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No último sábado, completaram-se dois anos do acidente de trânsito provocado pelo ex-deputado Fernando Ribas Carli Filho que causou a morte dos jovens Gilmar Yared e Carlos Murilo de Almeida, em Curitiba. O lúgubre aniversário da tragédia trouxe novamente à tona um caso emblemático que, de certo modo, traça um retrato do que é o Brasil: um país dilacerado por tensões entre a modernidade e o atraso.

A lentidão da Justiça em julgar Carli Filho talvez seja o mais evidente sintoma de forças do passado que teimam em se fazer presente. Dois anos depois, a principal discussão nos tribunais não é em torno do mérito do caso em si, mas sim sobre o andamento do processo: o ex-deputado, acusado de dirigir alcoolizado e em alta velocidade, vai ser julgado por um único juiz ou irá a júri popular?

Nada de novo em se tratando de celeridade judicial no país. Grande parte dos julgamentos se perde em um emaranhado de chicanas processuais, apesar de a sociedade clamar insistentemente por mais rapidez na Justiça. A isso se soma a (muitas vezes) deficiente estrutura de pessoal dos juizados. O resultado é a enorme sensação de impunidade que grassa no país.

A incapacidade nacional em acelerar as ações judiciais, por sua vez, é uma das facetas de outro problema mais amplo: a miopia do Estado brasileiro, historicamente voltado para si mesmo, em enxergar as demandas da população e dar respostas satisfatórias a essas questões.

O fim da violência do trânsito é um desses anseios frustrados. Milhares de brasileiros morrem todos os anos vítimas da imprudência ao volante. Mas não se vê campanhas públicas massivas e efetivas de educação dos motoristas – muito embora não falte dinheiro para isso. O trânsito é uma das maiores fontes de arrecadação governamental, seja por meio de impostos que incidem sobre a compra e propriedade de veículos, seja por intermédio dos milhões de reais das multas aplicadas a infratores.

O trânsito caótico, por sinal, também evidencia a parcela de culpa da sociedade no atraso nacional. Pode-se dizer que é consequência de uma expressiva parte dos brasileiros que teima em não aceitar princípios básicos da convivência cidadã: seguir regras e respeitar o direito dos outros.

Mas, a despeito do atraso institucional e cívico do país, o caso Carli também traz elementos de modernidade e esperança. A mobilização social para que a tragédia não caia no esquecimento e não haja impunidade, patrocinada sobretudo pela família de Gil­mar Yared, é um notável exemplo de cidadania e vigilância. Um exemplo que há na sociedade quem queira superar as forças que puxam o Brasil para trás.

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