| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

A frase que segue de guia para a ucraniana Anna Grechishkina é a mesma que ficou famosa ao sair da boca de Martin Luther King em 1963: I have a dream [Eu tenho um sonho]. O dele era que todas as pessoas, independentemente de cor, pudessem viver em harmonia. O dela, viajar o mundo em cima de uma moto e conhecer o máximo de lugares e pessoas que conseguisse, além de levar adiante a mensagem de que sonhos podem se tornar realidade. Tudo isso com pouco dinheiro e esperança das pessoas.

CARREGANDO :)

Anna - que há três anos está na estrada - afirma que, apesar de todas as diferenças culturais que encontra nos lugares, as pessoas, independentemente da cultura ou religião, estão dispostas a ajudar e fazem o que podem para viverem felizes, com amor e paz em seus países. “Mais do que conhecer os lugares, eu amo conhecer pessoas e mostrar para elas que essa história de que sonhos não se realizam é mentira. Se uma ideia apenas passou pela sua cabeça, isso é uma prova de que ele pode se tornar realidade”, disse a ucraniana, que está de passagem por Curitiba.

Publicidade

Apesar da aparência tímida, Anna, hoje com 36 anos, deixou Kiev, capital da Ucrânia, no dia 27 de julho de 2013, levando apenas US$ 1 mil e a confiança de que conseguiria dar a volta ao mundo com a ajuda e apoio de quem encontrasse pelo caminho. “Até agora, tenho tido sucesso”, brinca.

Ela, que sempre gostou muito de motos e de viajar, buscou apoio das grandes fabricantes de motocicletas para que patrocinassem a viagem. Demorou um pouco, mas conseguiu apoio da KTM, que, ao saber do seu sonho, entregou as chaves de uma moto novinha para pegar a estrada. A moto virou sua companheira e hoje carrega adesivos de todos os países que visitou - de acordo com Anna, já foram cerca de 25, mas o número deve passar de 60 até o fim da aventura.

Dos amigos simples à realeza

De Kiev, Anna seguiu para a Rússia, de onde despachou sua moto de navio rumo à Tailândia e levou um susto: a companheira de viagem demoraria três semanas para chegar. Ela já estava com a passagem comprada para Bangkok e sem lugar definido para ficar - ainda mais por três semanas. “Se tem uma coisa que eu aprendi durante essa viagem é que, de uma forma ou de outra, as coisas sempre dão certo”, afirma.

Um amigo que morava em Kiev participou de uma conferência, onde encontrou a princesa da Tailândia. Resolveu então contar a história de Anna, na expectativa de que ela pudesse ajudá-la a encontrar um lugar para ficar. A resposta foi incrível: a princesa ofereceu o próprio palácio como hospedagem. Ao receber a ligação do amigo, a motoqueira jurou que era mentira. “Ela me recebeu, me emprestou um quarto, colocou um segurança para me proteger e contratou até um cozinheiro particular”, conta, rindo. Ela, que visita escolas e hospitais contando suas aventuras na busca de inspirar as pessoas a seguirem seus sonhos, diz que essa é a história preferida das crianças. “Eu digo para elas: se eu consegui conhecer uma princesa, por que o seu sonho é o impossível?”

Mas não é só de realeza que vive uma aventureira como Anna. Da Tailândia seguiu para Malásia, Singapura e depois Austrália. Chegou na América pelos Estados Unidos e guiou a moto de costa a costa. Seguiu para o México e depois para os países da América Central. Chegou à América do Sul pela Colômbia, passando pelo Equador, Peru, Bolívia, Chile e Argentina, onde visitou o Ushuaia. Depois, foi para o Uruguai, Paraguai e enfim, ao Brasil. Em quase todos esses lugares Anna se hospedou na casa de amigos, amigos de amigos ou pessoas que conheceu durante a viagem. Ela conta que precisou ficar em hotéis em apenas 10% do tempo.

Publicidade

E o dinheiro?

Uma das perguntas que mais recebe é: “Como você banca tudo isso?”. Anna conta que não é fácil conseguir dinheiro, mas que a internet facilitou as coisas, já que escreve alguns artigos para revistas de motociclistas e recebe um pequeno pagamento pelo aluguel do apartamento que tem na Ucrânia. “Conto muito com os amigos, que sempre conseguem um lugar em que eu possa ficar e isso ajuda muito”, conta.

Tem gente fazendo vaquinha virtual para morar em Curitiba; entenda o porquê

Leia a matéria completa
Veja também
  • Passaporte atrasado quase impede brasileira de participar de olimpíada de neurociências

Uma das pessoas que conheceu enquanto dava uma palestra para crianças no Uruguai foi a sobrinha de Alfredo Mill, uruguaio que vive em Curitiba e está recebendo a ucraniana na cidade. “Ela era professora e me falou que tinha um tio que poderia me receber aqui. É incrível, passei no máximo uma hora com uma pessoa e ela já garantiu que eu teria um lugar pra ficar”, diz.

Alfredo diz que adora receber estrangeiros e fez questão de receber Anna e conhecer a sua história. “Esse mundo não tem mais fronteiras. Quer coisa melhor do que conhecer gente de todo o canto?”, diz ele.

Publicidade

Seguindo o sonho e a estrada

Anna conta que tem um roteiro, mas que se sentir confortável em algum lugar, acaba ficando mais do que tinha planejado. Por isso mesmo que a viagem, que deveria durar dois anos, já passou dos três. E ainda deve continuar por mais um ou dois. Depois de Curitiba, ela vai para São Paulo, Rio de Janeiro e continuar a volta ao mundo na África do Sul. A motoqueira conta que quer voltar à Ucrânia, mas deve continuar viajando. “Depois preciso refazer todo este caminho para rever os amigos que fiz”, brinca.

De alguma forma, Anna, que tem a famosa frase “I have a dream” tatuada no braço, tornou o seu sonho e o de Luther King realidade. Ao seguir cruzando fronteiras em sua moto, ela conseguiu realizar o sonho de conhecer o mundo e empoderar pessoas para que acreditem nos seus próprios desejos. Além disso, sem querer, conseguiu provar que o velho sonho do pastor americano não está morto - muito longe disso. Enquanto houver pessoas dispostas a receber e ajudar as outras como fizeram com Anna, será possível continuar vivendo esse sonho. E, um dia, quem sabe, ele se torne realidade para todos.