Catorze dias após a juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima, da Justiça Federal em Belo Horizonte (MG), declarar-se incompetente para julgar os réus da chamada Chacina de Unaí, transferindo o tribunal de júri de Belo Horizonte para a cidade onde, em 2004, quatro servidores do Ministério do Trabalho foram assassinados, o Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF-MG) ainda aguarda a cópia do processo para poder concluir o recurso contra a decisão judicial.

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Na última segunda-feira (4), a procuradora da República Mirian Moreira Lima apresentou à 9ª Vara a manifestação preliminar do MPF contra a sentença. O recurso, contudo, depende da análise dos autos. Só após conhecer as justificativas da juíza para não presidir o julgamento da ação penal – que há nove anos tramita na capital mineira –, a procuradora terá condições de preparar os argumentos com os quais vai tentar demonstrar que a transferência do júri é "infundada" e "contraria ao que estabelece a legislação".

"A decisão da juíza não observou as normas constitucionais. A lei de organização do Judiciário Federal e Estadual são diferentes e a juíza não levou em conta o artigo da legislação federal que determina que o juiz onde a ação foi proposta deve presidir o tribunal", disse a procuradora à Agência Brasil, ao se referir ao Decreto-Lei nº 253, de 1967.

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No Artigo 4º, o decreto-lei estabelece que, nos crimes de competência da Justiça Federal, a presidência do Tribunal do Júri cabe ao "juiz a que competir o processamento da respectiva ação penal". Ou seja, onde o processo foi ajuizado. De acordo com a procuradora, o Tribunal Regional Federal (TRF), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) já avalizaram esse entendimento.

"Esse será o principal fundamento do Ministério Público para tentar reverter a decisão no Tribunal Regional Federal. A legislação não permite que, neste estágio, os autos devam ser encaminhados para a vara recém-criada em Unaí", acrescentou a procuradora, adiantando que, caso o recurso seja rejeitado, o MPF vai pedir o desaforamento do caso, que é a transferência do júri de Unaí para outro local a fim de preservar as condições de um julgamento imparcial, seguro e rápido.

"As pessoas denunciadas tem um poder econômico e político muito grande em Unaí, razão por que a cidade pode não ser o melhor local para o julgamento deste júri", argumentou Mirian.

O crime, que chegou a repercutir mundialmente, ocorreu em 28 de janeiro de 2004. Emboscados enquanto faziam uma fiscalização de rotina na zona rural de Unaí, a cerca de 500 quilômetros de Belo Horizonte, os auditores fiscais do Trabalho Erastótenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva e o motorista Ailton Pereira de Oliveira foram mortos a tiros.

Ao fim de seis meses de investigação, a Polícia Federal pediu o indiciamento de nove pessoas por homicídio triplamente qualificado: os fazendeiros e irmãos Antério (ex-prefeito da cidade e um dos maiores produtores de feijão do país) e Norberto Mânica; os empresários Hugo Alves Pimenta, José Alberto de Castro e Francisco Elder Pinheiro; além de Erinaldo de Vasconcelos Silva e Rogério Alan Rocha Rios, apontados como autores do crime; Willian Gomes de Miranda, suposto motorista da dupla de assassinos, e Humberto Ribeiro dos Santos, acusado de ajudar a apagar os registros da passagem dos pistoleiros pela cidade.

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Um dos réus, o empresário Francisco Elder, morreu no último dia 7, aos 77 anos. Ele aguardava o julgamento em liberdade. Erinaldo, Rogério e Willian estão presos em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, à espera da sentença judicial. Ribeiro dos Santos foi solto a pedido do próprio MPF, pois o crime pelo qual foi denunciado prescreveu. Os outros réus aguardam o julgamento em liberdade, beneficiados por habeas corpus. Um deles, Antério Mânica, foi eleito prefeito de Unaí pouco depois do crime e reeleito em 2008.

Ao comentar as ações da defesa dos réus para protelar o julgamento e a demora da própria Justiça para levar o assunto a júri, a procuradora Mirian Moreira Lima disse não saber estimar quanto tempo mais a discussão sobre a decisão da juíza poderá atrasar o julgamento.

"O Ministério Público vai ser bem célere, mas isso ainda comporta intervenções da defesa [dos réus]. Então, é difícil e não podemos responder quanto tempo vai demorar. Pode ser uma questão de meses ou de dias. Tudo vai depender da reação da defesa, já que se a Justiça acatar o recurso do Ministério Público, a defesa poderá voltar também a recorrer", concluiu a procuradora.

A Agência Brasil entrou em contato com a assessoria do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) para saber se há previsão de quando a procuradora deve ser intimada para apresentar as razões do recurso. A assessoria do órgão informou que o assunto segue "a tramitação processual normal" e que a juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima só se manifesta sobre o processo nos autos.