| Foto: Felipe Lima

O Dreadnought, navio que era orgulho da marinha britânica, estava ancorado perto de Londres quando recebeu a visita de cinco senhores de pele negra e trajes orientais que se apresentavam como o imperador da Abissínia (hoje Etiópia) e seus assessores. Era o dia 7 de fevereiro de 1910. A comitiva foi recebida pelo almirante e fez um tour pelo navio. Na foto histórica, todos parecem concentrados e dignos, mas notei a tensão naqueles olhos esbugalhados.

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Entre os membros da comitiva estavam Virginia Woolf e seu irmão Adrian Stephen. Os outros três cavalheiros eram tão ingleses e branquelos quanto Virginia. Eles estavam pregando uma peça na Marinha. Seus rostos e mãos pintados e roupas alugadas em uma loja de fantasias enganaram todo mundo. Só um deles falava com os anfitriões – era o “intérprete” – e precisou inventar um idioma. Ele optou por declamar versos de Homero em grego e latim, mas com uma pronúncia tão ruim que o almirante acreditou que se tratasse de uma língua africana. O rapaz que se passava pelo imperador, Anthony Buxton (que se tornaria um herói da Primeira Guerra Mundial e escritor), também passou a repetir versos de Virgílio e Homero quando via algo impressionante no navio. O almirante mostrava a casa de máquinas e ele respondia com um elogio a Menelau. O mastro tão alto? Lá vinha um verso sobre Paris, Heitor ou Helena.

Os cinco deixaram o navio convencidos de que o sucesso do trote não deveria ser alardeado para evitar consequências legais. Mas cinco pessoas conseguem guardar segredo? Um deles fez tanto alarde que o caso foi parar nos jornais, no Parlamento e falamos dele até hoje.

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Cidade de sorte aquela, que abriga milionários que doam bibliotecas gigantescas

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São duas feras enormes, cabeças coroadas por jubas perfeitas, os músculos visíveis mesmo na posição de repouso. São leões brancos – poderíamos dizer que de um branco “marmóreo”, mas seria um joguinho de palavras bobo. Eles são feitos de mármore mesmo, de grandes blocos trazidos do Tennessee. Há 105 anos comunicam à cidade de Nova York e a seus visitantes que, dentro do prédio que protegem, algo poderoso, perigoso e belo – como os próprios leões – os espera. Indicam pompa e circunstância como é característico de estátuas de mármore. Por isso foram colocados em frente ao prédio imponente, doado à cidade por três milionários: o imigrante alemão John Jacob Astor, James Lenox e Samuel J. Tilden (este último já estava morto quando sua fundação fez a doação). Cidade de sorte aquela, que abriga milionários que doam bibliotecas gigantescas. A princípio as pessoas não gostaram das feras e fizeram piadas: um leão passou a ser chamado de Léo Astor e outro de Léo Lenox. A irreverência só cresceu; anos mais tarde passaram a ser Lady Astor e Lorde Lenox. Todo mundo sabe que leões com juba são machos, mas ninguém deu bola para isso. Mero detalhe! A verdadeira Lady Astor bem que merecia a homenagem, foi a primeira mulher a ocupar uma cadeira no Parlamento britânico. Anos mais tarde, a herdeira do Astor que fundou a biblioteca, Brook Astor, gastaria boa parte de sua fortuna em filantropia e seria chamada de primeira-dama informal de Nova York (first lady).

Quando veio a Depressão, com milhões de americanos sem trabalho e dependendo da ajuda do Estado, o prefeito de Nova York Fiorello La Guardia, filho de imigrantes, achou que os títulos de lady e lorde não combinavam com aqueles tempos cinzentos e rebatizou os leões de Paciência e Fortaleza. A mensagem era “precisamos dessas duas virtudes para atravessar esse período de crise. Paciência para não desesperar e fortaleza para lutar em meio às dificuldades”. Os Estados Unidos saíram daquela crise, enriqueceram muito, Nova York passou por um período de decadência, se reergueu, mas ninguém achou que fosse o caso de rebatizar as feras. Afinal, paciência e fortaleza são necessárias sempre.

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