• Carregando...
A tia-avó de Matheus de Andrade, uma das vítimas, no velório: o jovem tinha começado a trabalhar em um banco há dois meses | Marcos Tristão/Ag. O Globo
A tia-avó de Matheus de Andrade, uma das vítimas, no velório: o jovem tinha começado a trabalhar em um banco há dois meses| Foto: Marcos Tristão/Ag. O Globo

Enterro

Familiares de morto querem processar dono

Agência O Globo

Muito abalados, os pais de Matheus Maia Macedo de Andrade, de 19 anos, uma das vítimas da explosão em um restaurante no Centro do Rio, estiveram ontem no enterro do filho no Cemitério de Jardim da Saudade, em Sulacap, junto a outras 50 pessoas. Selma Maia de Andrade e Carlos Henrique Macedo de Andrade não deram declarações à imprensa, mas a tia-avó Darci Macedo disse que o jovem cursava faculdade de Administração e tinha começado a trabalhar em um banco há dois meses. No momento do acidente, ela conta que Matheus seguia para uma banca comprar uma revista.

O cozinheiro Severino Antônio, de 45 foi enterrado no Cemitério do Murundu, em Realengo. Já Josemar dos Santos Barros, de 30, o sushiman da casa, foi enterrado no Cemitério de Jacarepaguá, no Pechincha. O amigo e também ex-funcionário do restaurante, Renato Fiel, contou que Josemar era obrigado a chegar uma hora antes do horário normal, que seria às 8 horas, e que o proprietário acompanhava de casa as imagens das câmeras do estabelecimento, que eram transmitidas pela internet. A família de Josemar cogita processar o dono do estabelecimento, disse o primo Thiago Barros, também ex-funcionário do restaurante.

Os três mortos na explosão receberam uma homenagem no local do acidente. O veterinário José Oscar Latorre, que não conhecia as vítimas, colocou três rosas, duas vermelhas e uma rosa, em um pequeno canteiro da praça em frente ao edifício Riqueza. Ele disse que resolveu fazer o pequeno ato em respeito às vítimas. "O Steve Jobs morre e depositam um monte de flor. Essas pessoas morrem e ninguém faz homenagem?", disse o veterinário.

  • Funcionários que trabalham no prédio puderam entrar para retirar pertences

A Polícia Civil do Rio de Janeiro ouvirá os órgãos de fiscalização para apurar se houve negligência na autorização para o funcionamento do restaurante Filé Carioca, na Praça Tiradentes, no centro do Rio. O estabelecimento, que usava e estocava ilegalmente cilindros de gás, foi palco de uma explosão na manhã de quinta-feira, onde três pessoas morreram e 17 ficaram feridas, sendo três em estado gravíssimo.O delegado adjunto da 5.ª Delegacia de Polícia do Centro, Antônio Bonfim, que antes era cauteloso ao falar da responsabilidade do poder público, ontem, após um encontro na cúpula da Polícia Civil, mudou o discurso e falou que houve um "deslize" na fiscalização. "Acreditamos na necessidade de uma resposta rápida e eficaz que tenha um efeito pedagógico para que outros não cometam este deslize, que este proprietário e os órgãos de fiscalização cometeram", disse o delegado.

Ele deve ouvir representantes da Secretaria de Ordem Pública da Prefeitura do Rio, órgão fiscalizador dos estabelecimentos com alvarás provisórios, o Corpo de Bombeiros, responsável pela fiscalização de segurança do comércio, a concessionária Companhia Estadual de Gás (CEG), que já confirmou não fornecer o produto para o prédio por falta de condições nas instalações. Enésio Madeira, síndico do edifício onde funcionava o Filé Carioca, também será ouvido. Ele disse à imprensa que o uso de gás era proibido no prédio e garantiu desconhecer como o restaurante era abastecido.

O delegado ouviu 14 depoimentos de testemunhas durante toda a noite de quinta. Ele informou que os peritos trabalham 24 horas para "arrecadar tudo o que é necessário para a elucidação do caso". Hoje, o dono do restaurante, Carlos Rogério do Amaral e o irmão dele Jorge do Amaral, que era gerente da casa e costumava abrir a loja, devem prestar depoimento.

Os funcionários confirmaram à polícia que o abastecimento do gás do restaurante era feito de forma clandestina no subsolo. Na terça-feira, parte da bateria de cilindros de gás que abastecia a cozinha foi trocada. No entanto, eles acreditam que o vazamento continuou e ficou confinado durante todo o dia seguinte, que era feriado e o comércio não abriu. Anteontem, quando retornaram ao trabalho, todos os empregados sobreviventes disseram que sentiram um forte cheiro de gás dentro da loja. O jornaleiro da banca próxima ao restaurante afirmou que um funcionário identificado como José Roberto comprou um maço de cigarros momentos antes do estrondo.

Segundo a empresa contratada pela prefeitura para a retirada de entulho do edifício, o impacto causado pela explosão foi equivalente à detonação de 5 a 10 quilos de dinamite – mesma quantidade utilizada para a implosão de uma pequena casa. A retirada de destroços deve se estender pelas próximas duas semanas. Os engenheiros avaliaram que as estruturas do edifício Riqueza estão preservadas, mas pode ser necessário refazer vigas e lajes.

Donos de salas no edifício fizeram fila ontem para recuperar pertences que ficaram dentro do prédio. A empresária Cristiane de Souza Garcia estima que tenha perdido R$ 40 mil em sua loja de venda de cabelo.

Lei pode ter erros, diz prefeito Eduardo Paes

A prefeitura do Rio de Janeiro montou uma equipe de técnicos para reformular a legislação que determina as normas para a concessão de alvarás a estabelecimentos comerciais do município. A decisão foi tomada após a constatação de que o restaurante Filé Carioca obteve e renovou cinco vezes sua autorização para funcionar, mesmo sem um laudo do Corpo de Bombeiros. "No caso de terem sido cumpridas as normas por parte da prefeitura e dos bombeiros, algo está errado na legislação", afirmou o prefeito Eduardo Paes. "Se for o caso, vamos revisar a lei que concede alvarás provisórios, pois pode haver outros imóveis na mesma situação que ofereçam risco". O decreto que estabelece regras para a concessão de licenças para atividades econômicas na cidade só passou a exigir a apresentação de um certificado do Corpo de Bombeiros em setembro de 2008. O alvará provisório do restaurante Filé Carioca, no entanto, foi concedido um mês antes.

Para continuar funcionando, o restaurante poderia renovar o documento quantas vezes desejasse. Respaldados pelo texto antigo do decreto, os donos só precisariam apresentar o laudo dos bombeiros se precisassem de um alvará definitivo, o que jamais foi feito. Em 2010, o Corpo de Bombeiros emitiu um laudo que proibia o uso de gás canalizado ou de botijões no edifício onde funcionava o restaurante, por falta de estrutura adequada para este fim.

A partir de então, cada estabelecimento deveria solicitar uma vistoria para obter autorização para a instalação dos equipamentos. A fiscalização do uso de gás só é feita quando a corporação recebe uma denúncia ou quando um restaurante solicita a concessão de um laudo. O advogado Bruno Castro, que representa o dono do Filé Carioca, não retornou as ligações feitas pela reportagem ontem.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]