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Aluguel, contas atrasadas, dívidas. Para muita gente, essa soma é sinônimo de sérios problemas no final do mês. Mas quem tem cabelos compridos e bem tratados recorre cada vez mais a uma saída no mínimo curiosa para saldar as pendências: vender as madeixas. Pelo menos é o que garantem os comerciantes dos cerca de 15 salões de beleza que compram e vendem cabelo nas proximidades do Terminal Guadalupe, no Centro de Curitiba. Segundo eles, grande parte da clientela é formada por pessoas em dificuldades financeiras.

O preço oferecido varia bastante na região. Um cabelo castanho, de comprimento médio, ondulado e bem tratado – como o da repórter – varia entre R$ 120 e R$ 300. A avaliação capilar leva em conta comprimento, volume e qualidade. Cabelos "virgens" (que não passaram por tintura ou outro tratamento químico) valem mais. Os loiros naturais são top de linha. De acordo com os compradores, os cabelos de clientes entre 10 e 30 anos são o de melhor qualidade.

Os salões usam os cabelos comprados para fazer perucas e, principalmente, para alongamentos capilares. Grande parte do produtos comprados no Guadalupe vai parar nos salões chiques da cidade. A região reúne tanto salão comprador por uma razão simples: a maioria dos vendedores vem da região metropolitana – fazendo uso, portanto, do terminal de ônibus.

Antes de serem utilizados no alongamento ou nas perucas, os cabelos passam por vários processos para melhorar de qualidade – serviços que custam entre R$ 500 a R$ 1,2 mil.

O comércio de cabelos ganhou força há cerca de dez anos. Antes disso, não havia compra e venda regular. Até que alguns cabeleireiros viram uma boa oportunidade de incrementar os negócios. "Achei que ia ser só uma fase, mas o comércio se manteve", diz o cabeleireiro José Jorge Martins.

De acordo com a proprietária do Art & Néia Cabelo, Rosinéia de Oliveira, hoje faltam cabelos na praça. Ela comprava, em média, cinco peças por dia. Agora, leva pelo menos uma semana para reunir cinco mechas. "Falta quem queira vender. Afinal, um cabelo leva de quatro a cinco anos para ficar comprido", diz. Eles crescem cerca de um centímetro por mês.

José Alvino Godoi, conhecido como Zé do Cabelo, foi um dos primeiros a investir no ramo e é considerado pelos colegas uma referência – chega a comprar cem peças por mês. Paga de R$ 100 a R$ 300 cada uma. O lucro, na hora de revender, diz ele, é de 20%. Zé do Cabelo conta que chegou a pagar R$ 1 mil por 70 centímetros de um cabelo loiro, liso e "virgem". Trabalhar um cabelo assim é mais fácil, pois o resultado das químicas feitas para adaptar o produto ao gosto do cliente que vai receber o alongamento é mais previsível e fácil de controlar.

Histórias

O compra-e-vende de madeixas envolve uma série de histórias divertidas e comoventes. Zé do Cabelo ainda ri quando lembra de uma senhora que depois da primeira tesourada desistiu do corte. Foi embora só com uma parte da cabeleira. No outro dia, voltou e terminou a "obra". Rosinéia lembra do caso de três garotinhas. "Elas cortaram o cabelo, juntaram o dinheiro e deram para os pais pagarem o aluguel", conta. Já um grupo de amigos tinha um objetivo menos nobre: gastar o dinheiro com cerveja.

Rosinéia recorda-se, também, de uma criança que vendeu os cachos para comprar uma boneca; outra, queria uma mochila para ir à aula; e houve até cliente que resolveu cortar o cabelo porque a irmã estava com câncer. "Tiramos de uma e colocamos na outra. As duas ficaram com cabelo chanel", conta.

Nem só atrás de dinheiro estão os vendedores de cabelo. Há gente que resolve fazer uma mudança radical de visual; outros querem mais praticidade; há quem tem de cortar por recomendação médica e quem tem receio de ir cabeludo atrás de emprego.

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