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Na edição passada (9/3), o caderno Vestibular, veiculado todas as segundas pela Gazeta do Povo, trouxe duas matérias sobre a lista de obras literárias indicadas por vestibulares.

Chamou-me a atenção, sobremaneira, o comentário de uma estudante sobre sua dificuldade de entender Dom Casmurro, uma das mais importantes obras de nossa literatura. A confissão da estudante, frise-se, em hipótese alguma serve para desabonar sua inteligência. Podemos perguntar, no entanto, por que tantos vestibulandos – mas não só eles – têm dificuldade de compreender Dom Casmurro.

Para darmos uma resposta minimamente razoável a essa pergunta, é importante retomarmos uma consideração que o teórico russo Mikhail Bakhtin faz sobre o processo de "compreensão". Diz ele, em Marxismo e filosofia da linguagem, que nossa compreensão é proporcional ao número de palavras que oferecemos à enunciação do outro. Compreender, portanto, significa dialogar. Ora, para que possamos dialogar com alguém – ou, nesse caso especificamente, com uma obra literária –, precisamos de palavras suficientes para criarmos uma corrente comunicativa, uma troca. Precisamos entrar no mundo do "outro" com as nossas palavras, com o nosso conhecimento de mundo, mas também precisamos saber que o "outro" pode, e esse é o caso de Dom Casmurro, estar dialogando com eventos muito diferentes dos que permeiam nossas experiências de leitura, muitas vezes bastante limitadas. Em Questões de literatura e estética, Bakhtin diz que o romance "é uma diversidade de linguagens organizadas artisticamente" (p.74).

Ora, se não temos nenhuma palavra sobre essas linguagens, sobre as diversas vozes sociais orquestradas em um texto como Dom Casmurro, sobra-nos apenas a história de um amor malfadado. Afinal, sempre temos alguma coisa para dizer sobre esse assunto.

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