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O dono da Confeitaria Pharol – que nos anos 10 funcionava na esquina da Rua XV com a Barão do Rio Branco – não deve ter ficado nada satisfeito quando um grupo de fregueses fiéis decidiu abrir seu próprio ponto de encontro, a Sociedade Helvetia (ou Suíça), mudando-se para as bandas da Ubaldino do Amaral. Os suíços – foragidos das agruras econômicas da Primeira Guerra – eram uma minoria na Curitiba de italianos, alemães e poloneses. Mas como tinham gostado das temperaturas "amenas" registradas nos termômetros, os Sigel, Maurer, Keller ou Leschaud foram ficando. Só lhes faltava um chalé, ou coisa parecida, cujas paredes começaram a ser erguidas em 1929.

A paz apenina só foi perturbada nos anos 40, em plena Segunda Guerra, quando populares ensandecidos abriraram um quebra-quebra contra os clubes de alemães e italianos – feito o Concórdia e a Garibaldi – subiram a rua pensando encontrar a toca de algum ditador e bateram na porta dos ex-freqüentadores da Pharol. Reza a lenda que Ernesto Siegel teve de falar alto para conter a multidão: "Somos suíços, não alemães". Na dúvida, apesar dos sotaques carregados e das cabeleiras loiríssimas, não houve depredação, e os helvéticos voltaram para a toca. "Somos assim mesmo. Tranqüilos", diverte-se Nelson Gloor, 78 anos, ex-sócio da Casa Leutner e atual presidente da associação.

O pai de Nelson, um cordoeiro, chegou a Curitiba no início da década de 20 e abriu no bairro do Portão uma fábrica de cordas e barbantes. Apesar de ter visto seu rifle de caça ser confiscado nem bem tinha pisado no Brasil, à maneira dos compatriotas, gostou do local e disse adeus à paisagem de cartão-postal deixada na Europa. Finais de semana e festas, subia a pé até a sociedade – uma espécie de zona franca em pleno Alto da XV. "O local dava pernoite, orientação e apoio aos imigrantes. Teve sua fase áurea. Era aglutinador. Hoje, não mais", comenta Gloor. A rotina incluía boliche (como ainda hoje), aulas de tiro (não mais), empréstimo de livros e uma festa de arromba em 1.º de agosto – Dia Nacional da Suíça, "que é um país bonitinho de verdade. Como nas fotos", avisa Nelson.

Nos anos 80, uma associação em Campo Largo, criada pela Incepa, ficou com uma parte dos sócios. Em Pinhais ficou outra. Os suíços que vieram com as montadoras, nos 90, até agora não deram o ar da graça. À maneira das demais sociedades do gênero, os jovens deixaram de comparecer, "por nenhum motivo em particular", a exemplo do arquiteto Carlos Guilherme Gloor, 45, filho de Nelson, colaborador ocasional da quase confraria que tem cerca de cem sócios. Resta saber se a Helvetia, perto de fazer 90 anos, em 20 de novembro, vai sobreviver. Tomara, mas os suíços são calmos demais para sofrer antes da hora. Essa turma respeita os ponteiros do relógio. (JCF)

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