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Quem nunca se sentiu diminuído por não ser capaz de alcançar algo que tanto almeja e que, por isso, mergulhou num mar de tristeza? Ou, por outro lado, que, inebriado pela sensação de grandeza, percebe que ela também não garante que as portas lhes sejam abertas? Nada mais natural sentir-se, após tais frustrações, deslocado em um mundo que parece não ter sentido e lógica.

Uma garotinha de 150 anos passou por tudo isso. Teve dúvidas sobre si e sobre o que estava ao seu redor. E, por isso mesmo, continua ensinando quem tem disposição de conhecê-la. Ela se chama Alice, a intrépida menina que se aventurou pelo País das Maravilhas – uma história que completou no último dia 4 um século e meio de seu lançamento tendo atingido o status de um clássico porque pode ser lida de diversas maneiras. Por crianças, jovens e adultos.

O que, afinal, dura para sempre e não sofre mudanças?

Quando Alice cai na toca do coelho, logo no começo da história, sente-se encantada por um belo jardim que está do outro lado de uma porta diminuta demais para ela atravessá-la. Trata-se do País das Maravilhas. Quem, afinal, não desejaria conhecê-lo? A menina bebe uma poção e encolhe. Está no tamanho certo. Mas a passagem para aquele mundo de sonhos só se abre com uma chave que ela se esquece de levar consigo. E que agora está no tampo de uma mesa que ela não mais consegue alcançar devido à sua pequenez. Todos, afinal, costumamos nos esquecer do que tem importância. E, por vezes, só lembramos quando já é tarde.

Mas um bolo, então, ordena a Alice: “Coma-me”. Ela obedece e cresce. Demais. Fica gigantesca. A grandeza, a soberba, enfim, também não servem. Alice chora a tristeza do querer e não conseguir. Suas lágrimas criam um lago, no qual ela cai quando fica pequena de novo. A melancolia pode ser assim mesmo: afoga quem a deixa tornar-se muito grande.

Mas Alice consegue nadar no lago de lágrimas e finalmente entra no País das Maravilhas, como queria. A conquista do objetivo, contudo, não lhe dá paz. Ela agora tem dúvidas sobre si: “Quando acordei hoje de manhã, eu sabia quem era. Mas acho que já mudei muitas vezes desde então”, diz a garota. Esse é um dilema de todos em algum momento da vida: o que, afinal, dura para sempre e não sofre mudanças?

Aquela terra desejada tampouco é exatamente o que alguém pode esperar. É povoada por criaturas estranhas, com regras e hábitos que parecem não fazer sentido. A Rainha, por exemplo, tem uma única solução para resolver seus problemas: “Cortem-lhe a cabeça!” Inclusive a do Gato Risonho. Mas como cortá-la de seu corpo se o felino mostra-se à monarca como uma cabeça flutuante, já sem corpo? Muitas vezes, aliás, as autoridades impõem normas que seguimos sem questioná-las. E também usamos a mesma “solução” para situações que exigem medidas diferenciadas – sem nos darmos conta de que nossa estratégia simplesmente não funciona.

Alice, no entanto, era uma questionadora de autoridades. E, quando a Rainha envia seu exército para prender aquela pequenina insolente, a menina não se intimida. E encontra o seu tamanho no mundo. A tropa era, enfim, apenas um inofensivo baralho de cartas. E Alice, então, acorda para a realidade.

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