
O número de ações penais contra motoristas embriagados vem aumentando ano a ano nas duas varas judiciais especializadas de Curitiba desde que a Lei Seca (n.º 11.705) entrou em vigor, em meados de 2008. A norma tornou o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) menos tolerante para quem dirige após ingerir bebida alcoólica. Apesar disso, menos de 9% dos processos abertos nesse período resultaram em condenação. Foram apenas 153 das 1.771 ações penais baseadas no artigo 306 do CTB dirigir sob influência de álcool (acima de 6 decigramas por litro de sangue) ou qualquer outra substância psicoativa.Na maioria das vezes, as autoridades esbarram nos próprios meandros da lei, tornando mais difícil penalizar de forma contundente quem se excede na bebida. Além de ser difícil produzir provas contra o motorista, já que ele não é obrigado a soprar o bafômetro, por exemplo, o réu também se beneficia de um dispositivo legal que suspende condicionalmente o processo e lhe dá a opção de cumprir uma penalidade mais branda, antes mesmo do caso ir a julgamento. Esse dispositivo se enquadra nos crimes em que a pena mínima é de até dois anos de prisão, conforme explica Lourenço Chemim, juiz da 2.ª Vara de Delitos de Trânsito de Curitiba. "Se a pessoa não tiver nenhum outro processo criminal em andamento e não tiver usado o mesmo dispositivo [suspensão condicional] nos últimos cinco anos, o juiz marca a suspensão do processo por dois a quatro anos", explica.
Segundo Chemim, nesse período o motorista precisa cumprir certas condições, entre elas: apresentar-se todo o mês em juízo; não frequentar bares; prestar serviços comunitários ou auxiliar financeiramente uma instituição beneficente. Caso não cumpra o acordo, reincida no crime ou cometa outro nos próximos cinco anos, o condutor perde o direito à permuta e pode ser condenado à prisão. De acordo com o juiz, em mais de 90% das ações penais o processo acaba suspenso e é feita a permuta. "Se a pessoa cumprir todos os requisitos, não há condenação e ela não fica com antecedentes criminais", esclarece.
Operação frequente
Recentemente, o Batalhão de Polícia de Trânsito de Curitiba (BPTran) reforçou a fiscalização aos motoristas por meio da Operação Lei Seca, com blitze frequentes nas ruas da cidade. Nos últimos anos, o número de notificações a condutores que dirigem embriagados cresceu.
Somente em 2011, de janeiro a setembro, foram 1.185 notificações média de 131 ao mês , ultrapassando a marca de 2010 (1.054 notificações). Do início do ano até junho foram realizadas 510 blitze na capital paranaense. "Temos a prerrogativa de encaminhar à delegacia mesmo aquele motorista que não queira fazer o teste do bafômetro. Se for constatado sinais de embriaguez, ele será autuado", explica o soldado do BPTran Gérson Teixeira.
Nestes casos, o motorista é enquadrado no artigo 165 do CTB e recebe punições administrativas, como suspensão da habilitação e multa, entre outras penalidades. Além disso, dependendo do estado de embriaguez do condutor e o tipo de ocorrência envolvida, o Ministério Público é acionado e pode oferecer denúncia à Justiça. Caso o juiz aceite a denúncia, ela se transforma em ação penal, podendo mesmo que raramente resultar em condenação.
Recusar o bafômetro não livra motorista
Para o promotor de Justiça Cássio Honorato, especialista em trânsito, recusar-se a soprar o bafômetro não livra o motorista das penalidades da lei. Apesar de ter esse direito, amparado por convenção internacional da qual o Brasil é signatário, o condutor do veículo de qualquer forma será encaminhado à delegacia e vai sofrer as punições administrativas. Além disso, diz Honorato, o bafômetro é dispensável como única prova contra o cidadão.
"O artigo 306 traz dois crimes de embriaguez ao volante. Ele diz que é crime conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 decigramas [equivalente no bafômetro a 0,30 miligramas por litro de ar nos pulmões] ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa. Se você consultar um glossário da OMS [Organização Mundial da Saúde], verá que o álcool é uma das muitas substâncias psicoativas", explica ele, que é promotor em Colombo, na região metropolitana de Curitiba.
Alcoolemia
Nesse sentido, segundo o promotor, o motorista pode ser autuado por excesso de alcoolemia (quantidade de álcool no sangue) ou por estar usando substância proibida. "E quantos decigramas eu preciso ter para estar sob influência de alguma coisa? Depende. Eu não sei qual a substância, porque a pessoa não quis gerar prova contra si mesma. Mas o Estado tem a obrigação de proporcionar segurança, inclusive no trânsito", reitera.
De acordo com Honorato, os laudos e testemunhos dos policiais também valem como prova e não é difícil para o Ministério Público oferecer denúncia contra os motoristas. Ele cita ainda exemplos de casos que chegaram ao Superior Tribunal de Justiça e que tiveram decisões favoráveis à condenação dos infratores.
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