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Vídeo | Reprodução RPC TV
Vídeo| Foto: Reprodução RPC TV

O projeto que prevê a construção do Centro Judiciário do Paraná no local em que funcionava a antiga Prisão Provisória de Curitiba, no Ahú, tem tirado o sono de pelo menos 15 famílias que moram nas redondezas. No mês passado, moradores de áreas próximas, nas ruas Chichorro Júnior, Doutor Manuel Pedro e Passionistas, começaram a receber notificações sobre a desapropriação dos imóveis, que serão incorporados à área do futuro Centro. Eles reclamam que os valores ofertados pelo governo do estado estão abaixo dos preços de mercado e pretendem recusar as propostas para tentar obter a diferença na Justiça. As áreas a ser desapropriadas somam cerca de 9,3 mil metros quadrados.

Dezesseis imóveis serão desapropriados, mas um dos donos não mora no local. Para quem vive na região, o futuro é incerto. "Gastei a minha vida nesta casa", afirma o empresário Daniel Lopes da Silva, 50 anos, que recebeu uma proposta de R$ 207.172,25 por uma área de 230 metros quadrados construídos. "Pelas avaliações de imobiliárias, nesta região o metro quadrado construído vale pelo menos R$ 1,5 mil."

Silva mora há 40 anos no local. Hoje, vive com a esposa e dois filhos adolescentes. A mãe dele, de 82 anos, mora em um casa nos fundos do terreno. Ela calcula que o imóvel vale pelo menos R$ 345 mil, sem contar a valorização da região com a desativação do presídio. "Onde eu vou achar uma casa nesta localidade, no padrão da minha, por R$ 200 mil?", questiona.

Para o aposentado Alcenir Cooper, 60 anos, faltou respeito por parte do governo do estado. "Não vieram nos mostrar o projeto, nem conversar com a gente. Será que agora os prisioneiros somos nós?", questiona. "Meu pai e meu avô trabalharam no presídio e agora estamos sendo remanejados como gado. O governo deveria nos tratar como cidadãos, e não como gado."

A revolta do empresário João Garcia, 46 anos, é parecida. "Moro aqui desde 1987, mas a família da minha esposa vive há mais de 70 anos na região. Roemos o osso durante toda a vida com esse presídio ao lado. Agora, quando estamos chegando perto do filé, querem que a gente vá embora."

Pela metade

O corretor Zakaria Ali Samad, representante do dono de dois imóveis que entraram na lista das desapropriações, estima que os bens foram avaliados pela metade do preço, no caso de terrenos sem benfeitorias. Em terrenos com áreas construídas, segundo ele, foi ofertado até um terço do valor de mercado. "Ofereceram R$ 228 mil por uma área de 700 metros quadrados e R$ 214 mil por outra, de 270 metros", conta. "Só esse de R$ 228 mil vale quase RS 650 mil. São mais de 420 metros quadrados de área recém-construída, e o imóvel foi reformado recentemente." Segundo Samad, o preço do metro quadrado (em um terreno sem benfeitorias) varia de R$ 400 a R$ 600.

Um morador de 51 anos que pediu para não ter o nome divulgado diz que não tem condições de comprar outro imóvel na região pelo valor oferecido. "Não posso me dar ao luxo de ser desapropriado dessa maneira. Não tenho a necessidade nem a pretensão de vender meu imóvel, ainda mais por um valor como esse", critica. Aos 79 anos, um tenente reformado da Polícia Militar, que também pediu para ter a identidade preservada, se disse surpreso: "Ainda não fui notificado, mas soube pelos outros que meu imóvel faz parte da área. Trabalhei 47 anos para o estado e é isso que recebo."

Nas notificações que comunicam as desapropriações, os moradores são informados que a avaliação dos imóveis foi feita pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e que as áreas foram declaradas de utilidade pública pelo Decreto Estadual 39, publicado no Diário Oficial do Estado em 29 de janeiro de 2007. O documento informa que os recursos destinados às indenizações sairão do Fundo Judiciário, criado para este fim pela Lei Estadual 15.337, de dezembro de 2006. A notificação é assinada pelo coordenador do Patrimônio do estado, Luiz Alberto Pinto de Carvalho. A Coordenadoria do Patrimônio Público é ligada à Secretaria de Estado da Administração e da Previdência.

Jardim e estacionamento

Os 16 imóveis formam duas áreas distintas. Uma delas, que fica de frente para as ruas dos Passionistas e Doutor Manuel Pedro, tem 7.510 metros quadrados. A outra, de frente para a Rua Chichorro Júnior, soma 1.863 metros quadrados. Segundo Édson Klotz, arquiteto da Secretaria de Estado de Obras Públicas (Seop), os terrenos serão utilizados apenas como uma expansão do Centro Judiciário. "(As áreas) serão agregadas ao terreno para aumentar a área de ajardinamento e estacionamento", diz Klotz, integrante da comissão da Seop que está coordenando o projeto arquitetônico e preparando as licitações para a execução das obras. Segundo ele, ainda não há uma previsão para o início das obras.

Além da Seop, a reportagem entrou ontem em contato com a Secretaria de Estado da Administração e com a Procuradoria-Geral do Estado. A assessoria da Secretaria de Administração ficou de checar a situação, mas não houve retorno até o fechamento desta edição. Na PGE, a reportagem foi informada de que a pessoa que poderia falar sobre os critérios utilizados na avaliação dos imóveis estava fora. Segundo a assessoria da PGE, a informação poderia ser repassada hoje.

Na Justiça

De acordo com o advogado e professor da Escola de Magistratura do Paraná Fernando Knoerr, a única saída para quem tem um imóvel desapropriado pelo poder público é recorrer à Justiça para tentar obter o valor real do bem. O proprietário deve recusar oficialmente a proposta; se aceitá-la, a negociação estará automaticamente terminada, e o imóvel quitado. "A lei abre esse espaço para que a administração escolha o que é oportuno para o interesse público", explica o advogado. "Não cabe ao particular individualmente considerado se opor à execução de interesse público."

No caso de pessoas que brigam na Justiça para tentar obter uma indenização maior, o poder público deve depositar o valor ofertado na conta do proprietário, que tem o direito de sacar até 80% do total enquanto a ação tramita. "A desapropriação não se executa em um só ato. Ela só pode ser realizada através de um processo onde seja garantido ao proprietário o direito ao contraditório e à sua defesa", afirma Knoerr. "Costumeiramente a administração pública avalia a menor. A partir do momento em que se aceita, quita-se e (o proprietário) não pode reclamar mais."

Quando estiver funcionando, o Centro Judiciário vai abrigar as varas judiciais da capital, que atualmente funcionam em 16 prédios diferentes. Segundo o governo do estado, o aluguel destes imóveis gera uma despesa mensal de R$ 160 mil aos cofres públicos. O projeto prevê um prédio para cada especialidade (cível, criminal e juizados especiais). As obras terão um investimento de R$ 230 milhões e deverão durar quatro anos.

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