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Provavelmente você já ouviu The Sound Of Silence, de Simon e Garfunkel. “Hello darkness, my old friend”, começa, com um violão suave e uma guitarra quase imperceptível. Após o primeiro refrão entram a bateria e a guitarra, compondo um quadro levemente psicodélico, mas com uma pegada folk – bem a cara dos anos 60. Pois essa versão que todos conhecem, por mais que tenha sido tocada um milhão de vezes em cada rádio do mundo, não é a original. É só um remix, e muito do meia boca.

A história é curiosa. Em 1964, Paul Simon e Art Garfunkel eram só dois desconhecidos na cena folk de Nova York. Tocando em uma biboca de Greenwich Village, foram descobertos pelo produtor Tom Wilson. Naquele mesmo ano, assinaram com uma gravadora e lançaram seu primeiro disco, Wednesday Morning, 3 A.M – quase inteiro em voz e violão, gravado em apenas três dias, mas muito rico em suas melodias e harmonias delicadas.

A grande faixa do disco é The Sound of Silence, aqui em sua forma ideal: apenas voz, violões e um baixo discreto, apenas para encorpar o conjunto. A voz da dupla, pontuada pelos violões, ganha intensidade a cada estrofe. O arranjo mínimo consegue deixar nítido cada detalhe da incrível harmonia vocal bolada por Simon, enquanto a ausência de percussão deixa nítido o crescendo dos violões ao longo da música. Tudo deságua em um último verso apaixonado, intenso, quase apocalíptico – “and the people bowed and prayed to the neon God they made”.

Mesmo por caminhos tortuosos, em algum momento as coisas verdadeiramente belas do mundo se tornam visíveis para todos

Entretanto, a estreia foi um fracasso absoluto. Por mais bonitas que fossem as composições e interpretações da dupla, o disco foi solenemente ignorado pelo público. Traumatizados com o mercado fonográfico, cada um foi para seu canto. Mas Wilson, sem consultá-los, resolveu insistir. Pegou a gravação original, gravou algumas linhas de guitarra, bateria e baixo e jogou para o mundo.

A versão ficou um desastre. A guitarra e a bateria, genéricas, sem personalidade, bobas, sufocaram os violões e a voz, tornando a música em algo pasteurizado, sem intenção. Claro, a música continuou ótima – mesmo porque a melodia é tão bonita que até uma versão sertanejo pegação ficaria ótima. Mas perdeu aquilo que a tornava especial, que era seu arranjo. Tanto que Simon ficou ultrajado ao ouvi-la.

Apesar disso, o single foi um sucesso estrondoso e chegou ao primeiro lugar da Billboard. E, mesmo detestando a versão, Simon e Garfunkel reataram, desfrutaram o sucesso, gravaram quatro outros discos e se consolidaram como uma das principais duplas da história da música americana. Sem o remix meia boca, provavelmente seriam completos desconhecidos. Ou artistas de nicho.

Há um lado triste na história: foi preciso rebaixar a música ao denominador comum para que ela se tornasse popular. Porém, é de certa forma uma fábula de que, mesmo por caminhos tortuosos, em algum momento as coisas verdadeiramente belas do mundo se tornam visíveis para todos. Mesmo que não em sua melhor forma.

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