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Escutas chegam à cúpula da Polícia Civil

Grampos telefônicos realizados pelo Gaeco e autorizados pela Justiça sugerem que a prática de corrupção era comum na DFRV e que parte do dinheiro era direcionada à cúpula da Polícia Civil. O delegado Marcus Vinícius Michelotto, que à época comandava a corporação, é mencionado nas gravações e chegou a ser investigado.

"Gerson [Machado] diz (...) que eles acertavam a delegacia, pegavam uns cento e poucos mil [reais] por mês, davam metade para o divisional [Luís Carlos de Oliveira] e metade para o delegado-geral [Marcus Vinícius Michelotto]", diz trecho da transcrição de uma conversa entre o delegado Machado e o representante de um sindicato.

O Gaeco pediu à Justiça que concedesse mandados de busca e apreensão na casa e no gabinete de Michelotto, mas as solicitações foram negadas. "Isso prejudicou substancialmente a coleta de provas. Apesar dos indícios levantados, os depoimentos não confirmaram totalmente a participação dele", disse o promotor Denílson Soares de Almeida. O ex-delegado-geral não foi denunciado.

Em outra gravação, Ma­­chado afirma que Michelotto, Oliveira e o então corregedor-chefe da Polícia Civil, Paulo Ernesto Cunha, queriam que ele "roubasse R$ 75 mil por mês" na DRFV.

"O delegado tem que entrar ali e se arregar com todos os donos de desmanche para arrumar dinheiro para mandar para eles [cúpula da Polícia Civil]", disse Machado, em conversa com o deputado Kleiton Kielse.

Outra ligação reforça a tese de corrupção e volta a mencionar a alta hierarquia. "Na DFRV tem que ter apoio do DG [delegado-geral] e do divisional [Oliveira]. Não tem como. Diz que o que eles querem é dinheiro dos desmanches e o resto que se f***", disse Machado. A reportagem tentou contato com Michelotto, mas ele não foi localizado.

Quatro delegados e 16 policiais civis de Curitiba serão denunciados à Justiça nesta quinta-feira (15) pelo Grupo Especial de Atuação no Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço do Ministério Público do Paraná (MP-PR). Eles são acusados de formação de quadrilha, corrupção ativa e passiva e concussão (exigir para si mesmo ou outra pessoa dinheiro ou vantagem em decorrência da função pública). Três proprietários de lojas de peças automotivas usadas também serão acusados formalmente. As denúncias são desdobramentos da Operação Vortex.

Segundo as investigações, os delegados e policiais acusados formaram uma rede de extorsão, com o objetivo de cobrar propina de comerciantes do setor de autopeças. A quadrilha foi articulada dentro da Delegacia de Furtos e Roubos e Veículos (DFRV), afirma o Gaeco. Entre os denunciados, estão o delegado Luis Carlos de Oliveira, que durante o período investigado era chefe da Divisão de Crimes Contra o Patrimônio (DCCP), um dos postos mais altos na hierarquia da Polícia Civil, e Gérson Alves Machado, ex-chefe da DFRV. Além deles, os outros dois delegados suspeitos de envolvimento são Marco Antônio de Góes Alves e Anderson Ormeni Franco, ambos da DFRV.

De acordo com o Gaeco, as investigações duraram um ano, período no qual foram ouvidas mais de 80 pessoas, entre lojistas, policiais civis e pessoas que não eram do ramo de autopeças, mas que também foram vítimas de extorsão pelos acusados. As apurações já estão concluídas, mas, conforme o MP, outras provas ainda podem chegar e, por isso, outras pessoas ainda podem ser denunciadas.

O promotor André Glitz informou que as investigações apontam Luis Carlos de Oliveira como o idealizador da quadrilha. "O delegado Luis Carlos idealizou o esquema para arrecadar dinheiro indicando delegados e investigadores de confiança que colocava em locais da DFRV", disse.

No total, o Ministério Público identificou 24 fatos criminosos ocorridos em Curitiba e região metropolitana. Entre eles, estão um caso formação de quadrilha, um de lavagem de dinheiro, um de denunciação caluniosa, um de abuso de autoridade, três casos de corrupções ativas e três de concussões.

Relembre o caso

A operação Vortex foi deflagrada no dia 3 de abril e visava desmantelar um caso de corrupção que estaria ocorrendo há mais de um ano na polícia. Um esquema de extorsão teria sido institucionalizado por meio da Divisão de Crimes Contra o Patrimônio, conforme investigações do Ministério Público. A suspeita era de que tudo ocorria a partir de falsas fiscalizações em lojas de autopeças e ferros-velhos.

Os delegados Gérson Machado, então titular do 6º Distrito, Luiz Carlos de Oliveira, responsável pela Divisão de Crimes Contra o Patrimônio (DCCP), e o investigador Aleardo Riguetto, do 6º DP, foram presos na operação. No total, 18 mandados de busca e apreensão foram cumpridos em duas delegacias da capital, uma divisão policial e nas casas dos policiais.

Na época, o coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado, Leonir Batisti, disse que os profissionais detidos não eram acusados de extorsão – objeto de investigação da Operação Vortex. Segundo ele, o trio foi preso causa de objetos ilegais encontrados em suas residências, como armas e munição restrita.

Durante as investigações, Marcus Vinícius Michelotto, então delegado-geral da Polícia Civil, afastou os três de suas funções temporariamente. Na ocasião, o delegado Walter Baruffi Júnior foi designado para assumir a DCCP e o delegado Rodrigo Brown de Oliveira passou a ser o titular do 6º DP.

Um dia depois da prisão, a Justiça concedeu a liberdade aos três mediante pagamento de fiança. Oliveira e Righetto recolheram as quantias no mesmo dia – o primeiro 30 salários mínimos e o segundo dez. Já Machado alegou não ter dinheiro para pagar o valor e pediu uma redução no total a ser quitado, o que fez ele poder deixar a prisão apenas na tarde do dia 5 de abril.

O começo do caso, no entanto, ocorreu logo após uma troca de titulares em delegacias, quando Machado havia questionado, em setembro de 2012, os motivos de sua transferência da Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos (DFRV). Em nota publicada no dia 26 do mesmo mês, Machado disse que, dois meses depois de ter assumido a DFRV, foi chamado pelo seu superior imediato, o delegado Luiz Carlos de Oliveira, responsável pela Divisão de Crimes Contra o Patrimônio. Segundo Machado, seu chefe "veio com um pedido relacionado a 'lojas de autopeças', e que eu disse que não iria atender, por ser contra meus princípios".

Um dia depois, no dia 27, Machado voltou atrás em depoimento concedido à Corregedoria Geral da Polícia Civil. No depoimento, ele alegou que foi mal interpretado e que não quis "ferir ou macular" a imagem de seu então superior, o delegado Luiz Carlos de Oliveira, chefe da Divisão de Crimes Contra o Patrimônio. Machado então negou ter enviado nota à imprensa, "constando em seu depoimento a informação de que ele apenas divulgou a nota por meio de um site".

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