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 | Antônio Costa / Gazeta do Povo
| Foto: Antônio Costa / Gazeta do Povo

O engenheiro civil Roberto Ghidini Júnior conhece bem as calçadas de Curitiba, sua cidade natal. E também as de Madri, onde conclui um doutorado em Urbanismo pela Universidad Politécnica. A comparação entre as duas é inevitável: além de pesquisador, Ghidini figura entre os fundadores da Sociedad Peatonal, organização não governamental voltada à pro­­moção da mobilidade urbana sustentável. Em outras palavras, a preocupação com os pedestres.

É com a autoridade de estudioso e observador que ele defende a melhoria das calçadas da capital, sem a qual idosos e deficientes permanecerão à margem da vida urbana. A receita de mudança passa pela gestão do espaço público e pela democratização do acesso. Do contrário, todo o resto padece.

Em entrevista à Gazeta do Povo, Ghidini falou da tese que desenvolve – um paralelo entre a acessibilidade nas cidades de Madri e Curitiba.

Em que aspectos do trânsito se percebem as maiores diferenças entre Curitiba e Madri?

Em Madri não existem tantas irregularidades como em Curitiba. Não somente por parte dos condutores, mas principalmente da municipalidade. Em Madri a fiscalização é bastante rígida. Um exemplo ocorre em frente de canteiros de obra: o tráfego de pedestres tem de ser mantido com segurança, conforto e fluidez. Já em Curitiba, na frente de um edifício em obras a calçada está sempre comprometida e a circulação de pessoas é por vezes perigosa.

Quanto aos pedestres, como eles se comportam nas duas cidades?

O pedestre "curitiboca" está mais para candidato a atropelamento e acidente na calçada do que para qualquer outra coisa. Os madrilenhos respeitam as leis de trânsito e exigem respeito. Desde pequeninos são educados para o convívio urbano. Aprendem com seus pais e avós o respeito ao atravessar a rua no lugar certo, a esperar o semáforo. Quando se tornam motoristas, seguem se lembrando que, antes mesmo de condutores, são pedestres.

No Brasil o pedestre é visto como um pobre que não consegue ter condições de comprar um automóvel... Isso tem de mudar. A caminhabilidade precisa ser melhorada. É cultural.

É a raiz do problema...

A rua é o local da convivência, da conversa, do encontro. No Brasil isso ocorre no clube ou no shopping. Na Espanha, há campanhas da DGT [Direccion General de Trafego, órgão federal correspondente ao Denatran do Brasil]. Os passeios são executados e mantidos pela municipalidade. Há uma preocupação com o alinhamento do mobiliário, faixa de circulação, continuidade, segurança, fluidez, conforto...

Acho que no Brasil valorizamos muito o automóvel, pelo status e poder que confere. Quem anda de bicicleta ou a pé não tem significância. Basta ver os investimentos públicos para a mobilidade sustentável, como meios não motorizados e transporte público.

Como devolver à rua o status de espaço democrático?

Com gestão do espaço e democratização do acesso. Essa é a receita. A democratização se faz com atividades econômicas e moradias convivendo nos mesmos bairros. Com diferentes classes sociais habitando e trabalhando no mesmo espaço. Só respeitar o porteiro do edifício não é suficiente. Temos de respeitar ricos ou pobres. O espaço público é de todos... Como fazer? Cultura urbana somente.

Os gestores estão fazendo a sua parte?

Os governos são responsáveis pelo planejamento das cidades. Em Madri isso é bastante visível. Já nas cidades brasileiras, nem tanto. Os municípios espanhóis buscam a "compacidade", as cidades compactas, o que faz com que exista uma densidade demográfica alta, evitando a expansão urbana. O resultado é muita gente vivendo no âmbito urbanizado, o que só é possível se o cidadão agir de forma civilizada...

O que falta para Curitiba avançar no deslocamento a pé e no transporte coletivo?

Em primeiro lugar, um plano de melhoria das calçadas, com adequação às necessidades de locomoção. Os passeios são o primeiro lugar por onde nos deslocamos. Quanto ao transporte público, é bem mais complexo. Seria "bueno" se fosse realmente público e não estivesse na mão de oligopólios.

O interesse voltaria a ser a prestação de um serviço e não a obtenção de lucro, como ocorre com as empresas concessionárias. Sem oligopólios seria mais fácil a implantação de subsídios e de mecanismos de desoneração da tarifa.

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