus­ti­­ça do Paraná enviou uma orientação a todos os juízes que atuam na área da infância. O desembargador Fernando Wolff Bodziak, presidente do Conselho de Supervisão dos Juízos da Infân­­cia e da Juven­­tu­­de, afirma que o le­­vantamento fi­­ca­­rá pronto dentro do prazo, mas as audiências serão realizadas depois. "É preciso haver uma avaliação criteriosa da situação. O levantamento é detalhado. Não adianta tomar uma decisão equivocada e depois a criança retornar à instituição."

Ajuda

Para auxiliar os magistrados de comarcas menores, Bod­­ziak afirma que o TJPR disponibilizou uma equipe técnica itinerante, com psicólogos e assis­­tentes sociais. Os juízes tam­­bém estão realizando au­­di­­ências concentradas nas pró­­prias instituições de acolhimento. Em Colombo, a audiência conseguiu garantir o retorno familiar de quatro das dez crianças atendidas em uma entidade.

Uma política pública estadual também está garantindo que as crianças possam viver com seus pais. O programa Cres­­cer em Família é uma inciativa da Secretaria de Estado da Infância e Juventude (Secj) e Con­­selho dos Direitos da Crian­­ça e do Adolescente do Paraná (Cedeca). Desde 2007 as instituições de acolhimento recebem um financimento para realizar o atendimento com a família dos acolhidos. Somente no ano passado o programa conseguiu aumentar em 36% o retorno para casa. "Muitas vezes, as crianças são afastadas por uma crise familiar momentânea. A partir da detecção das demandas familiares, a rede de proteção é acionada e se inicia um trabalho em conjunto", diz o desembargador.

Prejuízo

A psicóloga e mestre em An­­tro­­pologia Bárbara Snizek es­­tudou como é a vida de meninos e meninas em instituições de acolhimento. Ela conta que demorou para en­­ten­­der por que a longa permanên­­cia em abrigos não era positiva, já que muitos locais contavam com profissionais dedicados e tinham boa infraestru­­tura. "É um local de passagem. A estrutura é feita para que a permanência seja temporária. O compasso dentro do abrigo é de espera."

Durante o tempo de estada na entidade, as crianças têm vín­­culos que mudam o tempo todo. São colegas que vão em­­bo­­ra e funcionários que trocam de emprego, uma dinâmica com­­pletamente diferente da familiar, em que os laços são, na maior parte das vezes, perenes. Bárbara afirma que, em uma ado­­ção, as crianças podem estabelecer novos vínculos positivos com os pais adotivos. "O amor constrói o vínculo", diz.

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