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 | Gilberto Yamamoto
| Foto: Gilberto Yamamoto

Neste exato momento estou no hotel fazendo hora para voltar a Curitiba. Nada melhor do que pensar na vida e na própria espera: que fazer? É preciso mesmo "fazer" alguma coisa? Por quê? Vamos pensar fenomenologicamente: o que tenho diante de mim? Aproximadamente três horas: isso é tudo. Como alguém pode "ter" três horas diante de si? Não sei. É o relógio que me diz isso. A sensação é a de que não tenho nada, nem tempo. Parece que já comprovaram que o tempo é relativo, portanto essas três míseras horas, que não passam, podem representar oito horas psicológicas. Mas, escrevendo uma crônica, elas quem sabe se reduzam drasticamente a quinze minutos. Vamos lá, matar o tempo a ceifadas. É isso?

O horror da espera seria então uma expectativa de, digamos, tédio? É uma questão sutil, com dois caminhos. Odiamos esperar porque a espera nos entedia e nos faz sofrer por si mesma – a espera é sempre uma dor? Ou a repulsa que sentimos por esperar está vinculada à culpa? Explico melhor: a paralisia da espera nos impede de fazer alguma coisa, e isso, insidiosamente, nos inocula a sensação de perda, não propriamente de tempo, que é uma nuvem, mas de dinheiro mesmo, de coisas, de objetos, de conquistas concretas que esta passagem de coisa nenhuma nos impede de realizar. Benjamin Franklin, um dos fundadores dos Estados Unidos, cultuava a expressão "tempo é dinheiro", e ele devia saber do que estava falando. Enquanto eles levaram esta sovinice metafísica a sério, o Brasil, na mesma época, não tinha pressa, no berço esplêndido de sempre. Nós, que éramos ricos, ficamos pobres; eles, que eram pobres, ficaram ricos. E Macunaíma se espreguiça na rede.

Em cima da relação cruel entre tempo e dinheiro, Max Weber elaborou parte de sua explicação para a riqueza moderna, em "A ética protestante e o espírito do capitalismo", o que coloca outro tempero no horror da espera: o peso do puritanismo dando valor ao aproveitamento do tempo. Jogar tempo fora não é só uma preguiça individual, uma leveza de alma, um jeito de descansar, uma malemolência tropical, uma busca avulsa de felicidade, mas um autêntico crime de lesa-divindade. Nessa visão, o tempo é sagrado; não é uma mercadoria que eu possa levar no bolso e usar com liberdade. "O tempo urge" parece uma expressão bíblica, uma exigência do cosmos, uma batalha celeste de que sou apenas um soldado – perdê-lo gera culpa e remorso; no fundo, o que se perdeu não foi o tempo, mas o trabalho e a riqueza que ele representa. Faço parte de um empreendimento universal alucinante, como um escravo do Egito carregando interminavelmente pedras no deserto. Para que mesmo?

Entre a culpa e o tédio, não me decido. Talvez os monges do Oriente, na clássica posição de lótus, fazendo nada pela eternidade, tenham algo a me dizer. Olho para o relógio: já matei 23 minutos nessa conversa perdida.

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