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Localização das áreas destinadas à habitação |
Localização das áreas destinadas à habitação| Foto:

No Paraná, só um imóvel incorporado

Desde a extinção oficial da Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (RFFSA) há cerca de 1,5 ano, apenas um imóvel localizado no Paraná foi incorporado pelo Patrimônio da União, de acordo com a gerência regional da Secretaria de Patrimônio da União (SPU). Trata-se do imóvel do Estádio Durival Britto e Silva, utilizado pelo Paraná Clube. O clube, entretanto, move uma ação na Justiça que discute a propriedade do imóvel, já que o Paraná passou a utilizar as instalações que eram do Ferroviário, um dos times que o originaram.

De acordo com o escritório responsável pelo inventário da Rede no Paraná, dos 6 mil imóveis da região, 400 já tiveram a documentação para transferência levantada. Destes, 80 já foram transferidos à União. Cabe à gerência regional do Patrimônio da União no Paraná proceder as ações necessárias para incorporação desses imóveis. (TC)

Moradores acreditam que a vida vai melhorar

Longe da burocracia que envolve a destinação de um imóvel da extinta RFFSA à habitação social, os principais interessados, os moradores das áreas que estão em negociação, têm apenas uma certeza: que a vida vai melhorar. Pelo menos é nisso que eles dizem acreditar. A artesã Sebastiana Martins da Silva, 68 anos, chegou ao "Pantanal", como é conhecida a Vila Pantanal, no Boqueirão, com a cara, a coragem e roupa do corpo, há oito anos.

Cansada do trabalho na "roça" no Paraguai, a umuaramense ficava encantada com as "coisas boas" que escutava na tevê a respeito de Curitiba. Quando recebeu o convite de uma conhecida que morava na Pantanal, Sebastiana não teve dúvidas: veio embora com a amiga, a quem chamava por Vozinha. Morou por sete meses no barraco da Vozinha e, quando conseguiu se aposentar, alugou seu próprio barraco, ali mesmo.

Juntando um dinheirinho aqui, apertando dali, em pouco tempo conseguiu o suficiente para "comprar" sua casa própria na Vila Pantanal. Com um empréstimo pagou o restante dos R$ 2,5 mil cobrados, assumindo prestações mensais de R$ 100. O contrato foi "de boca". "Eu fiquei louca de feliz, mas com o tempo veio o medo de perder. Sempre tinha um para dizer que iam me tomar."

Hoje, entretanto, Sebastiana diz não ter mais esse medo. Da janela da sua casa, vê as máquinas passando e o aterro, em que serão construídas as novas moradias, tomando forma. Não sabe de quem é o terreno que está em obras e nem conhece o trâmite burocrático da negociação. "Isso eu deixo para quem entende do assunto", diz. Tem esperanças, porém, de que tudo vai dar certo. "Na nova casa não vai entrar água da chuva e ninguém vai poder me tirar de lá. Vai ser meu mesmo. Deus está abençoando que vou ser feliz." (TC)

Dois imóveis que eram da extinta Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (RFFSA), localizados em Curitiba, estão em processo de destinação para habitação social. Um deles é o terreno do Jardim Icaraí, ocupação que faz parte do Bolsão Audi-União, no Uberaba. O outro terreno localiza-se na Vila Pantanal, no Boqueirão. Outros imóveis da Rede, dos cerca de 6 mil existentes no Paraná, podem ser utilizados para o mesmo fim.

Enquanto a destinação definitiva não ocorre, uma autorização provisória permite que a Companhia de Habitação Popular de Curitiba (Cohab-CT) venha desenvolvendo os projetos de regularização fundiária nestes locais. "Esta ação vai possibilitar um resgate social de milhares de famílias que se encontram em condições subumanas", afirma o presidente da Cohab-CT, Mounir Chaowiche.

No Bolsão Audi-União, área de ocupação em que o Jardim Icaraí está inserido, estão sendo aplicados R$ 40 milhões, com investimentos do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC). Só no Jardim Icaraí, na área de 206 mil metros quadrados que pertencia à extinta RFFSA, serão beneficiadas 295 famílias, com relocações para o próprio entorno. A expectativa é que o projeto seja concluído até o fim do ano que vem.

Na Vila Pantanal, o terreno que pertencia à RFFSA mede 53 mil metros quadrados. Ao seu redor, foram adquiridas áreas de particulares e somadas à áreas do município para pôr em prática o projeto que deve atender 765 famílias. Destas, 316 serão relocadas. A previsão de conclusão das obras é de 18 meses. Estão sendo investidos R$ 7,8 milhões no projeto de regularização fundiária. Os recursos são do programa federal Pró-moradia e de um financiamento internacional, o Fonplata.

De acordo com Chaowiche, o município de Curitiba não descarta a possibilita de negociar outros imóveis da extinta RFFSA para destinar à habitação social.

Exigência legal, processo moroso

A destinação desses imóveis para habitação social é política prioritária do governo federal, de acordo com a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), órgão responsável por incorporar os imóveis da extinta Rede e dar a destinação final. "O recebimento desse patrimônio é visto como oportunidade para alavancar essa política pública", diz a coordenadora-geral de incorporação de imóveis da SPU, Ana Túlia de Macedo.

Não se trata só de boa vontade, porém. Na verdade, a utilização desses imóveis para habitação social é uma exigência legal. A própria Lei 11.483/07, que extinguiu a RFFSA e transferiu seu patrimônio não-operacional para a União, assegura que os imóveis já ocupados da antiga empresa devem ter esse fim.

A política – e o dispositivo legal –, entretanto, têm esbarrado na morosidade do processo. Com a extinção da empresa, os imóveis não-operacionais passaram imediatamente à União, por força de lei. Na prática, porém, os imóveis têm de ser incorporados pela SPU um a um, depois de um longo processo de levantamento de documentação, agravado pela situação oficial de parte deles.

"Deve-se considerar toda a dificuldade inerente ao processo de regularização desses imóveis que, muitas vezes, ou não têm registro cartorial ou têm registro em nome das empresas antecessoras da extinta RFFSA", explica Ana Túlia. "A Rede não tinha preocupação patrimonial. Durante décadas, preocupou-se em adquirir imóveis, mas não com a regularização deles. Isso tudo veio à tona agora. Cerca de 90% dos imóveis no Paraná vão demandar ação", afirma o chefe do escritório responsável pelo inventário da Rede no Paraná, Mauro Mello Piazzetta.

Com isso, até agora, apenas 1,5% dos imóveis inventariados foram efetivamente transferidos para o Patrimônio da União em todo o país. E apenas um já teve o processo de destinação para habitação social concluído. Trata-se de um imóvel localizado em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, com 214,2 mil metros quadrados. A cessão definitiva do imóvel ocorreu no início deste mês, 19 meses depois da publicação da primeira medida provisória que tratou da extinção da RFFSA.

Histórico

Com um déficit habitacional brasileiro estimado em 6,5 milhões de moradias e milhares de imóveis da extinta empresa considerados ociosos, o acontecimento foi considerado histórico. O imóvel, que fica no local conhecido como Km 3, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, será utilizado para um projeto de regularização fundiária destinado a famílias que já ocupavam o local e para novos residentes de baixa renda. O empreendimento, que conta com recursos do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), deve atender a 383 famílias.

Em todo o país, outros 230 imóveis foram solicitados à inventariança da RFFSA para regularização fundiária de ocupações já existentes e construção de habitações novas. Entre eles estão as áreas referentes ao Jardim Icaraí e Vila Pantanal, em Curitiba. Nestes dois locais, a Companhia de Habitação Popular de Curitiba (Cohab-CT) trabalha com uma autorização provisória, enquanto o processo de incorporação dos imóveis pela SPU não é finalizado.

A estimativa é que dentro de um mês saia a Cessão Provisória desses imóveis. Em seguida, a SPU deve trabalhar em uma cessão definitiva, chamada Concessão do Direito Real de Uso (CDRU). A expectativa é que esse processo leve cerca de seis meses. "Num primeiro momento, trabalhamos na incorporação desses imóveis ao Patrimônio da União. Só então, pode sair a cessão provisória. Depois disso, trabalhamos com a destinação definitiva", explica o gerente substituto do patrimônio da União no Paraná, Luciano Sabatke.

Para o assessor jurídico da Organização Não-Governamental Terra de Direitos, Vinícius Gessolo de Oliveira, o processo está se mostrando lento e ineficaz. "Esta é uma determinação legal que não está sendo cumprida", diz. "No Paraná, há cerca de 6 mil imóveis da extinta RFFSA e pouquíssimos estão destinados para esse fim. Nenhum concluído", critica.

De acordo com Oliveira, falta organização no processo. "Não há um levantamento global mostrando a ocupação desses imóveis. Se existe, não é divulgado. A Lei 11.481/07 traz diretrizes gerais sobre a necessidade desse levantamento. Sem ele, fica impossível para a sociedade civil acompanhar o processo. Colocar a culpa na burocracia e na falta de informação é não assumir a responsabilidade", afirma.

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