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A cientista Katey Anthony observa bolhas de metano que escapam do gelo do Alasca por causa da decomposição de detritos vegetais antes congelados | The New York Times
A cientista Katey Anthony observa bolhas de metano que escapam do gelo do Alasca por causa da decomposição de detritos vegetais antes congelados| Foto: The New York Times

Permafrost

Surgimento e decomposição

Um dia desses, observando um imenso vale fluvial por cima de uma ribanceira, A. David McGuire, cientista da Universidade do Alasca, em Fairbanks, traçou 2 milhões de anos de história da região. Era a geologia peculiar do oeste da América do Norte e do leste da Sibéria, segundo ele, que fez com que tantos detritos vegetais ficassem presos no gelo de lá.

Essas áreas não foram cobertas por geleiras durante a última era glacial, mas o clima era frio, com ventos poderosos. Os ventos e rios carregaram volumes imensos de lodo e poeira que se assentaram nas terras baixas do Alasca e da Sibéria.

Uma camada fina da parte superior desse solo descongelou durante os verões, e a vegetação rasteira cresceu, capturando dióxido de carbono. Nos invernos rigorosos, raízes, folhas e até mesmo partes de animais congelaram antes de poderem se decompor. Camadas sobre camadas de permafrost foram se sobrepondo.

Por várias décadas, os pesquisadores têm monitorado as temperaturas do permafrost em centenas de poços escavados ao longo do norte. As temperaturas têm ocasionalmente diminuído em algumas regiões por períodos de até mesmo uma década, mas a tendência geral tem sido uma subida implacável, com temperaturas tendo seu aumento mais rápido nas regiões mais ao norte.

O degelo tem sido mais notável nas margens sul. Por áreas imensas, incluindo boa parte do centro do Alasca, o permafrost oscila por temperaturas logo abaixo do ponto de congelamento, e espera-se que comece a degelar até os anos de 2020. No norte do Alasca e no norte da Sibéria, onde o permafrost está em pelo menos -11 graus Celsius, especialistas dizem que demorará mais.

Alasca - Uma bolha subiu por um buraco na superfície de um lago congelado. Ela estourou, seguida por outra, e outra, como se uma panela estivesse fervendo nas profundezas geladas. Cada bolha que estourava liberava uma fumaça de metano, um poderoso gás causador do efeito estufa, gerado sob o lago a partir da decomposição de detritos vegetais. A última vez que essas plantas viram a luz do dia foi há 30 mil anos e têm estado presas sob congelamento desde então – até agora.

"Este é um ponto quente", declarou Katey M. Walter Anthony, renomada cientista no estudo do escape de metano. Alguns minutos depois, ela se inclinou perigosamente sobre a extremidade do gelo, mergulhando uma garrafa na água para obter uma amostra de gás. Essa foi outra pequena pista para os cientistas, que se debatem para compreender um dos maiores mistérios no que diz respeito ao futuro da terra.

Especialistas há muito tempo sabem que as terras do norte foram um armazém para carbono congelado, preso na forma de folhas, raízes e outros tipos de matéria orgânica contida no solo gelado – uma mistura que, quando descongelada, pode produzir metano e dióxido de carbono, gases que retêm calor e aquecem o planeta. Mas eles têm ficado aturdidos recentemente ao perceberem quanto detrito orgânico existe no local. Uma estimativa recente sugere que o solo perenemente congelado, conhecido como permafrost, que cobre quase um quarto do Hemisfério Norte, contém o dobro de carbono da atmosfera inteira.

As temperaturas estão ficando mais altas em boa parte desta região, primariamente, creem os cientistas, por causa da rápida liberação humana de gases do efeito estufa. O permafrost está aquecendo também. Parte dele já descongelou, e outros sinais estão emergindo de que o carbono congelado pode estar se tornando instável.

"É como brócoli no congelador", disse Kevin Schaefer, cientista do Centro Nacional de Dados sobre Neve e Gelo (NSIDC, na sigla em inglês) em Boulder, Colorado. "Enquanto o brócoli permanece no congelador, ele continua bom. Mas depois de tirado e colocado na geladeira, ele vai descongelar e uma hora começar a se decompor."

Mais quente

Se uma quantidade substancial do carbono entrar na atmosfera, ele intensificará o aquecimento planetário. Uma possibilidade particularmente preocupante é a de que uma proporção significativa emergirá não como dióxido de carbono, o gás que geralmente se forma com a decomposição de matéria orgânica, mas como metano, produzido quando a decomposição ocorre em lagos e banhados. O metano é especialmente potente em reter o calor do sol, e o potencial para grandes novas emissões de metano no Ártico é um dos elementos mais imprevisíveis na ciência climática.

O Departamento de Energia dos EUA e a União Europeia recentemente se comprometeram com novos projetos visando essa questão, e a NASA considera um plano semelhante. Por ora, os cientistas têm mais perguntas do que respostas. Análises preliminares feitas apenas recentemente por computadores sugerem que regiões árticas e subárticas poderiam se tornar uma fonte anual de carbono igual a mais ou menos 15% das emissões anuais de atividades humanas de hoje.

Mas estes cálculos foram deliberadamente cautelosos. Uma pesquisa recente se baseou na perícia de 41 cientistas que estudam o permafrost para oferecer projeções mais informais. Eles estimaram que, se a queima de combustíveis fósseis permanecer alta, e o planeta se aquecer bruscamente, os gases do permafrost poderiam uma hora se igualar a 35% das emissões humanas anuais de hoje.

Clima seco provoca incêndios em tundra

Num dia de 2007, numa planície do norte do Alasca, um relâmpago incendiou a tundra. Historica­­mente, a tundra, uma paisagem de liquens, musgos e plantas delicadas, era úmida demais para queimar. Mas o clima na área está se aquecendo e ficando mais seco, e incêndios, tanto nas regiões de tundra, como nas de florestas do Alasca, estão aumentando.

O incêndio do Rio Anaktuvuk queimou cerca de 1 mil km² de tundra, e um trabalho sobre os sedimentos do lago demonstrou que nenhum incêndio dessa escala ocorreu na região em pelo menos 5 mil anos.

Cientistas calcularam que o incêndio e suas consequências man­­daram um enorme pulso de carbono para a atmosfera – tanto quanto seria emitido em dois anos por uma cidade do tamanho de Miami. Os cientistas dizem que o incêndio degelou a camada superior de permafrost e disparou o que eles temem ser mudanças permanentes na paisagem.

Até agora, o Ártico tem absorvido carbono, de modo equilibrado, e esperava-se que continuasse assim até o fim deste século. Mas análises recentes sugerem que o degelo do permafrost poderia transformar o Ártico numa fonte líquida de carbono, possivelmente dentro de uma década ou duas, e esses estudos não levavam em conta a possibilidade de incêndio.

"Eu mantenho que o modo mais rápido pelo qual perderemos permafrost e liberaremos o carbono do permafrost na atmosfera é pelo aumento da frequência de incêndios", disse Michelle C. Mack, cientista da Universidade de Flórida que estuda o incêndio de Anaktuvuk. "É um modo rápido e catastrófico pelo qual se pode mudar tudo completamente".

A questão essencial que os cientistas precisam responder é se os muitos fatores que eles ainda não compreendem poderiam acelerar a emissão de carbono do permafrost – ou, possivelmente, retardá-la mais do que se espera.

Nutrientes provenientes do permafrost degelado poderiam causar maior crescimento vegetal no Ártico, e as plantas poderiam absorver parte do dióxido de carbono. Por outro la­­do, caso incêndios corram pelas paisagens do norte, quantidades imensas de material orgânico em vegetação, solo, depósitos de turfa e permafrost degelado poderiam ser queimados.

Tradução: Adriano Scandolara

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