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Ensino fundamental de 9 anos pode melhorar qualidade

"Hoje vivemos numa ideologia de consumo", afirma Lilian Anna Wachowicz, conselheira estadual de Educação. "E os pais ficam numa espécie de competição, para poderem dizer aos amigos que o filho aprendeu a ler e escrever antes, mais rápido. Isso não é o que importa. O importante é a criança aprender quando estiver pronta", diz.

Segundo os educadores, para agradar os pais, que têm pressa em ver resultados no aprendizado, muitas vezes a escola privada insiste demais em forçar a alfabetização precoce. "Você não pode mecanizar o ensino", diz Nara Salamunes, diretora do Departamento de Ensino Fundamental da prefeitura de Curitiba. "Se a criança viver num ambiente que a estimule e ela aprender naturalmente aos 4 anos, ótimo. O que não dá é para pôr uma criança dessa idade para ficar desenhando repetidamente letras ou para fazer outros exercícios do gênero", afirma.

Segundo ela, o papel da escola é incentivar a criança a descobrir por si própria o quanto a escrita pode ser importante. Por isso, é mais importante fazer com que ela leia um bilhete, por exemplo, do que exigir que ela escreva uma mesma palavra diversas vezes. "Paulo Freire, que foi nosso maior educador, já mostrou que as pessoas aprendem mais fácil quando aquilo que é ensinado faz parte do mundo em que elas vivem", diz Lilian Wachowicz.

Professora responsável por alfabetizar turmas há 30 anos, Carmen Franco Cruz não tem dúvidas em afirmar: o aumento de oito para nove anos no ensino fundamental representa uma melhora sem precedentes na educação do país. A inclusão de mais um ano é uma das armas que os educadores pretendem utilizar para melhorar a qualidade do ensino brasileiro. No caso da alfabetização, a diferença será fundamental, já que os alunos passarão a freqüentar a escola um ano antes do que ocorre hoje.

"Quase nenhum aluno chega aqui sem saber nada do alfabeto", diz Carmen, comentando sobre as crianças de 7 anos que ingressam no Colégio Municipal São Luiz, no Água Verde, em Curitiba. "Mas podendo começar um ano antes, elas vão chegar aos 7 com um nível de desenvolvimento muito melhor", afirma ela.

A antecipação do ensino das primeiras letras trará uma vantagem adicional. "Cada criança chega com um grau de conhecimento", conta Silvana Carvalho, colega de alfabetização de Carmen no São Luiz. "E sempre quem começa com alguma vantagem vai ficar um pouco à frente. É muito difícil igualar todo mundo em sala de aula", comenta. Começando a alfabetização aos 6 anos, é menos provável que algum aluno esteja muito à frente dos demais. E todos vão começar mais ou menos do mesmo ponto.

Apesar de saberem que começar cedo pode ser uma vantagem, os especialistas não recomendam, porém, que a iniciação na escrita já nos primeiros anos seja forçada pela escola ou pelos pais.

A história é real e se passa em Curitiba: duas meninas se transferem de uma escola para outra. Estão com 10 anos, freqüentam a 4.ª série. Quando vão começar a estudar na escola nova, as professoras reparam em um problema. Nenhuma das duas sabe ler. E nenhuma das duas sabe escrever. Não é que elas tenham alguma dificuldade com as letras. Realmente não têm noção de alfabetização. O problema é que todos os seus colegas foram alfabetizados três anos atrás, e agora elas estão completamente defasadas em relação ao resto da turma.

A situação não é um caso à parte, nem é exclusividade de escolas públicas. Lendo dados do próprio Ministério da Educação, especialistas chegam a dizer que 55% das crianças que chegam à 4.ª série – em escolas privadas ou públicas – não sabem ler e escrever da maneira como se esperaria. São alunos que muito provavelmente vão engrossar mais tarde o enorme contingente de analfabetos funcionais do país. Segundo o reconhecido Instituto Paulo Montenegro, que se dedica a estudar o assunto, só 25% dos brasileiros são plenamente alfabetizados.

"O esforço é para que 100% das crianças sejam alfabetizadas", afirma a diretora do Departamento de Ensino Fundamental da prefeitura de Curitiba, Nara Luz Chierighini Salamunes. Esse seria o próximo passo a ser alcançado depois da universalização do ensino. Ou seja, agora que praticamente todas as crianças estão dentro da escola, a tarefa de casa passa a ser oferecer um ensino de qualidade para todos.

Muita gente diz que a ausência de repetição de ano na escola é uma das principais culpadas pela demora no aprendizado. Mas os educadores preferem apostar que há mais causas para o problema. "É uma situação que tem origem nas condições culturais das crianças", afirma Nara. Segundo a professora, crianças que vêm de famílias onde há estímulo para leitura já chegam à 1.ª série sabendo ler e escrever.

"O problema é que boa parte das pessoas no nosso país não tem nem o que comer. Como podemos esperar que elas dêem prioridade para a cultura e o letramento dos seus filhos?" indaga a professora Lilian Anna Wachowicz, membro titular do Conselho Estadual de Educação. Para ela, há várias medidas fundamentais para que as crianças tenham uma educação de mais qualidade e saiam da escola sabendo tudo o que se poderia exigir delas. "Dar acesso a bibliotecas, encaminhar para clínicas alunos com dificuldades especiais e uma melhor formação dos professores são medidas que trariam resultados."

O governo federal acredita que os dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica do MEC – aqueles que apontam para 55% de crianças com dificuldade de leitura – também precisam ser complementados para que se possa entender o que há de errado no processo de alfabetização dos brasileiros. Por isso, anunciou duas novidades nos próximos dias. Uma delas é a "Provinha Brasil". Trata-se de um exame que será feito nos primeiros anos da escola, dos 6 aos 8 anos de idade, para ver como as crianças reagem ao processo de ensino das primeiras letras. "Vamos desenvolver a prova e enviar para que os municípios apliquem", afirma Francisco das Chagas, secretário nacional de Educação Básica do MEC.

Índice

A segunda novidade é o Ideb, o Índice de Desenvolvimento Educacional Brasileiro. O índice medirá a capacidade de alunos de ensino fundamental em cada município. O número servirá para orientar as ações, principalmente nas escolas públicas. A cidade que tiver pior desempenho merecerá maior atenção. Isso é necessário porque o problema do analfabetismo varia bastante de acordo com a região do país. "No Brasil inteiro, há 13% de analfabetos", diz Nara Luz. "Em Curitiba são 3%. Ainda não é o número ideal, mas há uma diminuição significativa", lembra.

A diretora acredita que ainda demorará algum tempo para que a escola deixe de formar analfabetos funcionais, mas acha que o país está no caminho certo. "O mundo exige mais conhecimento hoje e todo mundo está dando mais atenção à educação", ressalta. O MEC concorda. "É uma situação que temos de resolver a curto prazo", diz Chagas. Se o objetivo será alcançado, só o tempo dirá.

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