• Carregando...

Atrasos constantes das verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) têm levado hospitais filantrópicos do Paraná a recorrer a empréstimos bancários ou a reduzir o número de funcionários para manter as portas abertas. A causa da asfixia financeira de 65 dessas instituições estaria na burocracia da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa). De acordo com a Federação das Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Beneficentes do Paraná (Femipa), o Ministério da Saúde faz os repasses em dia, mas por algum motivo o dinheiro demora até 50 dias para chegar ao destino final.

Não é de hoje que os atrasos prejudicam os hospitais filantrópicos nas cidades onde a prefeitura não está apta a gerenciar as verbas federais (o que fica a cargo da Sesa), problema inexistente nas que têm gestão plena de saúde, onde o município é o intermediário do dinheiro. Presidente da Femipa, o advogado Maçazumi Furtado Niwa diz que a crise do setor completou uma década, mas se agravou muito de quatro anos para cá. Assessor jurídico da entidade por 11 anos, ele conclui: "Os hospitais nunca estiveram com tantas dificuldades como agora".

Aos prejuízos permanentes, cumulativos mês a mês por causa dos baixos valores pagos pelo SUS, somam-se também os prejuízos recorrentes, estes decorrentes dos atrasos sistemáticos nos repasses. "O dinheiro é pouco e ainda atrasa", diz Niwa. O SUS cobre só R$ 60 de um procedimento de R$ 100, por exemplo. O hospital tem de buscar a diferença entre os pacientes particulares, coisa rara nas cidades do interior. Desse jeito as contas não podem bater mesmo. O resultado desse problema histórico está no caixa dos 83 hospitais filiados à Femipa, que ao final de 2005 acumulavam dívidas de R$ 253 milhões.

Lentidão

Fossem pontuais, os repasses do SUS poderiam amainar a crise. Pelo menos não haveria o custo dos juros bancários. Mas nem isso. Segundo a Femipa, o Ministério da Saúde repassou ainda no dia 6 de dezembro ao governo do estado a verba dos serviços prestados em novembro, mas o dinheiro só chegou aos hospitais na sexta-feira passada, dia 19. Ou seja, 43 dias depois. Se tivesse chegado em dia, teria quebrado um círculo vicioso na Santa Casa de Pitanga, Centro do estado. Pelo terceiro ano consecutivo a direção do hospital teve de recorrer ao banco para pagar o 13.º salário dos funcionários.

A situação vai de "razoável para ruim", avalia o provedor da Santa Casa, Édson Huber. O hospital recebe, em média, R$ 96 mil por mês pelos atendimentos do SUS e também teve de usar o limite do banco para recolher o INSS e o FGTS do pessoal. De acordo com a administração, em dezembro os atendimentos pelo SUS, somados às gratuidades, chegaram a 80% do faturamento. Para amenizar a crise, o hospital não está preenchendo as vagas abertas pelos funcionários que se aposentam. "O problema é que a população não entende que a culpa não é nossa", diz Huber.

Não tem sido nada fácil manter o ânimo dos funcionários diante dos constantes atrasos salariais. É uma reação em cadeia que desorganiza a vida nos hospitais filantrópicos, atrapalha o planejamento e afugenta bons profissionais. Numa semana apenas, a Santa Casa de Misericórdia de Cambé, no Norte, perdeu dois de seus médicos para o sistema público de saúde da vizinha Londrina, que deu um aumento de 35% para a classe. "Como manter um médico se nem pagar em dia estamos conseguindo?", queixa-se a direção do hospital.

A Santa Casa de Cambé recebe, em média, R$ 200 mil por mês do SUS. O prejuízo é cumulativo: o não cumprimento em dia com as obrigações junto aos fornecedores e o conseqüente acréscimo de juros nos valores das faturas. Na espiral dos empréstimos e juros bancários entra a qualidade do atendimento médico-hospitalar. A maior vítima desse sistema é o cidadão, que não encontra o atendimento prometido pela propaganda oficial. Já para a administração da Santa Casa de Ponta Grossa, a dificuldade está no uso do crédito rotativo para cobrir os encargos do começo de cada mês e a folha de pagamento.

Atrasos de até 20 dias passaram a ser constantes desde 2002. Antes disso, o dinheiro era recebido 25 dias depois de apresentados os valores dos serviços. Hoje os hospitais que dependem da intermediação da Sesa têm de esperar até 50 dias para receber do dinheiro do SUS. Os hospitais filantrópicos de cidades em gestão plena – como Curitiba, Londrina, Maringá, Apucarana, Campo Mourão, Foz do Iguaçu e Terra Boa – não têm o mesmo problema, já que o pagamento é repassado pelos municípios.

Segundo a Femipa, antes do segundo turno da eleição para governador, no ano passado, a diretoria da entidade se reuniu com representantes da Sesa, que afirmaram que o governo estaria disposto a buscar uma parceria nos próximos quatro anos. A expectativa da federação era de que os atrasos, que já haviam ocorrido outras vezes, não se repetissem.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]