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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Tive um colega de trabalho, gago, que imitava Sidney Magal. Ficávamos todos de queixo caído quando ele soltava a voz: “Sou como você já sabe amante latino...”. Era uma empresa muito formal e por isso ele se escondia lá no canto, atrás da divisória baixinha que separava as mesas. Para não ser visto pelos outros departamentos, fazia a proeza de rebolar com os joelhos dobrados. Meu colega era uruguaio e, veja só..., lembrava um pouco o verdadeiro Sidney Magal. Mas estava em melhor forma física que o amante da Sandra Rosa Madalena. Posso afirmar porque, naqueles dias em que Federico rebolava e oferecia aos colegas de departamento “um mundo de vibrações”, eu já podia me gabar de ter visto o Magal em trajes mínimos.

Sim, meninos, eu vi, e, como o velho Timbira, vou contar. Foi durante uma viagem que fiz, mochila nas costas, pelo Brasil. Em Manaus, me hospedei em um lugar que deveria ser um hostel, uma pensão. Foi o que pensei quando fiz a reserva. Chegando lá, descobri que era uma espelunca com moradores fixos. Turistas, só eu e um americano, farmacêutico de Nova York que, ao me encontrar, queixou-se horas a fio das esquisitices que lhe aconteceram na hospedaria.

Magal era mais gordinho e baixinho do que eu lembrava dos meus tempos de criança

O café da manhã dava a medida da classe do nosso alojamento. Eu ia saindo pela manhã quando fui chamada pela namorada do proprietário, que era peruano: “Você tem direito ao café da manhã”, me avisou, como se eu estivesse perdendo um privilégio. Me conduziu à cozinha e me convidou a sentar. Trouxe, então, um bule de café morno e um pacote de bolacha de água e sal pela metade e lacrado por um prendedor de roupa. Era o breakfast, o desjejum, o petit déjeuner. Os índios na floresta estavam passando melhor do que eu. Como demonstração de um senso de humor sádico, a dona da pensão insistiu muito para que eu entrasse no hotel Tropical, que era o melhor da cidade. Era para eu ver o que eu estava perdendo? Sei lá.

Dei uma entradinha rápida no Tropical e, quando saia da área da piscina para voltar à recepção, trombei com um hóspede. Foi na porta que dava acesso à piscina. Magal, o próprio, o amante latino em pessoa, de tanga minúscula e cheirando a bronzeador, soltou um “opa!” e recuou charmosamente para eu passar. Não foi exatamente uma trombada – exagero um pouco, confesso que não houve contato físico. O cavalheiro Magal me deixou passar e se dirigiu, menos rebolante do que se esperava, à piscina. Era seguido por duas moças de biquíni que carregavam as toalhas. Um harém? Não pude esclarecer.

Magal era mais gordinho e baixinho do que eu lembrava dos meus tempos de criança, quando ele aparecia na tevê, virando a cabeça de um lado para o outro, o queixo no ombro, olhos baixos enquanto seu vozeirão dizia que “o meu sangue ferve por você”.

De volta para o futuro, que hoje também já é passado, meu colega Federico estava em melhor forma que Magal e era capaz de desempenhos ainda mais impressionantes. Já que era gago e uruguaio, ninguém esperava dele aqueles shows particulares. Federico não se inibia com a gagueira nem com as frases libidinosas (“Tenho mil braços para abraçar-te, mil bocas para beijar-te”) enquanto rebolava escondidinho dos colegas que, de terno e gravata, passavam pelo corredor, muitos deles estrangeiros que nunca ouviram falar do Magal. Tampouco se intimidava quando precisava defender suas ideias diante da diretoria da empresa. Gaguejava, mas mostrava tamanha tranquilidade e naturalidade que impunha respeito. Esperávamos embaraço e desculpas por gaguejar? Ele só nos oferecia sua autoconfiança e, às vezes, “um mundo que é cor-de-rosa de coisas maravilhosas que tanto sonhavas ter”.

E viva o Uruguai!

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