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| Foto: Zave Smith /Image Source

Na última quinta-feira (16), um pai da cidade de Brusque, em Santa Catarina, compartilhou no Facebook a foto de seus filhos usando a mesma camiseta, a chamada “camiseta da união”. “Brigou, tem que usar”, diz o texto escrito na malha. Pedir desculpas, abraçar o outro e dizer eu te amo são as senhas para o pai “libertar” os irmãos. A imagem foi compartilhada mais de 17 mil vezes nas redes sociais. A maioria absoluta dos comentários elogiou a iniciativa do catarinense.

Uma rápida pesquisa no Google com os termos “Get Along Shirt” - termo em inglês usado para nomear a iniciativa - mostra que a postura não é novidade. No Google Web e no Reddit, são mais de 6 milhões de resultados.

No entanto, especialistas em psicopedagogia estão preocupados com a exposição de crianças na internet, mesmo com iniciativas que possam passar uma ideia “positiva” sobre educação.

“A exposição de crianças na internet é desnecessária, porque pode levar a interpretações distintas. E, nessa confusão, quem sobra como alvo é a criança. Há algum tempo, uma mãe postou na internet a foto do filho de 8 anos lavando a louça. O que era para ser um gesto pueril, e até mesmo gentil, viralizou na internet com outro viés. Isso é um complicador”, afirma Cristiane Bredow, psicopedagoga de Curitiba.

Ela se refere a um caso de fevereiro desse ano. Apenas o “vídeo-resposta” da mãe do menino teve 11 mil visualizações.

Exposição

“Precisamos tomar muito cuidado com o envolvimento de crianças na internet. Os pais estão expondo os filhos demais. A internet, a priori, não tem essa função. A infância é uma etapa de desenvolvimento. Qualquer atitude em relação a crianças na internet pode trazer consequências para elas. Isso pode gerar problemas em outro momento, a criança pode ser alvo de chacota, ainda que o acusador não tenha entendido a ação. Todo cuidado com as crianças é pouco”, pondera Evelise Portilho, psicopedagoga do curso de Pedagogia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).

A psicopedagoga Cristiane Bredow acrescenta que a exposição dos filhos nas redes sociais reflete, de certa maneira, um deslize dos pais quanto aos próprios métodos de educação - os quais têm de estar sempre vinculados à orientação e ao respeito às crianças.

“A exposição na internet revela o quanto a família está perdida em relação ao processo educacional. Sem noção dos papéis. Cabe aos pais formar, ou ajudar na construção, da autonomia da criança. Ao menos no que entendemos por autonomia: quando a criança decide por ela própria e por respeito ao próximo”, analisa Cristiane. “Numa situação de exposição, e que pode gerar ridicularização, a criança tende a não entender o fato. O que a criança fez para ganhar essa exposição? Toda regra adotada pelos pais tem que estar empregada numa relação de fato e consequência. Não é ‘não comeu, então deixa sem jogar futebol’. É preciso que as regras sejam direcionadas a situações reais”.

Castigo?

Ambas as especialistas refutaram a ideia de castigo, até mesmo a palavra, para direcionar a educação por um caminho mais explicativo. Cristiane Bredow afirma que, além da ideia do castigo ser um pouco cruel, ele muitas vezes é desproporcional.

“Não gosto de usar a palavra castigo. Pais precisam deletar o castigo de seus vocabulários. O que precisam é dar reflexão para os filhos. Situações que não os machuquem, não os abalem emocionalmente. Além disso, é preciso cuidar com o tempo. Os mais pequenos não têm noção de tempo. O que para nós seriam cinco minutos para eles pode durar uma eternidade”, pondera.

Para Evelise Portilho o papel do castigo na sociedade também é preocupante. “Os pais gostam muito de fazer isso. Mas é preciso prestar atenção para um fenômeno bem simples: não adianta retirar algo sem que a criança entenda a perda. Toda repreensão deve vir acompanhada de conversa. As famílias precisam pensar nas consequências. A punição é muito mais momentânea, mas não é essa a solução do fato em si. É preciso entender o que levou à disputa ou ao descumprimento de uma regra. Muitas vezes a discórdia pode estar relacionada a uma atitude que nem mesmo está sob responsabilidade dos filhos”, afirma.

A reportagem da Gazeta do Povo tentou e não conseguiu contato com a família de Brusque.

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