• Carregando...
Moradores idealizaram o Projeto NaturArte, que quer espalhar placas de cerâmica e esculturas nas ruas da cidade, criando um tipo de museu a céu aberto que se estende por oito rotas diferentes. | Gianni Cipriano/NYT
Moradores idealizaram o Projeto NaturArte, que quer espalhar placas de cerâmica e esculturas nas ruas da cidade, criando um tipo de museu a céu aberto que se estende por oito rotas diferentes.| Foto: Gianni Cipriano/NYT

Quando os turistas pensam na Costa Amalfitana, as cidadezinhas costeiras deslumbrantes de Positano e Amalfi sempre vêm à mente, mas Praiano, uma pequena comunidade espremida entre os despenhadeiros entre uma e outra, quer mudar isso.

O problema é que essa aldeia de cerca de dois mil habitantes não foi agraciada com uma praia ampla e atraente, nem tem uma piazza elegante à beira-mar onde os visitantes podem se reunir para bebericar prosecco; sua orla foi vítima de um deslizamento, há 90 anos, e as ruas se desenvolveram entre os rochedos íngremes.

Há pouco tempo, os moradores divulgaram um plano para atrair aqueles visitantes que querem um respiro das áreas mais lotadas da região: o chamado Projeto NaturArte, que quer espalhar placas de cerâmica e esculturas nas ruas da cidade, criando um tipo de museu a céu aberto que se estende por oito rotas diferentes. Segundo alguns dos criadores, a inspiração veio do Parque Guell, de Antoni Gaudí, em Barcelona, embora em escala mais reduzida.

“O objetivo era dar uma forte identidade à cidade e torná-la destino final dos visitantes e não apenas ponto de passagem”, explica Roberto Pontecorvo, membro da Agenda Praiano, associação comunitária fundada em 2013 para estimular o senso local de responsabilidade cívica e, com sorte, a economia.

Praiano não é um lugar que causa comoção dentro do conforto de um ônibus refrigerado; deve ser explorado a passos lentos, mesmo porque vários itinerários exigem subidas e descidas íngremes por ladeiras e vielas, oferecendo paisagens majestosas da costa como recompensa. Os moradores, aliás, se gabam de oferecer os mais belos pores do sol da região Amalfitana.

Como muitas vilas ao longo do litoral, Praiano tem uma tradição de objetos de decoração em cerâmica, incluindo uma verdadeira rede de pequenos oratórios centenários feitos de faiança maiólica.

A louça também é usada para informar os nomes das ruas e dar broncas – como o lembrete aos donos para limparem a sujeira deixada pelos cães. Ou o que está na praça principal, à frente da catedral abobadada, em que se lê: “Proibido jogar futebol”. Há pouco tempo, porém, em uma noite quente, um grupo de jovens resolveu desafiar a proibição sob as luzes coloridas.

Os oito itinerários artísticos, divulgados em maio, seguem o padrão de zigue-zague das ruas, com esculturas e painéis dispostos nos rústicos muros de pedra a intervalos irregulares. Alguns praianesi, como o pessoal local é conhecido, acrescentaram seu toque pessoal às caminhadas.

Veja mais fotos de Praiano

A aposentada Giuseppina De Rosa, por exemplo, criou um jardim suspenso colorido e perfumado de flores e ervas aromáticas – tomilho, pimentas, funcho – ao longo da viela que margeia uma das sendas e transformou o trecho em atração turística. “É porque é muito bonito”, justifica.

Os planejadores incluíram obras de oito artistas ligados à área. As peças, 150 no total, foram inspiradas nas paisagens, tradições e mitologia locais – afinal, segundo diz a lenda, foi ali que Ulisses resistiu ao chamado das Sereias, tema que foi bastante explorado.

Cidades dão status de patrimônio a comércio para ‘protegê-lo’ de turistas

Leia a matéria completa

“A ideia era instalar essas obras em lugares bonitos, onde as pessoas construíram suas casas e os jardins aterraçados parecem fazer parte da natureza”, explica Patrizia Marchi, uma das artistas. Seu itinerário, que inclui máscaras coloridas de humanos e animais, sai de Praiano em direção aos bosques que levam a um convento dominicano. “Parece um lugar mágico.”

Já Paolo Sandulli preferiu capturar o espírito dos pescadores, que já representaram o esteio da economia antes que o turismo se tornasse uma alternativa mais próspera para muitas famílias.

“Eu quis revisitar aquele mundo antigo do mar para manter vivas as lembranças dos pescadores que já desapareceram há muito tempo”, explica o ceramista e escultor que trabalha em uma antiga torre na praia.

Seus sete painéis em terracota margeiam a trilha que leva a Marina di Praia, um trecho coberto de pedrinhas espremido entre os rochedos.

O caminho, conhecido como Via Terramare, foi criado nos anos 50; graças a ele, surgiram também os primeiros restaurantes e hotéis da cidade, além do Africana Famous Club, uma casa noturna de frente para o mar que ajudou a definir a “dolce vita” da época e que ainda é frequentada por quem gosta de dançar.

Não faz muito tempo vi um homem descendo a via com um carrinho de mão lotado de caixas de vinho, suando no sol quente. “Por aqui o pessoal transporta tudo na mão mesmo”, contou Sandulli.

Como surgiu o projeto

A ideia do projeto começou com um pequeno grupo de praianesi dispostos a contribuir com tempo e dinheiro. Junto com a Prefeitura, a associação recebeu uma verba de 250 mil euros (cerca de US$275 mil) da União Europeia como uma das 31 iniciativas patrocinadas pelo bloco na região da Campânia.

Embora aumentar o turismo fosse o objetivo principal, a equipe também queria envolver os moradores, pois acreditavam que construir capital social era importante para a viabilidade da empreitada em longo prazo. Grande parte da população trabalha no turismo, mas em outras cidadezinhas ao longo da costa, coisa que a associação pretende mudar.

Um bom exemplo disso foi o que fez uma turma de residentes em preparação para a inauguração dos itinerários, no fim de maio, limpando as ruas, caiando as paredes pichadas, enterrando a fiação aberta e consertando as placas de sinalização.

Dois engenheiros de software calabreses que se apaixonaram pela iniciativa entraram para a associação e, para ela, desenvolveram um site e um aplicativo gratuito. Os proprietários dos imóveis nos quais os painéis foram instalados têm a responsabilidade de sua manutenção.

O prefeito Giovanni Di Martino explica que sua administração não só adotou o plano da associação, como o ampliou para incluir os templos religiosos.

O pedido de verba à União Europeia incluiu a restauração dos afrescos do século XV do convento local e a recuperação dos caminhos que ligam Praiano à “Trilha dos Deuses”, a senda espetacular, mas exigente, que se estende entre a cidade e Agerola.

“Tentamos engajar a população inteira na noção mais ampla de turismo, na qual até o cantinho mais escondido de uma pequena casa pode ser um elemento de descoberta”, explica o prefeito.

Luigi Zingales, economista da Faculdade de Administração Booth da Universidade de Chicago que ajudou a bolar o modelo de capital social para a associação, ressalta o contexto político da empreitada.

“De fora, não parece ser uma grande conquista, mas, no sul, onde há pouca tradição de se fazer coisas de baixo para cima, isso mostra que é realmente possível usar o dinheiro público sem ter que estar necessariamente ligado a políticos e/ou seus interesses.”

“É um pequeno passo para Praiano, mas um grande salto para o sul da Itália”, conclui.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]