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Dá para agrupar – ou separar – os brasileiros de diversas formas: em torcidas de times de futebol, em quem ouve Roberto Carlos e quem não ouve, quem gosta e quem não gosta de quiabo e de jiló. Essa última divisão é a mais certeira e inclui o subgrupo dos que nunca provaram e, mesmo assim, detestam.

Pensei no Brasil dividido pelo jiló e pelo quiabo ao ler a lista dos 50 melhores restaurantes do mundo feita por uma revista inglesa. Parece que a tal lista tem boa reputação. Pois bem, temos um representante verde e amarelo muito bem colocado. O paulista D.O.M., do chef Alex Atala, é o sexto melhor do mundo. E o Alex Atala é aquele que criou um prato com o simpático nome de "quiabo quiabo quiabo quiabo". Quatro vezes quiabo porque porções do vegetal preparadas de quatro formas diferentes eram servidas no mesmo prato. Liguei para o D.O.M. enquanto escrevia este texto e o educado maître que me atendeu explicou que o chef está sempre mudando o cardápio e por isso o festival de quiabo não é mais servido. Mas fazia muito sucesso, garantiu-me ele. Outra chef, a Roberta Sudbrack, servia quiabo para os convidados do presidente Fernando Henrique Cardoso.

O quiabo e o jiló têm suas particularidades que explicam o "ame-ou-odeie". O primeiro tem baba, o segundo é amargo. Precisam ser bem preparados. No caso do quiabo, se for feito de qualquer jeito, quem comer terá a impressão de degustar os dedinhos grudentos de um ET, daquela espécie que aterrorizou a Sigourney Weaver em Alien, surgindo coberto por uma meleca transparente.

Suspeito que o quiabo e o jiló também sejam afetados por um tanto de preconceito histórico. Vieram para o Brasil com os africanos escravizados. Imagine a dificuldade que eles enfrentavam para trazer sementes ou mudas nos porões dos navios negreiros? No Brasil, foram incorporados à cozinha local para acompanhar galinha e costelinha de porco. Não fazem parte da culinária europeia, já que são plantas de clima quente. Sintomaticamente, no Sul são mais vistos nos restaurantes de cozinha mineira do que nas mesas das famílias. Em resumo, jiló e quiabo são comida de vovó, de fazenda, de gente humilde. Caíram de moda.

Quem virou moda foi a gastronomia e por isso ela precisa de novidades. Os chefs são estimulados a inventar, a testar ingredientes, a valorizar produtos locais para chegar a algo criativo, que não seja cópia do que se faz na Europa. Isso incentivou os fãs do quiabo – ou teria sido o desafio de fazer sucesso com um ingrediente que muita gente rejeita? Se um dia eu encontrar o Alex Atala, prometo perguntar.

O quiabo faz parte do cardápio de outras regiões de clima quente. Come-se quiabo na Índia, na África, no Caribe e no sul dos Estados Unidos, onde se chama okra. Em alguns lugares, leva o simpático nome de "dedo de moça". Simpático, mas absurdo: que moça tem o dedo verde, com penugem (sim, o quiabo tem uma penugenzinha) e gosmento?

Se o quiabo tem tido chance de mostrar seu valor, o mesmo não pode ser dito do jiló. Já vi pessoas olharem para o interlocutor com cara de nojo ao saber que ele come jiló. Este sim está precisando de um chef aventureiro e provocador para lhe dar uma chance de mostrar seu valor.

Sei que não interessa a ninguém, mas preciso revelar de que lado estou: gosto de jiló e de quiabo.

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