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Ponta Grossa – Quem vai à Igreja Nossa Senhora do Monte Claro, em Ponta Grossa, assistir à missa rezada pelo padre de cabelos grisalhos, óculos de aros grossos, empenhado em pregar a palavra de Deus, não imagina que ele sonha em voar. Nas horas de folga, o padre Albino Dziadzio, 61 anos, empenha toda a sua fé em trilhar o mesmo caminho de Santos Dumont, pilotando um avião construído por ele mesmo. E esse sonho está perto. O Borboleta Branca 2 (BB2) está pronto, à espera da autorização de Deus para decolar. "Quando Ele disser que estou pronto eu vou voar", diz.

A "outra vida" do padre Albino pode parecer estranha, mas é mais comum do que se imagina no meio do clero. A Diocese de Ponta Grossa não sabe ao certo o número de padres que mantêm seus hobbies nas horas vagas, fora da paróquia, mas estima que a maioria dos 60 párocos tem uma atividade paralela à religião. A diocese encara isso como uma atitude positiva, tanto por ser a válvula de escape de que todo ser humano precisa ou como forma de ampliar as oportunidades de evangelização. "Isso está dentro do direito da individualidade de cada sacerdote", diz o bispo de Ponta Grossa, dom Sérgio Arthur Braschi, ele próprio um amante da astronomia, praticada desde os tempos do seminário.

As atividades paralelas vão da pintura à lavoura, mas o que chama a atenção dos fiéis são os hobbies incomuns para a tradicional imagem de um sacerdote. Ou alguém já imaginou um padre halterofilista? Pesos, músculos e condicionamento físico são para o padre Ademir da Guia, 42 anos, uma outra forma de louvar a Deus. "O exercício físico é a oração do corpo", diz o homem de 1,58 m e 86 quilos, 70% formado por músculos. Há nove anos ele começou a malhar por orientação médica e agora já pensa em concorrer no campeonato estadual de levantamento de peso. Pelo menos esse é o incentivo diário do treinador Marcos Luiz Nenê. "O padre tem potencial para ser o campeão paranaense", afirma.

Nem mesmo quando está na esteira ou levantando 170 quilos, o que faz três vezes por semana, ele deixa de evangelizar. "Sempre tem uma pessoa ou outra que quer ouvir uma palavra de Deus, um conselho", diz. Para ele, a musculação ajuda a desmistificar a imagem angelical de um padre. "Padre também é humano", diz. A presença dele na academia causa reações que vão do entusiasmo ao espanto. Já virou rotina ouvir frases do tipo "puxa, eu pensava que padre só rezava".

Padres que mantêm atividades paralelas ao sacerdócio afirmam que isso não muda em nada a vocação e a fé, muito menos suas obrigações com a comunidade. Faz nove anos que Padre Albino constrói seu avião, mas isso não impediu que ele deixasse de se empenhar na paróquia. "Benzi milhares de pessoas, fortaleci a religião do meu povo, sou um homem de oração, como a Igreja manda. Construí a igreja matriz, o centro catequético e a casa paroquial", afirma. Paralelamente a isso, ele seguiu com a construção do BB2. Gastou cerca de R$ 15 mil, pensou detalhadamente em cada peça do avião, deu formas às placas de alumínio e pôs cada parafuso no seu devido lugar. O resultado hoje está no hangar do Aeroporto de Ponta Grossa, à espera do piloto que ainda precisa de uma autorização do Departamento de Aviação Civil (DAC). Nas laterais, a palavra de Deus: "Cristo voltará" e passagens da Bíblia. Apesar da paixão, o padre afirma que não pensa em construir um outro avião. "Só faço outro se for condição para sair do inferno", diz.

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