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A crise financeira da Universidade de São Paulo (USP) fez o Hospital Universitário (HU), no câmpus do Butantã, zona oeste da capital, reduzir os atendimentos. Depois da adesão de funcionários ao plano de demissão voluntária (PDV), aposta da reitoria para sanar as contas da instituição, o pronto-socorro passou a atender apenas a urgências e emergências. Casos de menor gravidade são encaminhados para postos de saúde. Pacientes já relatam queda da qualidade do atendimento.

Reitoria da USP diz que apoia transferência de funcionários

A reitoria da Universidade de São Paulo (USP) informou na terça-feira (17) que vai apoiar as unidades no remanejamento de pessoal após a saída de todos os 1.452 servidores que aderiram ao plano de demissão voluntária (PDV). A dificuldade de repor as vagas no Hospital Universitário (HU) é a falta de profissionais especializados de saúde nas outras unidades. A reitoria não comentou as restrições de atendimento no HU.

Procurada, a Superintendência da unidade não detalhou quais foram as razões das mudanças nos atendimentos. Questionada sobre o número exato de demissões, o órgão não respondeu à reportagem. Ontem, a Secretaria Municipal de Saúde informou que não foi observado o aumento de demanda nos equipamentos públicos de saúde da região.

Além do PDV, a reitoria aposta na transferência do HU para a Secretaria Estadual de Saúde para aliviar suas contas. A medida, porém, enfrenta resistência de alunos e professores. Além disso, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) disse que não tinha interesse em assumir a unidade.

Um grupo foi designado para avaliar a proposta do reitor Marco Antonio Zago. Segundo a USP e a secretaria, as negociações sobre a desvinculação ainda não avançaram. O Sindicato dos Médicos é contra a medida e alega que o atendimento à população pode piorar. A reitoria, porém, afirma que ensino, pesquisa e extensão são prioritários.

Cerca de 200 servidores, segundo fontes da reitoria, aderiram ao programa - o dado oficial não foi informado na terça-feira (17) pela Superintendência do HU. De acordo com o Sindicato dos Médicos, 213 funcionários da unidade entraram no PDV nos últimos meses. O efetivo equivale a 12% do quadro do hospital, que atende à parte da demanda do Sistema Único de Saúde (SUS) na zona oeste.

Na unidade, uma faixa informa que, conforme a avaliação do médico, poderá haver encaminhamento. Foi o que aconteceu na manhã de ontem com a cabeleireira Fernanda Santos, de 35 anos. Com dor no abdome, ela foi aconselhada a procurar um posto.

“Achei que fosse resolver logo”, lamentou. “Meu marido também ia trazer a filha para tratar uma dor de garganta, mas já falei que teremos de ir para outro lugar.” Segundo Fernanda, o atendimento piorou nos últimos tempos. “Não é mais como era antigamente”, afirmou.

A maior perda é na área de enfermagem, mas também houve adesão de médicos e funcionários da área administrativa. O primeiro grupo já saiu no fim de fevereiro e o restante vai se desligar da unidade entre este mês e abril.

Com as demissões, segundo médicos do HU, houve deslocamento de funcionários para atender às demandas de emergência. Além disso, leitos foram fechados. O Estado apurou que oito dos 20 leitos das unidades de terapia intensiva e semi-intensiva foram desativados. Pacientes confirmam a situação.

O diretor clínico do HU, José Pinhata Otoch, teme que a crise prejudique as atividades de ensino. “O HU tem uma base acadêmica. Por meio da prestação de serviços de saúde, formam-se profissionais de diversas áreas.” Segundo ele, as atividades da graduação e pós, por enquanto, seguem normalmente.

Prejuízo

Para Otoch, a retirada de profissionais para os serviços de urgência e emergência, no entanto, vai prejudicar os atendimentos secundários e terciários, mais complexos, obrigações do HU. Segundo Gerson Salvador, médico do hospital e diretor do sindicato, três leitos foram fechados no centro cirúrgico. “Pacientes permaneceram internados em macas de pronto-socorro e cirurgias foram canceladas”, disse. Segundo ele, cortes afetaram o pronto-socorro de oftalmologia e o ambulatório de ortopedia.

Além do PDV, após a USP ser obrigada a respeitar o teto constitucional - o salário do governador (R$ 21,6 mil) -, desde setembro, muitos médicos deixaram de fazer horas extras e plantões, o que afetou a escala. Por ora, as vagas no HU não serão repostas porque contratações estão congeladas na universidade desde fevereiro do ano passado.

Pronto-socorro do HU encaminha paciente para postos de saúde

Quando o caso não é grave, o doente fica poucos minutos no pronto-socorro do Hospital Universitário (HU). Após ser informado que urgências e emergências são prioridade, ele é encaminhado para um posto de saúde local. Na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), pacientes afirmam que há estruturas desmontadas e parte das camas está vazia.

Segundo funcionários, a redução de atendimento começou no fim do ano passado. Nas últimas semanas, porém, foi intensificada a orientação para encaminhar pacientes a outras unidades de saúde em casos de menor gravidade. Acostumados a buscar atendimento no local, moradores da região se frustram com a medida.

Foi o caso da veterinária Mireile Santos, de 33 anos. Ela esperou quase três horas na manhã de terça-feira, 17, mas não conseguiu resolver sua dor de ouvido. “Fui encaminhada para uma AMA (Assistência Médica Ambulatorial). Perdi o trabalho à toa”, reclama.

Moradora do Jardim Bonfiglioli, também na zona oeste, ela estava acostumada a recorrer ao HU para qualquer problema. “Antes, era menos de uma hora entre chegar e terminar o atendimento”, lembra.

Na opinião da veterinária, transferir o HU para o jornal O Estado de S. Paulo, como propõe a reitoria, não resolverá o problema. “O atendimento vai ficar ainda pior.”

Demora

A costureira Nair Modesto, de 55 anos, se surpreendeu com a saída de enfermeiros durante os dez dias em que ficou internada na UTI do hospital, entre o fim de fevereiro e o começo deste mês. “Eles disseram que muitos iam sair nos próximos meses. Alguns nos falaram e se despediram”, conta.

A principal mudança após a saída de parte da equipe, segundo ela, foi a demora maior no atendimento. “Passou a demorar mais para que eles viessem ajudar a gente”, afirma ela, que tem enfisema pulmonar e frequenta o HU há quase 20 anos.

A aposentada Idalina Galiassi, de 72 anos, também ficou na UTI neste mês. “Tinha várias camas vazias, dava para ver de onde eu estava”, relata a idosa, que mora no Jaguaré, também na zona oeste. A idosa orientou a neta a tirar fotos para registrar a situação do HU e divulgar na internet. De acordo com Idalina, a tendência é de que piore ainda mais o atendimento. “É uma pena que isso aconteça”, lamenta. “Minha família sempre veio aqui e teve ótimo atendimento”.

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