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A Corte Interamericana de Direitos Humanos responsabilizou, na terça-feira (14), o Brasil pelo desaparecimento de 62 pessoas entre 1972 e 1974 na região do Araguaia, norte do país, onde militantes de esquerda realizaram uma guerrilha contra o regime militar que governava o Brasil à época.

"Além disso, a Corte Interamericana concluiu que o Brasil é responsável pela violação do direito à integridade pessoal de determinados familiares das vítimas, entre outras razões, em razão do sofrimento ocasionado pela falta de investigações efetivas para o esclarecimento dos fatos", disse a corte em comunicado.

Segundo a corte, que tem sede na Costa Rica e é parte da Organização dos Estados Americanos (OEA), o Brasil deveria permitir punições judiciais por abusos cometidos naquela época. A Justiça brasileira nunca condenou ninguém por abusos cometidos na ditadura, e o Supremo Tribunal Federal decidiu neste ano que a Lei da Anistia (1979) impede processos contra torturadores daquela época.

A corte concluiu que dispositivos da Lei da Anistia são incompatíveis com a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos.

O tribunal considera que esses dispositivos 'impedem a investigação e sanção de graves violações de direitos humanos', e considerou que eles 'não podem continuar representando um obstáculo para a investigação dos fatos do caso, nem para a identificação e a punição dos responsáveis'.

"A Corte Interamericana reconheceu e valorou positivamente as numerosas iniciativas e medidas de reparação adotadas pelo Brasil e dispôs, entre outras medidas, que o Estado investigue penalmente os fatos do presente caso por meio da justiça ordinária, afirma o comunicado.

A sentença diz também que o Estado brasileiro foi responsável por assassinatos na região do Araguaia, durante a repressão a guerrilhas esquerdistas no começo da década de 1970.

Ao contrário de outros países sul-americanos, como Chile e Argentina, os governos civis do Brasil sempre relutaram em punir militares envolvidos na ditadura, para não criar atritos com as Forças Armadas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua sucessora, Dilma Rousseff -- ex-militante torturada pela ditadura --, sempre enfatizaram a reconciliação acima da punição.

Parentes de mortos no Araguaia dizem que a decisão da Corte Interamericana deveria levar o Brasil a abrir seus arquivos militares e a permitir processos judiciais contra supostos autores de abusos.

O governo brasileiro não se manifestou sobre a decisão.

"Esperamos que a administração de Dilma Rousseff demonstre que governos democráticos não podem fechar os olhos a crimes do passado, e que estão dispostos a se empenhar para saldar a dívida histórica do país", disse em nota Beatriz Affonso, diretora para o Brasil da entidade Centro pela Justiça e o Direito Internacional.

A guerrilha do Araguaia surgiu em 1966, com a chegada de militantes comunistas que pretendiam mobilizar moradores dessa isolada região amazônica contra o regime comunista. Descobertos pelos militares, os guerrilheiros foram caçados entre 1972 e 75.

Moradores suspeitos de participarem ou apoiarem tacitamente os rebeldes foram submetidos a abusos sexuais, trabalho escravo e torturas, ou tiveram suas casas roubadas. Cerca de 70 deles desapareceram.

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