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Peterson Ling Yen, 20 anos, corre o risco de perder o movimento do braço direito caso não seja operado: no caso dele, ação na Justiça não acelerou processo | Christian Rizzi/ Gazeta do Povo
Peterson Ling Yen, 20 anos, corre o risco de perder o movimento do braço direito caso não seja operado: no caso dele, ação na Justiça não acelerou processo| Foto: Christian Rizzi/ Gazeta do Povo

Procedimento de urgência

Rapaz aguarda há nove meses

Foz do Iguaçu - Fabiula Wurmeister, da sucursal

Mesmo recorrendo à Justiça, o jovem Peterson Ling Yen, de 20 anos, espera há nove meses por uma cirurgia para recuperar os movimentos do braço direito. Ele ficou gravemente ferido após ter sido atropelado em Joinville (SC). No acidente, o rapaz perdeu ainda a visão do olho direito e teve placas de platina colocadas no lugar dos ossos fraturados do rosto, que também precisa passar por uma cirurgia. Em Santa Catarina, onde permaneceu em coma por cinco dias e internado por quase um mês, recebeu vários pinos na perna direita.

De volta a Foz do Iguaçu (Oeste do estado), onde moram os pais, Peterson soube pelo médico especialista que precisaria operar o braço com urgência, caso contrário poderá perder os movimentos definitivamente. Diante da demora para receber o atendimento especializado, a família resolveu procurar a Justiça. No dia 14 de março, uma liminar dava prazo máximo de 30 dias para que o município providenciasse a cirurgia sob pena de multa diária de R$ 1 mil. Mas isso não ocorreu e a dívida já se aproxima de R$ 50 mil.

Outro lado

Segundo a assessoria de imprensa da prefeitura, o procedimento é de média complexidade e o município não conta com este serviço pelo SUS. Para resolver o problema, teria duas opções: encaminhar o paciente para outro município ou, como se comprometeu, pagar pela cirurgia em uma clínica particular. O custo seria de no mínimo R$ 12 mil. Como explica o advogado Carlos Alberto Cavalcante Moreira, que entrou com a ação junto ao Ministério Público Federal, a solução do caso não exime a prefeitura do pagamento da multa.

A demora na fila por uma cirurgia no Hospital Universitário (HU)de Maringá, no Noroeste do estado, obrigou pelo menos 13 pacientes a recorrer à Justiça para garantir atendimento no mês passado. Na última sexta-feira, o juiz substituto da 1.ª Vara Cível, Jaime Souza Pinto Sampaio, deu um prazo de 72 horas – a partir da intimação – para que o HU e o município atendam seis pessoas que aguardam por cirurgias ortopédicas. A decisão atendeu a um pedido da Promotoria Especial de Defesa da Saúde Pública, do Ministério Público (MP).Caso descumpram a determinação, hospital e prefeitura estarão sujeitos a multa de R$ 1,5 mil por dia e por paciente não operado. Na liminar, o juiz lembra da "obrigação do Estado em prover a saúde e de prestar atendimento médico hospitalar a quem dele necessitar, o que não vem ocorrendo". O despacho também alerta para os riscos que envolvem a demora no atendimento. "Os traumas ortopédicos podem vir a se tornar irreversíveis ou de difícil reparação se houver calcificação no local".

No início de maio, a 3.ª Vara Cível de Maringá já havia se manifestado de forma semelhante. Na ocasião, uma liminar determinou o atendimento de sete pacientes que estavam há mais de um mês na fila por uma cirurgia ortopédica. Alegando não ter condições de fazer os procedimentos, o HU encaminhou-os para outros três hospitais de Maringá e Sarandi, onde as cirurgias foram realizadas.

Um dos que viveram o drama foi o gesseiro Adonias Ferreira, 31 anos, que teve de esperar 36 dias para operar um dos joelhos. "Como no HU não havia leitos, eu e os outros pacientes tínhamos de ficar em macas no corredor. Sentíamos muitas dores, principalmente nas costas", afirmou, logo após ter sido operado.

Pelo país

O Tribunal de Justiça e o MP não têm um levantamento sobre a quantidade de ações judiciais impetradas no Paraná para garantir atendimento médico. No entanto, casos como o de Maringá estão ocorrendo em várias partes do país. Em abril deste ano, por exemplo, o Ministério Público Federal (MPF) ajuízou ação para garantir atendimento rápido a pacientes do SUS que precisavam fazer biópsias, cirurgias e quimioterapia em Uberlândia (MG).

Já em novembro do ano passado, o Judiciário do Ceará determinou uma série de medidas para reduzir o tempo de espera para cirurgias ortopédicas em dois hospitais de Fortaleza. A decisão, que atendeu uma ação do MPF, estabeleceu um prazo de 12 meses para reduzir em 10% a fila para operações de alta complexidade.

O coordenador do curso de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Rodrigo Kanayama, considera inadequada a postura do Judiciário em alterar políticas governamentais. "Isso é competência apenas do Poder Executivo. Sou contra a interferência da Justiça nesses casos", disse. Para ele, falta mobilização popular para questionar problemas como a longa espera por atendimento na saúde. "O Judiciário não deve se tornar uma estância política."

Na opinião do professor de direitos humanos do Centro Universitário de Maringá (Cesu­mar), Cássio Marcelo Mochi, a intervenção do Judiciário pode até ser criticada, mas é a última esperança para o cidadão. "A Constituição garante a todos uma série de direitos, inclusive à saúde. A interferência do Judiciário demonstra o quanto o Legislativo e o Executivo não estão cumprindo suas funções constitucionais de garantir a efetivação desses direitos", afirmou.

Mochi, que também é professor de Direito Constitucional, disse ainda que o Estado muitas vezes é insensível e irresponsável com o cidadão que aguarda atendimento na área da saúde. "Pode acontecer alguns casos de exageros por parte do Judiciário, mas quando o direito garantido não é cumprido pelo Estado, resta à Justiça entrar como interventor", opinou.

HU alega não ter condições de fazer operações

O superintendente do Hospital Universitário (HU) de Maringá, José Carlos Amador, afirmou que o local não tem estrutura para fazer mais seis operações ortopédicas, conforme determina a decisão judicial. "O hospital não tem aparelhagem nem capacidade técnica para realizar as cirurgias. Vamos entrar com recurso", informou.

O Ministério Público contestou o posicionamento do HU, alegando que o hospital assumiu com a prefeitura a responsabilidade pela realização dos procedimentos de média complexidade – relativas aos pacientes com ano de nascimento com final "8", "9" ou "0" – não havendo justificativa para deixar essas pessoas desassistidas.

Segundo a promotora Stella Maris Pinheiro, a unidade ainda recebe mensalmente cerca de R$ 1 milhão da prefeitura para custeio de diversas despesas. "O Hospital Universitário recebe recursos municipais para a realização de procedimentos ortopédicos classificados como de média complexidade. Se não possui equipamentos para realizá-los, o gestor municipal deve reorganizar o fluxo de trauma ortopedia existente e rever os valores repassados", explicou a promotora, em nota.

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