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Depois de o ministro Luiz Fux pedir “vista” e suspender o julgamento da mulher acusada de escrever com batom a frase “perdeu, mané” na estátua da justiça, o caso de Débora Rodrigues volta ao plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta sexta-feira (25).
“Estamos ansiosos”, afirma a técnica de enfermagem Cláudia Silva Rodrigues, irmã da cabeleireira, em entrevista à Gazeta do Povo. “Vimos Deus atuar de forma grandiosa para que hoje a Débora estivesse em casa, e acreditamos que Deus completará o milagre.”
Ainda segundo a irmã, a família espera que o olhar humanitário dos ministros no caso possa influenciar outros processos de pessoas envolvidas no 8/1 que também estão sofrendo. “Nos importamos com quem ainda está na prisão sendo agredido e sofrendo humilhações, e pelas pessoas que seguem exiladas em outros países, passando necessidade”, disse.
Então, “que o voto do Fux seja o voto do milagre, e que tudo seja para glorificar o nome de Deus”, completou, agradecendo a cada pessoa que compartilhou o caso de Débora e se posicionou a respeito. “Essa causa se tornou uma causa de todos, e nossa família será eternamente grata.”
“Essa causa se tornou uma causa de todos, e nossa família será eternamente grata.”
Cláudia Silva Rodrigues, irmã da cabeleireira Débora Rodrigues, que pichou a estátua da Justiça com batom
Defesa de Débora Rodrigues espera absolvição
Em 21 de março, o relator Alexandre de Moraes apresentou voto para condenar a moradora de Paulínia (SP) a 14 anos de pena, entendimento que foi seguido pelo ministro Flávio Dino. No entanto, a desproporcionalidade da sentença foi bastante criticada pela opinião pública, e o ministro Luiz Fux suspendeu o julgamento por um mês.
“Vou fazer revisão da dosimetria”, afirmou Fux em 26 de março, enquanto julgava a denúncia de suposta tentativa de golpe que envolve o ex-presidente Jair Bolsonaro. “Confesso que em determinadas ocasiões me deparo com peça exacerbada e, por isso, pedi vista do caso”, completou o ministro na ocasião, em referência ao processo de Débora Rodrigues.
Agora, Fux e os ministros Cristiano Zanin e Cármen Lúcia apresentarão seus votos no julgamento, e a defesa espera absolvição. “É inaceitável que Débora seja condenada por crimes como golpe de Estado, associação armada ou abolição violenta do Estado Democrático de Direito”, apontam os advogados Hélio Júnior e Tanieli Telles, ao reiterarem que o único ato cometido pela mulher foi o de ter passado batom em uma estátua.
“Embora impensado, foi apagado já no dia seguinte, conforme consta em laudo técnico da Polícia Federal, e não gerou qualquer consequência ou risco à ordem pública”, afirmam os advogados.
Advogados também esperam que Moraes e Dino revisem seus votos
A defesa também cita a possibilidade de que os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino revejam suas decisões. “A aplicação de penas altíssimas com base em imputações genéricas, ausência de individualização de condutas e a criminalização de atos simbólicos e isolados provocaram desequilíbrios inaceitáveis no sistema de justiça”, afirmam.
Portanto, “tal movimentação, ainda que embrionária, é um sinal de que o Supremo Tribunal Federal pode estar sensível aos apelos por justiça individualizada, proporcional e respeitosa às garantias fundamentais”.
“A revisão de votos não enfraquece o Judiciário, pelo contrário, fortalece sua credibilidade, reafirma sua abertura ao contraditório e comprova sua disposição de ouvir a sociedade e corrigir injustiças.”
Hélio Júnior e Tanieli Telles, advogados de Débora Rodrigues
Ainda segundo os advogados, a eventual mudança de posicionamento desses ministros no caso de Débora Rodrigues representará mais do que uma revisão jurídica. “Será também um gesto humanitário e pacificador”, garantem, ao afirmar que “o momento exige grandeza”.
Afinal, “a revisão de votos não enfraquece o Judiciário, pelo contrário, fortalece sua credibilidade, reafirma sua abertura ao contraditório e comprova sua disposição de ouvir a sociedade e corrigir injustiças”.
Relembre o caso de Débora Rodrigues
Moradora de Paulínia, em São Paulo, Débora tem 39 anos, e foi presa em 17 de março de 2023, alvo da oitava fase da Operação Lesa Pátria, deflagrada pela Polícia Federal (PF). Ela passou mais de 400 dias na prisão sem denúncia — quase 12 vezes mais que o prazo estabelecido em lei —, e seus advogados sempre afirmaram que as acusações contra ela são “genéricas”.
Em junho de 2024, o jurista Rodrigo Chemim, doutor em Direito de Estado, afirmou à Gazeta do Povo que indivíduos que picham, grafitam ou sujam algum monumento costumam ser punidos com pagamento de cestas básicas, pois se trata de “crime de menor potencial ofensivo”.
No entanto, reportagem publicada em janeiro deste ano mostrou que não só no STF mas também no governo Lula há a tese de que os participantes das manifestações do 8/1 merecem tratamento análogo ao de criminosos hediondos e, em alguns casos, pior que o dispensado a narcotraficantes.
A mulher escreveu uma carta de desculpas a Moraes
Débora chegou a escrever, em 2024, uma carta pedindo desculpas a Moraes. “Repudio o vandalismo, contudo eu estava ali porque eu queria ser ouvida, queria maiores explicações sobre o resultado das eleições tão conturbadas de 2022. “Por isso, no calor do momento cheguei a cometer aquele ato tão desprezível (pichar a estátua)”, disse no texto.
Ainda segundo a carta, quando Débora estava próxima à estátua, um homem que ela não conhecia estaria escrevendo a frase e teria pedido para que ela terminasse a escrita, pois sua letra era ilegível. “Me arrependo deste ato amargamente, pois causou separação entre mim e meus filhinhos”, afirmou.
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