Pela nova regra, médico terá de preencher um documento justificando a necessidade de cesariana.| Foto:

Entrou em vigor nessa semana uma nova resolução normativa da Agência Nacional de Saúde (ANS) que estabelece novas regras para a realização de cesarianas via plano de saúde. A partir de agora, a cobertura do parto cirúrgico está condicionada à justificativa médica ou a um termo de consentimento assinado pela gestante.

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Mudanças desagradam à comunidade médica

O Conselho Federal de Medicina (CFM) informou que, juntamente com a Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), irá cobrar ajustes prometidos pela ANS. O principal problema apontado pelas entidades é o uso do partograma, documento que será submetido à avaliação de auditores das operadoras de planos de saúde.

“Na forma atual, a Resolução deixa médicos e paciente vulneráveis. Cada um precisa respeitar o seu papel, sem haver conflitos: o CFM normatiza e fiscaliza a atividade profissional do médico e a ANS regula o setor suplementar”, diz José Hiran Gallo, coordenador da Câmara Técnica de Ginecologia e Obstetrícia do CFM.

Outro ponto divergente é o termo de consentimento que deve ser assinado pela gestante que escolher a cesárea eletiva. O CFM quer que a ANS adote um modelo padrão de termo de consentimento a ser desenvolvido pelo próprio conselho.

A divulgação dos números de partos cirúrgicos realizados por hospitais e médicos também é alvo de críticas. “Mesmo que as informações estejam corretas, a interpretação pode ser equivocada. Não se pode avaliar os números sem considerar se o hospital e também o médico são referências nos procedimentos de alto risco. Isso pode causar discriminação e estigma contra alguns profissionais, expondo-os a julgamentos sem conhecer os motivos de suas escolhas, que podem ser resultado de ações necessárias em casos de gestação de alto risco, por exemplo”, comentou o presidente do CFM, Carlos Vital.

A medida visa inibir a realização de cesarianas desnecessárias e reduzir os altos índices desse tipo de parto na saúde suplementar. No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde (MS), cerca de 85% dos nascimentos cobertos por planos de saúde acontecem por cesariana – a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que apenas 15% dos partos ocorram por cirurgia. Na rede de saúde pública, a taxa de cesarianas também é alta, de 40%.

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Na prática, os médicos agora devem preencher um partograma, documento gráfico com registros do trabalho de parto, para justificar a necessidade clínica da cesariana. Caso a cirurgia seja realizada por opção da própria gestante, ela deve assinar um termo no qual declara estar ciente dos riscos do procedimento. Só assim os planos de saúde efetuarão o pagamento e o reembolso do procedimento.

Repercussão

As novas regras do Ministério da Saúde repercutiram entre profissionais da área jurídica. Para o advogado e doutor em direito do consumidor pela PUC-SP Arthur Rollo, obrigar planos de saúde a informar o número de partos normais e cesáreas realizado por médicos configura intimidação. Já a exigência do partograma, acredita, poderá acarretar recusas de pagamentos de cesáreas pelos planos de saúde injustamente.

“Do ponto de vista do consumidor, as novas regras abrem uma brecha enorme para recusas injustas de pagamentos de cesáreas e para um sem-número de ações judiciais reparatórias, gerando insegurança jurídica. Porque, em última análise, o médico poderá ser responsabilizado por supostamente escolher uma conduta clínica inadequada que leve ao não pagamento ou ao não reembolso da cesárea pelos planos de saúde.”

A diretora do Procon-PR, Claudia Silvano, avalia com otimismo a portaria da ANS, mas faz ressalvas. Para ela, se trata de um dispositivo importante para promover a redução das altas taxas de cesáreas, mas não pode representar nenhum tipo de prejuízo para os beneficiários dos planos de saúde e deve garantir a transparência do fluxo de informações entre planos de saúde, médicos e pacientes.

“Há dois aspectos. O mais importante é que a beneficiária não tenha a cobertura prejudicada. Independentemente do tipo de parto realizado, o plano tem de cobrir. A beneficiária também não pode pagar nada além da mensalidade correspondente ao plano de saúde contratado. Nenhuma taxa a mais, incluindo aí a taxa de disponibilidade para o parto normal, uma prática considerada ilegal. Também é preciso acompanhar a transparência do processo, para garantir que a gestante que opta pela cesárea tenha acesso à informação necessária para tomar essa decisão.”

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O QUE MUDA

veja as alterações com as novas normas da ANS:

PARTOGRAMA

A Resolução Normativa 368 estabelece o partograma como documento necessário para a efetuação do pagamento aos profissionais e hospitais pela realização do parto pelo plano de saúde, seja ele normal ou cesáreo. O partograma é uma espécie de gráfico que reúne informações sobre a condição da gestante e do feto, bem como sobre a evolução do trabalho de parto – por exemplo, se a mulher é diabética, hipertensa ou se utiliza algum medicamento, e também como estão as contrações, a dilatação e se há sofrimento fetal. Existem vários modelos de partograma, a única regra é que contenham os dados mínimos indicados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

EXCEÇÕES

Nos casos em que não for possível o preenchimento do partograma com os registros da evolução do trabalho de parto, o obstetra deverá substituí-lo por um relatório médico detalhado. É o caso da gestante que tem indicação imediata de cesariana sem ter entrado em trabalho de parto porque alguma condição clínica ameaça a vida da mulher e a do bebê. Se não houver indicação clínica que justifique a cesariana, o médico deverá esclarecer o que motivou a sua realização – como, por exemplo, opção da própria gestante.

CONSENTIMENTO

Para evitar que os planos de saúde passem a negar o pagamento de cesáreas eletivas (aquelas feitas sem indicação clínica, mas por escolha da mulher ou do médico), a ANS definiu que as gestantes terão de assinar um termo de consentimento e de responsabilidade sobre os riscos da cirurgia. Porém, mesmo com o termo de consentimento, a cesárea só poderá ser marcada se a gestação completar 39 semanas, para reduzir a incidência de nascimentos prematuros.

ÍNDICE DE CESÁREAS

A RN 368 também determina que as operadoras divulguem a quantidade de cesarianas e de partos normais realizados por estabelecimento de saúde e por médico. Essas informações não ficarão disponíveis para qualquer pessoa. A beneficiária deverá solicitar à operadora os quantitativos de partos normais e cesáreas da operadora, do médico ou da maternidade na qual pretende fazer seu parto. Também é possível requerer informações sobre mais de um médico ou hospital. Os dados devem ser fornecidos por escrito e em linguagem clara no máximo em 15 dias. As operadoras que não atenderem às solicitações estão sujeitas à multa de R$ 25 mil.

COBERTURA

A ANS garante que em nenhuma hipótese a beneficiária deve ser prejudicada pela cobertura do plano de saúde, independentemente do tipo de parto ao qual se submeter, uma vez que o parto consta no rol de cobertura obrigatória para os planos de saúde. O pagamento do procedimento está condicionado ao partograma ou ao relatório médico (justificando a cesariana) ou ao Termo de Consentimento assinado pela gestante (no caso de cesárea eletiva).

Cartão da gestante

A operadora deverá disponibilizá-lo sempre que solicitado por uma beneficiária. É um instrumento para registro das consultas e acompanhamento da gestação e vem acompanhado da Carta de Informação à Gestante que contém algumas orientações relacionadas à escolha do médico, do tipo de parto e do direito ao acompanhante. Os principais dados do Cartão da Gestante são os resultados de exames clínicos (tipo sanguíneo e fator RH, glicemia, HIV etc.), das ultrassonografias e histórico de doenças como diabetes, hipertensão e tromboembolismo.

Fonte: Agência Nacional da Saúde FenaSaúde

Operadoras apoiam as novas regras

A RN 368 repercutiu também entre instituições prestadoras de serviços de saúde e profissionais da área. A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), representante das operadoras de planos de saúde, declarou apoiar ações destinadas a ampliar as informações levadas aos consumidores, mas ressaltou que a definição do parto mais adequado deve ser baseada em diretrizes clínicas.

A entidade afirmou que as empresas associadas seguem as normas estabelecidas pela ANS e defendem que o parto normal é sempre a melhor alternativa, “exceto nos casos – menos frequentes, mas previstos nas práticas médicas – em que apresenta riscos para a parturiente ou ao nascituro.”

Sobre uma possível insatisfação entre os médicos credenciados, a federação garantiu que até o momento não houve registro de descredenciamento voluntário de profissionais ou estabelecimentos de saúde que indiquem uma reação às novas regras. A entidade destacou que eventuais descredenciamentos são substituídos por instituições ou profissionais equivalentes, de forma que o beneficiário não tenha prejuízo de atendimento ou do que foi contratado. (CP)

Acompanhamos uma epidemia de cesáreas no Brasil. A resolução vem para evitar o agendamento de cesáreas sem justificativa.

Antonio Paulo Mallmann Comissão Técnica da Unimed Curitiba