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 | Jonathan Campos/Gazeta do Povo
| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

Como jornalista, já devo ter entrevistado alguns milhares de homens e mulheres. O tempo tratou de apagar a lembrança de vários deles. São as peças que a memória nos prega – perdoem-me! De outros é quase impossível esquecer. Principalmente daqueles a quem rotineiramente recorremos, como autoridades e especialistas nas mais variadas áreas. Como dizem: o hábito faz o monge. Há ainda alguns que são simplesmente inesquecíveis, mesmo que os tenhamos visto uma única vez na vida. Esses são tão raros como uma edelweiss (flor típica dos Alpes) plantada nas encostas da Serra do Mar.

O montanhista Erwin Gröger, morto na última sexta-feira aos 96 anos, em Curitiba, foi uma dessas pessoas especiais. Entrevistei-o há quatro anos. Foram algumas horas de conversa em sua casa, no Abranches. Uma aula.

Nascido no antigo Império Austro-Húngaro, em 1912, Erwin passou pela Primeira Guerra Mundial ainda criança. Viu seu país sair dividido em dois após o fim do conflito. Depois, presenciou sua Áustria natal ser anexada pela Alemanha nazista. Foi quando o jovem austríaco fugiu da iminente Segunda Guerra rumo ao Brasil, no fim da década de 30. Fixou residência na capital paranaense. No Paraná, tornou-se precursor do alpinismo moderno, pois trouxe técnicas européias de escalada. Por essa razão era chamado de "professor" pelos montanhistas do estado.

A trajetória de Erwin por si só já seria uma lição de História. Mas é muito mais. É uma lição de vida. De um profundo respeito à vida. A começar, pela sua própria. Até os 91 anos de idade continuava subindo montanhas. Quem, afinal, seria capaz de fazer isso se não tivesse cuidado de seu corpo ao longo de décadas de existência?

Também tratou de difundir aos seus "alunos" a lição do respeito a todas as formas de vida. Foi um dos primeiros preservacionistas do Paraná. Preocupado, por exemplo, com uma possível extinção de flores nos caminhos da Serra do Mar, retiradas pelos visitantes, não ficou parado. Tratou de produzir e distribuir sementes de diversas espécies para que colegas plantassem nas escaladas.

Tinha um carinho todo especial por uma muda de edelweiss que ele próprio plantou em uma encosta do Pico Paraná. Dizem, na Áustria, que dar uma edelweiss a alguém é prova de amor. Afinal, quem se aventura a colhê-la nas encostas dos Alpes está disposto a se arriscar nos abismos. Erwin provou o amor pela natureza do Paraná. Que descanse em paz.

Fernando Martins é jornalista.

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