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Comportamento violento de policiais pode levar a comunidade a se voltar contra a presença das forças policiais | Daniel Castellano/ Gazeta do Povo
Comportamento violento de policiais pode levar a comunidade a se voltar contra a presença das forças policiais| Foto: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo

Análise de perfil falha

A avaliação social e a análise psicológica perdem qualidade quando muitos policiais precisam ser contratados de forma rápida. O Paraná, por exemplo, após longo tempo de defasagem de efetivo, passou a contratar rapidamente nos últimos anos. Isso prejudica a análise para ingresso e a qualidade do ensino da academia, segundo o ex-secretário nacional de Segurança, o coronel da reserva José Vicente Silva Filho.

Um policial ouvido pela reportagem acredita que o ambiente dentro dos quartéis cria oportunidades para a corrupção. "O cara já tem predisposição, em razão da fragilidade das avaliações sociais no concurso. Chega no batalhão e o ambiente puxa ele para baixo", comenta. Segundo ele, esse é um dos motivos pelos quais muitos policiais se aposentam ao chegar aos 25 anos de serviço. "O policial pode receber adicional com 35 anos de trabalho, mas o clima organizacional faz com que o policial se aposente antes."

Outro lado

A Polícia Militar infor­mou, em nota, que apura to­das as denúncias envol­vendo desvios de conduta dentro da corpo­ração e que não tolera irregularidades. "Inexiste no seio da PM qualquer forma de acobertamento, desídia, omissão ou condescendência criminosa com os fatos relacionados a desvios de conduta, violência exacerbada ou outras formas de desvios", diz trecho da nota. Para todas as ocorrências em que policiais se envolvem em confronto é instaurado um Inquérito Policial Militar (IPM), que pode culminar ou não em processo-crime. Em casos mais polêmicos, a PM garante acionar o Ministério Público e a Ordem dos Advogados do Brasil.

Tráfico

Investigação de chacinas aponta rede de corrupção

Investigações da Delegacia de Homicídios sobre a chacina ocorrida em junho no bairro Sítio Cercado apontam para uma rede de corrupção envolvendo policiais militares do 13º Batalhão e traficantes de drogas.

De acordo com testemunhas sigilosas, o traficante morto na chacina pagava "pedágio" de R$ 4 mil mensais a policiais militares para poder vender as drogas sem ser incomodado. Um dos "patrões" do tráfico na região seria "sócio" dos PMs investigados. Ele indicaria a quem entregava os entorpecentes e estes passavam a ser extorquidos pelos policiais. O dinheiro do pedágio seria repartido entre os agentes e o "patrão".

Outros depoimentos apontam ainda que agentes fazem "bicos" em bailões do Pinheirinho. Além da vigilância, os agentes selecionariam quem poderia vender drogas nos locais. A família assassinada no Sítio Cercado morava antes no Pinheirinho. No Xaxim, bairro vizinho, cinco pessoas foram executadas em maio – entre elas, um traficante. O tipo de arma usada nos crimes é o mesmo, e haveria também um mecanismo de extorsão. Por isso a DHPP não descarta a possibilidade de os homicídios no Xaxim terem sido cometidos por PMs.

Quatro casos de grande repercussão envolvendo policiais militares suspeitos de cometer assassinatos em Curitiba e região metropolitana escancaram uma ferida profunda na segurança pública paranaense: os extremos a que policiais chegam movidos pela corrupção. Homicídios, torturas, ocultação de cadáver e fraude processual são alguns dos crimes pelos quais 14 policiais responderão na Justiça. Esses desvios de conduta são reconhecidos e condenados por alguns policiais, que dizem que pouco podem fazer, por medo de perseguição.

Recentemente, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) denunciou à Justiça sete policiais militares suspeitos de terem torturado, matado e escondido o corpo do ajudante de pedreiro Edenilson Murillo Rodrigues, em maio do ano passado, em Piraquara. Outros cinco foram denunciados pela suspeita de terem executado três pessoas, no bairro Umbará, em outubro de 2013.

Somado a isso, a Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) prendeu dois policiais militares, que podem ter participado das mortes de quatro pessoas no bairro Sítio Cercado em junho. Não bastassem esses crimes, a Polícia Civil não descartou a hipótese de essa chacina estar relacionada à que ocorreu no Xaxim no fim de maio e que vitimou cinco pessoas.

Crise

Por trás desses crimes, há uma cultura já arraigada dentro da Polícia Militar. Policiais ouvidos pela reportagem mencionam uma "crise de comando": falta de punição e despreparo na hora das avaliações dos concursos que definem quem vestirá a farda. "Há uma despreocupação grande dos oficiais de alta patente com o que acontece no chão do quartel. Além disso, há uma crise de liderança grande na PM", diz um agente que pediu anonimato.

Além disso, muitos policiais acabam acreditando que, quando matam um suspeito, estão fazendo algo bom à sociedade. "A população é condescendente com essa prática, pois só morre pobre. O policial que pensa assim acaba virando presa fácil para o crime organizado. Um dia mata um, no outro está matando por um", ressaltou outro policial.

O sociólogo Pedro Bodê, coordenador do Grupo de Estudo da Violência da Universidade Federal do Paraná, lembrou que a força policial extrema é um problema histórico brasileiro e faz parte da cultura no país. "Há falta de controle, mas é muito mais que isso. A gente sabe que o único policial que é punido é o da base. Existe também o aumento da violência de forma geral. São muitos elementos que vão confluindo."

13.º Batalhão tem histórico violento

Sete dos 14 policiais envolvidos nos crimes denunciados pelo Ministério Público e investigados pela Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) são do 13.º Batalhão da Polícia Militar do Paraná, responsável pela proteção da região Sul de Curitiba. Cinco deles são suspeitos do triplo homicídio ocorrido no bairro Umbará, em outubro de 2013, e outros dois, de participarem da chacina do Sítio Cercado, que pode ter ligação com a morte de cinco pessoas no Xaxim, em junho e maio deste ano, respectivamente.

A história desse batalhão, no entanto, fala por si. Em 2005, policiais do "Treze" foram presos por envolvimento na morte do major Pedro Plocharski, que investigava grupos de extermínio formados por policiais naquela unidade. Os casos recentes são considerados por especialistas um símbolo de como a cultura violenta dentro de uma unidade policial pode percorrer anos e manter-se, mesmo com mudanças.

Análise

Para o coordenador do Grupo de Estudo da Vio­lência da UFPR, Pedro Bodê, a população que mora em uma região violenta, como a atendida pelo 13.º, tende a se voltar contra os policiais. "Nessas regiões onde a polícia mata, os policiais também acabam sendo vítimas", pondera. Apesar disso, ele acredita que casos envolvendo esse batalhão necessitam de uma análise mais detalhada.

Mas tanto Bodê como o ex-secretário nacional de Segurança, o coronel da reserva paulista José Vicente Silva Filho, dizem que há, por todo o país, unidades que instigam uma cultura violenta.

Silva Filho explica que, em muitos casos, policiais ruins são lotados em determinadas unidades, o que amplia o problema. "Isso é gravíssimo e indica problema de gestão. É preciso mudar estrutura, hábitos e ser intolerante com o desvio policial. Está fora da lei? Então precisa ser mandado embora", pontua o coronel.

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