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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Prisões de criminosos, truques, propostas

indecentes, consentimentos, rejeições

de lábios convexos.

É desconcertante tomar conhecimento de tanta notícia ruim. Na zona quase rural onde moro não se bate panelas. Espantaria os passarinhos e acordaria os bebês. Mas eu fazia uma visita no Batel quando ouvi o barulho das panelas. Assustador. O fato de as pessoas fazerem barulho no momento em que a presidente fala na tevê traz um simbolismo claro: não querem e não vão ouvi-la. Conversa de surdos. O discurso do governo se resume a tagarelice. Sinceridade diante dos problemas talvez abrisse os ouvidos. Mas é tudo um jogo de cena. Ela não fala com franqueza e ninguém ouve. No chão do apartamento, alguns livros descansam enquanto o proprietário limpa o pó das estantes.

O blablablá das ruas...

rodas de carros e o baque das botas e papos dos pedestres.

Nosso mundo é muito confuso, sempre. Só há lógica no quintal e nos campos

As folhas da sete-léguas caem e são levadas pelo vento para dentro da minha casa. Tenho de varrê-las para que não se espalhem pela vizinhança. À tarde, lá estão elas de novo. E mais tarde serão outras. Por mais que eu varra, elas se acumulam. O aroma das folhas verdes e das folhas secas. A beleza dá trabalho. A natureza segue seus ciclos. Para que eu tenha as flores rosas preciso das folhas, e folhas caem. Assim, varro. Os prazeres do céu estão comigo, os pesares do inferno estão comigo.

Quando eu era criança, éramos vizinhos de um ministro da Fazenda. Nos fins de semana ele aparecia, vindo de Brasília, e víamos quando varria as folhas de suas árvores que caíam na calçada da Visconde de Guarapuava. Parecia um bom sinal que um ministro de Estado pegasse na vassoura para manter a via pública limpa.

Ecos, ondulações, zunzuns e sussurros... raiz de amaranto, fio de seda, forquilha e videira,

Minha respiração minha inspiração... a batida

do meu coração... passagem de sangue e

ar por meus pulmões.

Em busca das folhas que se espalharam, descubro os botões de glicínia se formando nos galhos ressequidos da planta. Em breve haverá cachos lilases e perfumados. É um espetáculo que se espia por cima dos muros.

Casas e quartos se enchem de perfumes...

as estantes estão entulhadas de perfumes,

Respiro o aroma eu mesmo, e gosto e o reconheço.

Leio poemas, varro calçadas e inspeciono as flores e as abelhas que as flores atraem e que apavoram as crianças. O poeta que escreve e reescreve o poema me consola. Nosso mundo é muito confuso, sempre. Só há lógica no quintal e nos campos.

Pegue sua bagagem, eu pego a minha, vamos em frente;

Toparemos com cidades maravilhosas e nações livres no caminho.

Se você se cansar, entrega os fardos, descansa a mão macia em meu quadril,

E quando for a hora você fará o mesmo por mim;

Pois depois de partir não vamos mais parar.

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