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No finzinho da minha coluna anterior (A im­­portância da Socio­linguística), fiz a seguinte afirmação: "Um brasileiro que fala TEIA e não TELHA não vai falar FELHA no lugar de FEIA". No entanto, um leitor me mandou e-mail dizendo que seu tio de vez em quando solta uma "felha" e não "feia", como o esperado. Por que isso ocorre? Para explicar, conto abaixo um fato que aconteceu com meu irmão Adauto.

Quando mocinho, ele participava de um grupo de jovens em Rondon, no Noroeste do Paraná. Certa feita, ele foi comprar calçado e roupas novas para arrasar na missa de Natal. Ao provar o sapato, viu seu dedão esquerdo completamen­­te à mostra. Pior: a atendente também viu. Pior ainda: ela fazia parte do grupo de jovens. Pior do pior ainda: ela era bonita. Muito bonita. O sapato ficou muito bom e aí a vendedora perguntou se ele queria comprar mais alguma coisa. Então ele saiu com esta maravilha: "Um par de MELHA, por favor". Só conto essa história porque meu irmão já superou o vexame.

A "felha" do tio do leitor e a "melha" do meu irmão são dois casos do que chamamos de hipercorreção. Pode parecer um contrassenso, mas hipercorreção não é sinônimo de hipercorreto. Acontece assim: na tentativa de não reproduzir formas linguísticas fortemente estigmatizadas, o falante corrige o que, na verdade, é a forma socialmente aceita e linguisticamente esperada. Em ambos os casos (felha e melha), o som de "ei" nos lembra palavras como "teia", "paia", "oio", que são pronunciadas por milhões de brasileiros no lugar de "telha", "palha" e "olho". Essas formas, embora legítimas se analisadas segundo parâmetros internos da nossa língua, são bastante marginalizadas. Ou melhor: os falantes é que são marginalizados. Na tentativa de não serem confundidos com quem fala "errado", os falantes acabam escorregando.

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