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Ando com saudade do feijão com arroz, da sesta depois do almoço, de silêncios inúteis olhando pela janela, de um bom livro, noites tranquilas, uma conversa fiada. Em vez disso, virei passageiro da agonia, pulando de um lado a outro, a cabeça no automático, sem paz nem centro, sonhando com longas férias que não chegam nunca. E as notícias caem aos pedaços nessa fragmentação de internet – parece que há meses só leio manchetes. Acompanhei a crônica da eleição anunciada da nossa presidente Dilma – que faça um bom governo, com imaginação, talento e sorte, que é o que todos precisamos. Foi um bom discurso inicial, com método, clareza e bons princípios. Parece que nessas situações só se ouve o óbvio, mas na verdade nada é óbvio em política – a palavra que se empenha tem consequências práticas em tudo, como a língua solta de Lula nos mostrou, às vezes a contragosto.Em outro fragmento de internet, leio que Dilma teria dito que a educação no país está "bem encaminhada". Digamos que "há controvérsias". De educação brasileira, em manchetes aos pedaços, ouço a estupidez racista, criminosa, contra nordestinos – nesses momentos, um Brasil sinistro sai das sombras para criar mais sombra. Não parece, mas é a educação – a sua falta gritante em todos os estratos da população – que está no centro desse caso.

Em outro clique, Monteiro Lobato cai em desgraça também por racismo – agora num enfoque mais difícil de tratar. Como milhões de brasileiros, comecei a ler pelas páginas de Lobato, mas ao revê-lo, 40 anos depois, senti o peso da obra datada. Aqui é preciso separar literatura de material didático (entendido como texto objetivamente de ensino). Literatura não é material didático, e Monteiro Lobato é grande literatura, uma linguagem poderosa de criação de mundos. Sua leitura jamais deve ser reduzida a cartilha didática. As referências de Emília à cor de Tia Nastácia, por contextualizáveis que sejam, não são simples brincadeira sob a perspectiva infantil (até porque Emília é personagem "positiva" para o imaginário da criança) – e a resistência a colocá-las em sala de aula é preocupação legítima do professor, em função da idade dos alunos. Não pode ser comparada, em outra faixa etária, à absurda proscrição de, por exemplo, Jorge Amado, por suposta "liberalidade sexual", pasto saboroso para os missionários do atraso. Em qualquer caso, que haja sempre a opção da biblioteca ao alcance do aluno. Tema para pensar além do fragmento.

E o esforçado Enem é incapaz, mais uma vez, de fazer uma prova decente – agora trocaram o cabeçalho de questões. É o tal gargalo da educação, não dos alunos, coitados, que têm de adivinhar o que está escrito. O que dói é a estupidez de quem, com tempo e verba de sobra, fez a prova errada, ineptos que impingem, como efeito cascata, esse sofrimento e esse custo a milhões de candidatos.

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