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 | Ilustração: Felipe Lima
| Foto: Ilustração: Felipe Lima

Esta semana, pela primeira vez na vida, desmaiei. Fui fazer um exame mé­­dico e, depois de uma hora de desconforto e mal-estar, a cabeça desligou. Acordei com a sensação de que tinha passado horas dormindo, sonhando. Foi um susto saber que foram apenas segundos. A neurocientista Suzana Herculano-Houzel (cu­­jos livros recomendo) sempre diz em seus textos que o cérebro nos engana, nos dá pistas falsas e até nos convence de que vimos ou vivemos algo que não vivemos nem vimos. Achei que tinha dormido horas e sonhado e acordei descansada. Neste caso, fui enganada para o meu próprio bem.

A experiência me recordou uma amiga que sempre me dizia que não suportava agulha de injeção. Uma vez, me pediu para acompanhá-la ao hospital porque precisava fazer um exame de sangue. Concordei, mas na ho­­ra de sair não pude ir. Ela de­­sistiu e não foi sozinha. Outro dia, me chamou de novo e, da­­quela vez, eu fui. Ao ver o estado em que ela ficou enquanto as enfermeiras tentavam achar a veia (trêmula, gelada), me dei conta de que não levara a sério o que ela sempre me dizia. Co­­mo não tenho esses medos, não consegui me pôr no lugar dela. Não debochei nem fiz pouco, mas não entendi. Me pergunto: por que carga-d’água é tão difícil entender o que os outros sentem?

Por que simplesmente não acreditamos quando alguém diz "tenho medo de agulha" ou "tenho pavor de sapo"? Em partes, deve ser porque ouvimos alguns exageros ao longo da vida e, para nos defender deles, passamos a desconfiar. Mas, além disso, tem o fato de que nosso cérebro é bobinho, bobinho para certas coisas. A neurocientista decerto explicaria. A maioria de nós se identifica com algumas experiências vividas por outros porque a reação que provocam é instintiva, óbvia até (como a morte de um filho). Fora dessa esfera, não temos sintonia fina com o que existe só no outro e não em nós.

Segundo Suzana relata, desenvolvemos a capacidade de usar informações do ponto de vista da outra pessoa a partir dos quatro anos. Antes disso, achamos que o outro sabe, pensa e sente a mesma coisa que nós. Pois eu desconfio que depois dos quatro anos a evolução não é lá tão completa. Tendemos a continuar achando que se sapos não nos assustam e agulhas não nos metem medo, não deveriam meter medo em ninguém. Uns mais, outros menos, caímos nessa armadilha.

Sou adepta da tese de que somos limitadíssimos na capacidade de empatia: colocar-se na pele do outro é difícil. Se às vezes superestimamos a empatia, é por causa dos sentimentos que "nublam" as situações. Dói ver alguém sofrer, o que é um tipo de empatia. Mas não significa que entendemos porque a pessoa sofre. Talvez até achemos, lá no fundo, que aquela pessoa sofre porque é boba. A não ser que já tenhamos passado por aquilo – aí a empatia é profunda.

Depois de desmaiar em um exame médico, cheguei mais perto de entender o que enfrenta a amiga que passa mal com agulha. Experiência vivida, lição aprendida – espero...

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