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As melhores perguntas são as que não têm resposta. Por exemplo: qual o mistério do fu­­tebol? Não sei. Olhando de longe, é um grupo de marmanjos uniformizados participando de uma gincana, todos correndo atrás de uma bola sobre um gramado retangular marcado com linhas brancas. A bola deve ser levada a pontapés para dentro de uma re­­de sustentada por traves. Só um dos rapazes de cada grupo pode segurar a bola com a mão. Quem controla tudo é um sujeito mais velho, de uniforme di­­ferente – quando esse ho­­mem trila um apito, o que faz com frequência, todo mundo para de correr e olha para ele. Às vezes ele tira do bolso um cartão amarelo e mostra para alguém, que quase sempre dá uma risadinha e faz "não" com a cabeça, as mãos na cintura. Se calha de ele pegar um cartão vermelho, que vale mais, o su­­jeito sai furioso do campo e não volta. Em torno do gramado sempre tem umas arquibancadas cheias de gente berrando e sacudindo bandeiras. Quando a bola vai para dentro da rede – o que é relativamente raro – as pes­­soas de parte das arquibancadas se levantam todas ao mesmo tempo e fazem uma gritaria de­­mo­­rada, incompreensível e feliz; outra parte fica quieta e triste.

Imagino que, pela descrição, vocês entenderam mais ou me­­nos o que é o futebol, mas alguma coisa ficou faltando. É a mesma sensação que tenho quando tentam me explicar o beisebol: um bando de quarentões barrigudos de ceroulas ridículas com bonés na cabeça que, de vez em quando, jogam uma bolinha de criança para acertar a cabeça de um sujeito agachado com um ca­­pacete no rosto e uma luva deformada na mão; de costas para ele fica um cara ameaçador balançando um perigoso porrete na mão. De vez em quando um deles larga tudo e dispara a correr meio que sem direção (o campo é torto), tentando agarrar a bolinha que voa. Parece que é isso.

Claro, faltou tudo. No caso do futebol, eu me pergunto porque esse esporte, sendo simples como uma brincadeira de crianças, é capaz de me transtornar tão completamente. Crise do Se­­nado, queda de avião, gripe suína – passo correndo pela parte séria do jornal e me detenho profundamente na recuperação de Alex Mineiro e no gênio de Paulo Baier, o Zidane da Baixada. Grito com os jogadores como se eles pudessem me ouvir. Proponho substituições tão óbvias que só o burro do técnico não entende. Pior: fico feliz se o juiz não marca uma falta escancarada do meu time e furioso se ele apita um pênalti contra que de fato houve. Tudo que é moralmente errado me atrai: faço cálculos detalhados na classificação do Brasileiro, no desespero de ver o Atlético um ou dois degraus acima, en­­quanto com o rabo do olho investigo, mesquinho, a queda do Coritiba – equipe de grandes ami­­gos meus, e até da minha própria mãe – com uma felicidade secreta mas angustiada, por­­que afinal amanhã tudo po­­de virar do avesso. Por que o futebol faz isso comigo?

Não sei.

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