Vera, insatisfeita com a demora no SUS, pagou exame com próprio dinheiro.| Foto: Pedro Serápio/Gazeta do Povo

Atraso de 10 minutos gera cancelamento de consulta

Para o almoxarife Gutembergue Micheletto Fernandes, 26 anos, a consulta com um ortopedista demorou, e muito. Em março de 2007, ele procurou o posto de saúde Jardim Paranaense, no bairro Boqueirão, porque estava com muitas dores no joelho e no ombro. Encaminhado para um clínico geral, a autorização para o atendimento com um ortopedista saiu sem problemas.

Porém, só depois de dois meses. Tratamento emitido, as dores não melhoraram.

Entre idas e vindas, foi encaminhado para tratamento no ambulatório da Santa Casa, localizado ao lado do Hospital Nossa Senhora da Luz, em julho do ano passado. Com reconsulta marcada para o dia 22 do mês seguinte, Fernandes chegou dez minutos atrasado. E, por isso, não foi atendido. "Na consulta anterior esperei quatro horas para que o médico me chamasse. Da outra, dez minutos atrasados só me deixaria no final da fila. Não estava atrapalhando o andamento dos atendimentos", comenta. O normal é ter uma hora marcada e o atendimento é feito conforme a ordem de chegada. "Eles encaixam você de acordo com que eles acham importante. Porque não dar um horário específico?", constata.

Explicação

A Aliança Saúde PUCPR-Santa Casa, responsável pelo hospital, em resposta ao pedido de análise do caso disse, em nota, que o padrão de atendimento é a realização de todas as consultas do dia, procurando compreender possíveis atrasos do paciente. "O caso do paciente é uma exceção", diz a nota.

Durante o ano de 2008, a Ouvidoria da Santa Casa não registrou reclamações em relação ao não-atendimento por atraso. Mensalmente, o ambulatório da Santa Casa atende mais de 350 pacientes na especialidade de Ortopedia. Depois que a reportagem entrou em contato com a assessoria do hospital, nova consulta foi marcada para Fernandes na semana seguinte. (AP)

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A espera por atendimento com médico especialista tem sido uma constante tanto em Curitiba quanto nas cidades vizinhas. Isso tem levado muitas pessoas a optarem por tratamento particular de saúde, mesmo quando estão em situação econômica desfavorável. O Hospital Angelina Caron, em Campina Grande do Sul, na região metropolitana da capital, tem recebido muitos pacientes nessa situação. Contando apenas os atendimentos de quimioterapia e radioterapia, a instituição recebe 280 pessoas por dia, das quais 90% são provenientes do SUS.

"Eles encontram dificuldades no atendimento. Acabam percorrendo caminhos tortuosos: o doente vai no posto de saúde e espera de seis meses a um ano para chegar a uma consulta com especialista", diz o oncologista Luciano do Valle Sabóia, responsável pela oncologia cirúrgica do Hospital Angelina Caron.

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Esse é o caso da empregada doméstica Vera Lúcia de Carvalho, 43 anos, que desde 2007 peregrina por postos de saúdes de Colombo em busca de uma solução para seu caso. Um exame ginecológico preventivo realizado no posto de saúde do bairro Guaraituba, em Colombo, foi o desencadeador de meses de procura por um diagnóstico preciso com um médico especialista. Hoje, depois de mais de um ano e meio pagando exames com dinheiro do próprio bolso, ela descobriu que tem câncer de útero e faz tratamento quimioterápico no Angelina Caron. "Fico me sentindo um lixo. A minha vontade era voltar ao posto que fui atendida e mostrar o laudo para o médico’, desabafa.

Vera procurou o posto de saúde porque estava com uma hemorragia, porque durou pelo menos nove meses. De lá ela foi encaminhada para um clínico-geral, que apenas lhe prescreveu remédio para dor. Finalmente, depois de quatro meses, ela conseguiu uma consulta com um ginecologista, que lhe prescreveu hormônios. Segundo ela, o tratamento não adiantou em nada e, em nenhum momento houve o interesse do médico especialista em pedir um exame que investigasse as causas da hemorragia.

A saída foi pagar R$ 100 do próprio bolso e fazer uma ecografia. O laudo constatou a presença de um mioma no útero. Ela conta que voltou ao posto, foi encaminhada ao clínico novamente e, só depois de mais um tempo de espera, conseguiu ser atendida pelo ginecologista. "Para eles, estava tudo em ordem. Eu só precisava tomar outro medicamento. Em nenhum momento quiseram fazer exame ginecológico. Infelizmente, o médico não sai da cadeira, parece que tem nojo do paciente", constata.

Cansada de tanto entrar e sair de consultório, anêmica e com dificuldades no trabalho, ela resolveu procurar por conta própria o Hospital Erasto Gaertner, depois que soube que a consulta pelo encaminhamento do SUS demoraria mais de dois meses. Não conseguiu ser atendida. Foi aí que soube que o Hospital Angelina Caron também oferecia atendimento e tratamento para seu caso. Pagou R$ 100 pela consulta e conseguiu ser atendida pelo médico que, até hoje, acompanha seu caso.

Emergência

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O Hospital Angelina Caron recebeu 1.971 novos pacientes para tratamento de quimioterapia, radioterapia e cirurgias em 2008. Número 18% acima do registrado em 2007 (1.670). Na opinião de Sabóia, nenhum paciente com doença grave pode esperar tanto tempo para ter um atendimento completo, como aconteceu com Vera. Considerando ser um caso de câncer, ela deveria ter prioridade. "Isso acaba comprometendo a cura do doente", diz o oncologista.

Mas a espera é algo bastante comum. Segundo levantamento da Central de Marcação de Consultas Especializadas do SUS, foram realizados aproximadamente 88 mil agendamentos em dezembro de 2008, dos quais 55 mil de consultas iniciais e 34 mil de exames e tratamentos.

A prefeitura de Curitiba foi procurada para comentar os casos de Vera e de Gutembergue (veja ao lado). Porém, a assessoria de imprensa informou que os cadastros não foram encontrados. Segundo a prefeitura, alguns dos problemas que causam demora são a vinda de pacientes da região metropolitana e a pequena quantia paga pelo SUS por consulta especializada.