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Drummond: poesia musicada por Villa-Lobos | Divulgação
Drummond: poesia musicada por Villa-Lobos| Foto: Divulgação

Poesia

Os 25 Poemas da Triste Alegria

Carlos Drummond de Andrade. Organização de Antônio Carlos Secchin. Cosac Naify. 144 págs., R$ 79,90.

Havia um ponto oculto na trajetória de Carlos Drummond de Andrade – os seus anos iniciais como escritor. Bibliófilo, crítico e principalmente poeta, Antônio Carlos Secchin recuperou o exemplar único do livro Os 25 Poemas da Triste Alegria, que Drummond organizou em 1924, material que a Cosac Naify agora publica em primorosa edição fac-similar. Ali está o poeta em trajes antigos, vestido com pijama de seda, mas também o poeta-crítico, que escreve comentários à margem dos poemas, negando, pela ironia, aquele tempo, aquela linguagem, aquele vestuário. O livro permite acompanhar a passagem de Drummond do penumbrismo para o Modernismo. Mais, ele mostra qual foi o universo linguístico que precisou negar para descobrir a sua voz.

Para esta compreensão de corpo inteiro do autor, a edição organizada por Secchin traz alguns textos de crítica escritos por Drummond na época, e que são fundamentais para compor a moldura dos poemas, pois um livro é também o ideário de seu autor.

Nesses textos, podemos identificar um eixo judicativo. Drummond nega o nacionalismo, tomando-o como limitador, e faz o elogio dos poetas que buscam uma universalidade pelo sentimento. Nas suas avaliações dos poetas, sobressaem os que constroem uma obra na língua internacional de um estilo literário, recusando os característicos locais. Ele elogia Olavo Bilac, Ronald de Carvalho, Manuel Bandeira, Guilherme de Almeida e deixa vazar veladas restrições a Mário de Andrade e Oswald de Andrade, que estariam preocupados em valorizar o elemento brasileiro.

Outra linha de força dos artigos é o conceito de mestre. Drummond entende que o novo momento tem como marca a ausência de mestres – cada um é mestre de si próprio. É preciso lembrar que esta postura vem de Mário de Andrade de Pauliceia Desvairada (1922), livro que ele dedica ao mestre Mário de Andrade. No entanto, Drummond se mostra, na prática, ainda sujeito a um mestre. Secchin transcreve e comenta as avaliações de Mário sobre os poemas do jovem mineiro. São avaliações duras, que poucos escritores em início de carreira suportariam. O mestre paulista agia sobre os jovens, conduzindo-os à modernidade. Drummond recusará o livro criticado pelo amigo, mas publicará aqui e ali – na imprensa – boa parte dos poemas. É que ele viveu entre a recusa daquele poeta que ele foi e a sua aceitação constrangida. Daí a importância desta edição. Ela devolve ao leitor uma obra que não foi totalmente recusada pelo autor.

Drummond escreveu os seus poemas usando as palavras consagradas da época, com uma forte influência de uma literatura francesa convencional. O idioma com o qual ele opera não lhe pertence. Abundam tardes, noites, lírios, mulheres comedidamente sensuais, o subúrbio, a tristeza etc. Tudo tende para a pose. O poeta não escreve os poemas; é escrito por eles. "A Noite – Como uma Lua Não É Séria" serve para compreender esta poesia. O poeta fala de leituras de dois dramaturgos franceses e trata de um conjunto de elementos cenográficos como fórmula para se obter o texto. Nada define melhor o próprio poema, que também é cenográfico, tão falso quanto a lua de papelão a que se refere. Drummond não mostra a noite, apenas a representa tal como está no ideário da literatura.

Como contraponto, e que indicaria a opção pela leveza, está o poema "Convite", em que Drummond canta a franqueza, os sentimentos claros, a casa despovoada de obras de arte e de livros. Mesmo que esta seja apenas mais uma encenação, eis o caminho que Drummond vai percorrer, livrando-se das palavras e conceitos convencionais para olhar o mundo imediato sem filtros (e com consciência do valor do local), deixando assim de ser um ventríloquo. É significativo que a única palavra que ele troca, no livro todo, é aposento por quarto (em "Gravado numa Parede"), num anúncio da naturalização da linguagem literária que ele empreenderá nos anos seguintes.

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