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Em meio a pichações ininteligíveis que se espalham por toda Curitiba, uma chama a atenção em um muro da Rua Lourenço Pinto, no Centro. Ainda que carregada de erros de ortografia, ela ao menos tem o mérito de ser compreensível: "Pixação é crime? E corupção é o que?" (sic).

Obviamente, o que o autor dos questionamentos sugere está errado. Ambas as práticas, corrupção e pichação, caracterizam crimes. O que varia é o grau. Enquanto uma causa prejuízo a toda a coletividade por meio do desvio de recursos que poderiam melhorar os serviços públicos, a outra penaliza alguns proprietários de imóveis, sujando-os.

Mas as duas perguntas pintadas no muro parecem ser meramente retóricas e implicam um raciocínio tortuoso que revela uma triste faceta do país: se há corruptos nas altas esferas do poder público e eles não são punidos, rabiscar paredes alheias estaria "autorizado", já que se trata de um delito menor. Se transgredir a lei é "permitido" às altas autoridades, também seria para toda a população. Isso é algo que se reflete em uma série de campos da vida pública – como o trânsito, por exemplo.

Na visão do pichador, está implícita ainda a ideia de que não há lei, e consequentemente punição, para os corruptos. Embora não seja uma visão correta, ela tem um fundo de verdade quando se considera a impunidade dos políticos em geral. Por outro lado, haveria uma repressão maior às pichações. Uma rápida olhada pela cidade revela o quão equivocada é essa interpretação. Do mesmo modo que há fartura de notícias de casos de corrupção na política, espalha-se pelas grandes cidades o desrespeito ao patrimônio alheio expresso nas pinturas indesejadas em muros e paredes.

Talvez sem saber, o pichador chegou ao cerne do que é um dos maiores desafios do Brasil: como assegurar o respeito às normas coletivas se o que vem de cima é o mau exemplo? O problema é que o autor dos rabiscos no muro da Lourenço Pinto mergulhou na lógica do círculo vicioso, que se resume ao desrespeito àquilo que é do outro. Mas, em vez dos garranchos incompreensíveis das pichações corriqueiras, ao menos deixou um alerta aos políticos: o mau comportamento deles gera um efeito nefasto que se espalha na sociedade. Há uma tênue comunicação entre o desvio de dinheiro público e o mau comportamento dos cidadãos. Em tempo: a inscrição, coincidência ou não, está exatamente em frente do prédio anexo da Câmara de Curitiba, uma das sedes dos poderes políticos da capital.

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