Tribunal é refém do orçamento do estado
Mauri König
Refém do orçamento do Estado, o Judiciário do Paraná atribui à falta de recursos o mau desempenho alcançado no relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Sem receita própria, o Tribunal de Justiça (TJ-PR) depende do que recebe do governo estadual. No ranking nacional, o Paraná é o que menos investe no Judiciário e, não por acaso, é o que tem mais processos parados. O presidente do TJ-PR, Celso Rotoli de Macedo, disse não ter analisado o relatório do CNJ, mas, por meio da assessoria de imprensa, ressaltou que para 2011 o Tribunal terá aumento de 9% para 9,5% do que receberá da receita corrente líquida do estado.
"O relatório do CNJ mostra que o congestionamento de processos é inversamente proporcional ao investimento", observa o presidente da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar), o juiz Gil Guerra. "O orçamento do Superior Tribunal de Justiça, com 36 ministros, é maior que o do Judiciário do Paraná, com mais de 600 juízes", compara. Já o presidente da seccional paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), José Lúcio Glomb, faz a comparação com o Rio Grande do Sul, estado com população e PIB equivalentes aos do Paraná.
O TJ-RS tem para este ano um orçamento de R$ 1,485 bilhão, exatamente o dobro do valor destinado ao TJ-PR. Segundo Glomb, o aumento de meio ponto porcentual na receita do ano que vem será suficiente para finalmente instalar as 60 varas já criadas no interior do Paraná. Para ele, é o começo de uma mudança significativa na estrutura hoje deficitária do Judiciário. "Como dar celeridade se nem há local para colocar os processos?", questiona. "A ajuda que o Judiciário precisa depende também de outros poderes", conclui.
Guerra lembra que o problema passa também pelos serventuários mal remunerados. Os assessores da Justiça Estadual, por exemplo, ganham o equivalente a 50% do salário dos da Justiça Federal, que é superavitária. A maior procura por Justiça no país se dá na esfera estadual, justamente a que menos arrecada. Um passo para a mudança, segundo o presidente da Amapar, está sendo dado com a tentativa de estatizar os cartórios hoje privados. "Em breve teremos receita", diz. Com os cartórios oficiais, o juiz espera que o ingresso de recursos faça frente às despesas e aos novos investimentos que melhorem o desempenho da Justiça no Paraná.
Pouco investimento e muita lentidão formam o cenário da Justiça Estadual do Paraná. Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) referentes a 2009 apontam que o estado tem a menor relação entre despesa judiciária e Produto Interno Bruto (PIB) entre as 27 unidades da federação. A constatação influencia outra performance: os magistrados paranaenses são responsáveis pela segunda maior taxa de congestionamento de processos em primeira instância, ficando na frente apenas do Piauí.O índice que mede a quantidade de julgamentos realizados ao longo do ano é um dos principais indicativos do estudo. Mais de quatro em cada cinco ações em tramitação na fase de conhecimento em 1.º grau no Paraná (86,5% do total) não foram baixadas e ficaram acumuladas para 2010. Na fase de execução, a porcentagem sobe para 90,5%.
O gargalo da primeira instância, composta pelos juízes de Direito, ajuda a aliviar o desempenho da segunda, formada pelos desembargadores do Tribunal de Justiça. Em segundo grau, o número de processos por magistrado e a taxa de congestionamento paranaenses estão em situação melhor do que a média nacional. O estado também se destaca pela receita gerada pelo Judiciário em relação às despesas 24,9%, a 10.ª mais alta do país.
Na comparação entre despesas e PIB, o CNJ levou em consideração números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que estimaram em R$ 190,8 bilhões o total de riquezas geradas pelo Paraná no ano passado. No ranking nacional, o estado tem o quinto maior PIB (atrás de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul), mas apenas a sétima maior despesa judiciária (R$ 777,5 milhões). A relação despesas/PIB no estado é de 0,41%, enquanto a média nacional é de 0,67%.
Além da verba reduzida, o congestionamento também está atrelado à falta de informatização dos processos no Paraná. Apenas 0,1% de todas as ações que tramitaram no ano passado usaram meios eletrônicos, enquanto a média nacional foi de 4%. Só Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Distrito Federal ficaram atrás o líder da digitalização foi Roraima, com 57,1%.
Mudanças
A pesquisa "Justiça em Números" é realizada desde 2004 pelo CNJ. A edição divulgada ontem, em Brasília, usou uma nova metodologia, o que prejudica uma comparação fiel às anteriores. Os dados de 2007, porém, já apontavam que o Paraná era o estado que menos registrava despesas em relação ao próprio PIB.
Na mesma época, aparecia como 20.º na relação entre despesa total e número de habitantes (R$ 64,6 por pessoa), mas caiu para 22.º em 2009 (R$ 73 por pessoa, contra R$ 111 da média nacional). Quanto à informatização, a situação melhorou.
Em 2007, a Justiça paranaense tinha um computador para cada dois funcionários, proporção somente superior à do Piauí. No ano passado, o número de computadores por usuário subiu para 0,92 bem próximo à média nacional de 0,93. "A informatização dos processos, assim como medidas anteriores como audiências de conciliação, estão entre as melhores saídas para evitar a lentidão de toda Justiça brasileira", advertiu o secretário-geral adjunto do CNJ, José Guilherme Werner, durante a exposição do estudo.
Outra diferenciação da pesquisa de ontem foi a separação dos judiciários estaduais em três grupos, hierarquizados pelo valor de despesas, casos novos, processos em tramitação, número de magistrados e servidores. São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Bahia foram considerados de grande porte. Já o Paraná lidera os 11 estados do grupo de médio porte, que ainda conta com Santa Catarina, Pernambuco, Distrito Federal, Goiás, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Pará, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. Todos os demais foram considerados de pequeno porte.
Processos
86,6 milhões de ações no Brasil
O Judiciário brasileiro teve um processo para cada quase dois habitantes em 2009. Ao todo, o número de ações em tramitação na Justiça Federal, do Trabalho e Estadual chegou a 86,6 milhões. Foram 25,5 milhões de novos processos, 1,28% a mais do que o registrado em 2008. O volume total é 28,5% superior ao registrado em 2007 (67,7 milhões de ações).
"Analisando pelo aspecto positivo, também é um sinal de que o brasileiro está procurando mais a Justiça", disse o secretário-geral adjunto do CNJ, José Guilherme Weber. De acordo com o relatório "Justiça em Números", no entanto, 71% de todos os processos que começaram a tramitar em 2009 não foram solucionados.
Em uma comparação entre as três esferas judiciárias, a estadual foi a que apresentou a maior taxa de congestionamento 73%. Já a do Trabalho foi a mais célere, com um índice de ações não resolvidas de 49%. Segundo o estudo, o pior gargalo está na fase de execução judicial, quando o congestionamento chega a 80% na Justiça Federal e 90% na estadual.
O relatório também mostrou um aumento no volume de gastos de todo sistema, que chegou a R$ 37,3 bilhões (9% a mais do que 2008). O presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, Cezar Peluso, enfatizou, por outro lado, que a Justiça também colaborou com a arrecadação. Na Justiça Federal, o volume arrecadado em ações de execução e custas supera em 51% o total de despesas.
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