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Embora a cooperativa dos alunos do Colégio Agrícola de Toledo tenha sido desativada, a produção excedente cultivada por estudantes continua a dar retorno financeiro à instituição | César Machado/ Valepress
Embora a cooperativa dos alunos do Colégio Agrícola de Toledo tenha sido desativada, a produção excedente cultivada por estudantes continua a dar retorno financeiro à instituição| Foto: César Machado/ Valepress

Iniciativa de alunos foi desativada

Cascavel - O Colégio Agrícola de Toledo, no Oeste do estado, desativou no ano passado uma cooperativa formada pelos próprios alunos para evitar que o sistema fosse caracterizado como um negócio formal e acarretasse impostos e outras obrigações legais. Assim, a escola voltou o ensino para técnicas agropecuárias.

Apesar de não ter como foco o cooperativismo, o sistema acaba presente na produção agrícola do colégio. A instituição não tem como objetivo produzir em escala comercial, mas o excedente produzido e não usado na própria escola é comercializado a preço de mercado e depositado em uma conta dos colégios agrícolas do Paraná. O valor retorna para in­­vestimento na própria unidade.

Na última safra, o excedente de produção na área de 20 alqueires que a instituição possui garantiu R$ 40 mil extras ao colégio. O dinheiro já retornou à instituição, que vai aplicar em quatro projetos: entre eles uma agroindústria de leite e outra de vegetal.

As disciplinas especiais do co­­légio trabalham para a formação de técnicos agrícolas. Hoje, 280 alunos estudam em Toledo – 80% deles em período integral e praticamente todos com origem em famílias ligadas à agricultura. São estudantes de quase 40 municípios do estado e até do Paraguai. A dedicação nos estudos é o critério principal para a permanência do aluno no sistema integral.

Para elas

Os colégios agrícolas deixaram de ser um reduto procurado apenas por alunos do sexo masculino. Em Toledo, por exemplo, as garotas representam 20% dos estudantes da instituição. É o caso de Pa­­trícia da Silva Lorenzan, de Assis Chateaubriand. Filha de agricultores, ela estuda em período integral, retorna para a casa somente nos finais de semana e já consegue aplicar, na propriedade da família, técnicas aprendidas na escola. Patrícia conta que já ensinou os pais o sistema mandala de cultivo de hortaliças. Nesse sistema, os canteiros são feitos em círculos. "Eles [os pais] acharam que a produtividade é melhor do que os canteiros normais", diz.

Luiz Carlos da Cruz, correspondente

Londrina - Em uma sociedade altamente individualista e competitiva, a educação cooperativista não trabalha só pela formação de profissionais que cooperam entre si e valorizam os procedimentos or­­ganizacionais e produtivistas. Es­­sa formação prioriza, antes de tudo, o desenvolvimento de pessoas solidárias e democráticas, ca­­pazes de dar ao interesse do gru­­po a mesma importância do interesse individual.

O Paraná tem no cooperativismo uma de suas principais forças econômicas e sociais. Parte dos estudantes que atuarão profissionalmente nesse meio é formada pelos 18 colégios agrícolas mantidos pelo estado. Mais do que ensinar a plantar, essas escolas ensinam a gestão da propriedade dentro de um sistema de cooperação. "Nós temos uma cooperativa dos alunos, que ge­­rencia a verba e a manutenção da escola-fazenda. A produção é direcionada à Secretaria de Es­­tado da Educação, que depois nos devolve a verba para investimento", conta Nilton Fuku­shi­ma, vice-diretor do Colégio Agrí­cola Estadual Manoel Ribas, de Apucarana.

Com informações e conhecimentos adquiridos, esses jovens passam a ser divulgadores dos prin­­cípios e benefícios da ação cooperativista. A maioria deles vai ser empregada por cooperativas ou vai voltar para casa – cerca de 70% dos alunos são filhos de agricultores –, levando informações suficientes para desenvolver a propriedade familiar. "A formação cooperativista é muito importante, principalmente nos dias de hoje, quando o conceito de cooperativa está bastante distorcido. A maioria dos cooperados quer apenas empurrar o produto para venda", afirma Fuku­shi­­ma.

O resultado dessa formação está até hoje no dia a dia do engenheiro agrônomo e pesquisador do Instituto Agronômico do Pa­­raná (Iapar), Tumoru Sera. Ele se formou no colégio agrícola de Apu­­carana em 1969 e desde en­­tão está ligado ao cooperativismo. "Depois do colégio, eu mantive o interesse pelo cooperativismo porque, para o produtor, é difícil produzir e mais difícil ainda vender", afirma. "A organização em torno de interesses co­­muns facilita tudo", acrescenta.

Hoje, além de ser membro de uma cooperativa de cafeicultores, Sera aplica os conceitos do cooperativismo nas pesquisas que desenvolve no Iapar. "A excelente base que eu tive me ajuda hoje na formulação de projetos que precisam ser feitos em parceria para serem rentáveis", conta.

Empresa humanista

Uma cooperativa não deve ser apenas uma empresa que visa a bons resultados financeiros. "É uma associação de pessoas. Por isso, deve ser desenvolvida sob uma dimensão humanista", afirma o doutor em Ciências Sociais, José Odelso Schneider. Professor de cursos de especialização em cooperativismo na Universidade do Rio dos Sinos (Unisinos), no Rio Grande do Sul, Schneider acredita que a sociedade está num crescente processo de fragmentação. "O individualismo é muito forte. É preciso voltar a valorizar a solidariedade, responsabilidade, perseverança. Isso é cooperativismo."

Diferente de uma empresa capitalista, para fazer parte de uma cooperativa é necessário compartilhar uma filosofia. "A educação cooperativista deve construir um tipo de convivência social onde a democratização de oportunidades seja acompanhada pela democratização dos resultados", sugere Schneider.

Formação além dos campos

A difusão da cultura da cooperação na formação de cidadãos conscientes das questões coletivas e comunitárias é um processo que tem começado cedo em algumas escolas. Baseado na integração entre escola, família e comunidade, o programa "A união faz a vida", desenvolvido pelo Sistema de Cooperativas de Crédito (Sicredi), pretende construir valores de cooperação e cidadania em crianças de escolas municipais do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso.

Por meio de parcerias com prefeituras, o programa já atende cerca de 200 mil alunos do maternal à 4.ª série, capacitando os professores para agregarem os princípios do cooperativismo e do empreendedorismo às disciplinas tradicionais. "Queremos gerar cidadãos mais conscientes e socialmente responsáveis, e fazer com que eles aprendam que, unindo forças, é possível buscar as soluções que não vêm do poder público", explica a assessora de programas sociais do Sicredi Maringá, Maria Rosângela de Freitas.

Fátima Gouvêa Dias é a assessora pedagógica responsável pela capacitação das três escolas londrinenses em que o programa está sendo implantado. "O trabalho com os professores é feito através de oficinas. Eles passam a estimular os alunos a criarem projetos cooperativos, cujos temas são sugeridos pelas próprias crianças", explica. O resultado são iniciativas de proteção ao meio ambiente, reciclagem, reaproveitamento de alimentos, entre outras.

Humanização

Segundo Fátima, o efeito mais marcante da metodologia é a humanização. "Isso implica em libertar estes alunos da perspectiva individualista. Estamos formando indivíduos qualificados para o exercício da humanidade". Para ela, isso certamente será refletido na vida profissional desses alunos. "A empregabilidade está cada vez mais ligada à questão do comprometimento e o de­­sejo de cooperar com o grupo em que se está envolvido", acrescenta.

O trabalho de inserção do cooperativismo nas escolas tem de ser essencialmente voltado para o professor. "A criança começa aprendendo a dividir o doce com o colega através do professor, que é um agente de disseminação. Ele tem que transformar princípios em atividades práticas para que a criança compreenda o conceito", lembra a gerente de formação e qualificação profissional do Ser­viço Nacional de Apren­diza­gem do Cooperativismo (Sescoop), Andrea Sayar.

Segundo ela, iniciativas de cooperativismo em escolas já mostraram contribuições para a menor evasão escolar e melhoria no desempenho dos alunos. "Os programas com essa tônica tem uma incrível capacidade transformadora."

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