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O bairro do Fla­mengo, no Rio de Janeiro, foi cenário na semana passada de um justiçamento promovido por moradores, que decidiram atar um adolescente nu a um poste, como forma de puni-lo por crimes. Eles fariam parte de um grupo disposto a fazer justiça pelas próprias mãos, que se mobiliza e se organiza pela internet. Na mesma semana, um jovem foi executado a tiros por três homens no meio da rua na Baixada Fluminense.

Para a socióloga Elza Pádua, a sociedade sofre a influência do que chama de ‘esquizofrenia social’. Mas ela acredita que existam soluções.

O que é esquizofrenia social?

Como Jean Baudrillard (filósofo francês) descobriu, a mente de um esquizofrênico funciona fractalizada (fracionada). Cada pedaço opera de forma independente, criando conflitos. A nossa sociedade vive esse mesmo problema.

A esquizofrenia social pode explicar situações do dia a dia? Por exemplo: gente que condena ações da milícia e do tráfico apoiou os jovens de classe média do Flamengo acusados de agredirem moradores de rua.

Você não pode buscar coerência ou cobrar contradições, porque essa é a essência da esquizofrenia social. Esse caso é mais um exemplo de fractalidade. Assim como na esquizofrenia tradicional, quando se está dividido, não há culpa. O problema é que episódios como o dos jovens do Flamengo também geram situações de busca pelo poder. Quem vai definir, por exemplo, quem serão os encarregados de fazer justiça com as próprias mãos? Esses casos não são resolvidos pela lógica. Assim como também ocorre na esquizofrenia tradicional. Veja o caso do assassinato do cineasta Eduardo Coutinho pelo filho Daniel, que sofre de esquizofrenia. O Daniel matou o pai e depois foi ao vizinho dizer que tentou libertar a mãe e ele mesmo, mas não conseguiu.

Que fatores motivam esse fenômeno?

A esquizofrenia social está muito ligada ao momento atual que vivemos. Fatos trágicos sempre existiram. Mas tivemos uma rápida expansão dos recursos de mídia pelos quais as pessoas se informam (como laptops, tablets e celulares que filmam). No passado, questões sensíveis poderiam jamais chegar ao público. O que não se conhecia não se sentia. Mas, hoje, essas questões podem ser conhecidas rapidamente pelos recursos da mídia. Essa sensação de proximidade cria inquietações que favorecem a esquizofrenia social.

A esquizofrenia social compromete a segurança pública?

A esquizofrenia social surge nas classes de maior poder aquisitivo e contamina a sociedade toda. É ruim para a segurança pública, porque nesse processo se desenvolve até mesmo como uma cultura de desrespeito à autoridade. Começa com um discurso contra o poder público. Afirmações como "nesse governo não fizeram nada" sensibilizam muito a sociedade. Mas é um discurso que favorece a violência. Esse discurso favorece que haja desrespeito pelo outro.

Como mudar essa situação?

A questão agora já não é mais querer mudar ou não mudar. Num mundo de comunicações globalizado, é preciso buscar a harmonia. O caminho é introduzir novos valores e crenças no prazo de cerca de 20 anos. E a escola será fundamental. Esses novos conceitos podem se disseminar como vírus. Isso porque os filhos poderão debater com os pais os conceitos que foram ensinados na escola.

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